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Orquestra Sinfônica Brasileira celebra 85 anos com performances ao vivo de Ana Coutinho

Ana Coutinho é a primeira artista a realizar residência com a OSB, criando obras de grande dimensão ao vivo durante os concertos

Por Redação Bravo!
17 mar 2025, 09h00
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Ana Coutinho fará residência artística junto à OSB (divulgação/divulgação)
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Em 2025, a Orquestra Sinfônica Brasileira (OSB) celebra seus 85 anos com uma programação especial, que destaca a presença feminina na música. Para marcar o ano, a Orquestra incluirá um número recorde de obras compostas por mulheres. Entre as peças, está “Viagem ao vento”, de Marisa Rezende, estreada pela OSB em 2008, o “Concerto para violoncelo nº 1”, de Grazyna Bacewicz, com a violoncelista Emília Valova como solista, e “Sinfonia Gaélica”, de Amy Beach. A maestra Jhoanna Sierralta também fará parte da programação.

Ao longo de 2025, a OSB realizará 44 concertos, divididos em cinco séries. As apresentações ocorrerão no Rio de Janeiro, nos teatros Carlos Gomes, Municipal, Sala Cecília Meireles e Cidade das Artes, e em São Paulo, no Teatro Cultura Artística. Maestros convidados como Claudio Cruz, Stefan Geiger, Marcelo Lehninger, Enrique Diemecke, Roberto Tibiriçá, Carlos Vieu, José Soares, Miguel Campos Neto, Javier Logioia e Guilherme Mannis irão conduzir as apresentações.

Uma das principais inovações da temporada será a participação da artista visual Ana Coutinho, que será a primeira a realizar residência artística junto à Orquestra. Durante os concertos, Ana criará obras de grande dimensão, com sua primeira participação ocorrendo no dia 12 de março, no Teatro Carlos Gomes, no Rio de Janeiro. As próximas datas estão marcadas para 13 de abril e 10 de maio, na Sala Cecília Meireles e na Cidade das Artes, também no Rio de Janeiro. 

Ana Coutinho foi convidada para uma residência de um ano, a primeira vez que uma artista visual ocupa esse papel na instituição. Tradicionalmente, são músicos e maestros os residentes da OSB, mas, neste caso, a artista expandirá sua pesquisa explorando a fusão entre pintura e música. Seu projeto se baseia na conexão entre essas duas formas de expressão e na investigação do corpo como elemento central da performance e do movimento. O projeto nasce de uma sintonia entre a artista e a OSB sobre a questão do tempo, sendo o marco de 85 anos da Orquestra uma ponte entre o passado e o futuro da música sinfônica.

Com curadoria de Keyna Eleison, o trabalho de Coutinho explora gestos e interações entre os músicos, o espaço e as obras criadas pela artista. A residência propõe um estudo sobre os contrastes sonoros entre agudos e graves, e como o corpo se expressa por meio da pintura, reagindo a essas variações sonoras. A proposta também investiga como a regência e o ato de tocar os instrumentos interagem com o ato de pintar, gerando uma troca entre as artes que se manifesta fisicamente no corpo em performance. O objetivo é que cada interação entre a pintura de Ana e a música da OSB será única, criando uma relação dinâmica com os espaços e públicos.

Formada em Comunicação Visual pela PUC-Rio e mestre em Communication Design pela Universidade Central Saint Martins, em Londres, Ana aprofundou seus conhecimentos em artes visuais em instituições como a School of Visual Arts (NY), Parque Lage (RJ), Instituto Tomie Ohtake (SP) e Escola de Belas Artes (SP). Ela foi a primeira brasileira a conquistar uma bolsa Chevening na área criativa, com seu mestrado financiado pelo British Council. Sua carreira internacional teve início em 2023, com exposições em Lisboa e Barcelona, e em 2024, expandiu sua presença para Lisboa e Madrid. Em 2024, apresentou a exposição individual “Vasos Condutores do Tempo”, com curadoria de Keyna Eleison. Confira o papo com a artista:

Você já transitou por diferentes segmentos artísticos, da moda ao design. Como foi esse percurso até você se dedicar exclusivamente às artes visuais?

Acho que eu começaria te contando que a minha tia avó, Maria Cecília, era pintora e foi ela quem me ensinou a pintar.  A pintura sempre esteve presente na minha vida mas num lugar íntimo onde apenas a minha família e amigos mais próximos sabiam o quanto eu gostava dos pincéis e tintas. Eu acabei fazendo faculdade de Desenho Industrial- Comunicação Visual, na Puc Rio e as aulas de pintura eram as minhas favoritas. Acho que naquela época eu ainda não tinha a maturidade ou visão necessária para enxergar minha vida como pintora. Toda a base do design acabou me levando para a moda. Hoje, fazendo uma retrospectiva, eu sempre amei os desfiles de moda, a iluminação, as projeções, a construção de cada roupa, e acabei entrando na moda como designer de superfícies. Acredito que a junção da moda e design me ajudaram a ganhar uma bolsa de mestrado do British Council, e acabei indo estudar na Central Saint Martins em Londres e após o final do curso, comecei a trabalhar no ateliê do estilista Alexander Mcqueen como designer de superfícies enquanto ele ainda era vivo. Acredito que essa experiência me aproximou ainda mais das artes visuais. Eles já usavam tecnologias de ponta desde tecidos com led a projeções sensoriais nas roupas das modelos na passarela. Após minha temporada de quase 3 anos em Londres, morei brevemente no Rio e logo em seguida me mudei para Nova York. Lá eu conheci o funcionamento do mercado fast fashion e a loucura de produzir 10 coleções por ano, todas produzidas na China. Eu saí de uma produção na época super artesanal no McQueen para trabalhar nas fábricas com turnos de 24 h no sul da China. Após 2 anos em NY, me mudei para São Paulo grávida do meu primeiro filho e decidi tirar um ano sabático para absorver a maternidade e entender os próximos passos. Eu ainda cheguei a trabalhar com moda em SP, abri a minha marca, mas tinha a nítida sensação de que queria outra coisa mas ainda estava naquele mistério. Numa vinda para o Rio de Janeiro, fui visitar minha Tia Maria Cecília, já bem idosa e doente e ela me falou: “Vai esperar até quando, para voltar para a sua pintura? Sai de lá atordoada mas com a resposta para essa angústia que estava dentro de mim. Em 2018 voltei para as minhas aulas de pintura e esse reencontro foi um reencontro com a minha essência?”. Logo isso me levou a mudar de volta para o Rio de Janeiro e voltando para as minhas origens, para essa natureza abundante, com o mar logo ali, comecei a me entender como somente pintora e criar minha identidade artística nas minhas pinceladas.

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Quais temas e questões você identifica como centrais na sua produção artística? Há algo específico que te motiva a explorar essas questões?

Acredito que primeiramente a abstração. Acho um grande desafio se jogar no mundo abstrato. Acredito que na pintura figurativa você ainda tem algum tipo de controle sobre a pincelada. A abstração é um grande mergulho na subjetividade, por mais que você tenha uma pesquisa elaborada, existe sempre a tela em branco e a questão: “Por onde eu começo a pintar?” Eu confesso que passei muito tempo lidando com esse incômodo, mas a prática diária me fez entender que isso é o combustível do artista. Pensando na minha pesquisa artística, eu gosto muito de estudar linguagens não verbais e suas representações, semiótica, estudos de signos e símbolos, além de movimentos de corpos e mais recentemente eu incorporei a minha pesquisa o estudo sobre o tempo e como materializar a sensação de passagem do tempo dentro da pintura da forma mais orgânica possível. 

Como surgiu o convite para participar dessa residência artística com a Orquestra Sinfônica Brasileira? O que mais te atraiu nesse projeto colaborativo?

O convite aconteceu devido a minha última exposição individual chamada, ‘’Vasos Condutores do Tempo”, com curadoria da Keyna Eleison. Eu estava procurando um lugar onde eu conseguisse ver o reflexo das minhas pinturas projetadas em diferentes superfícies através da luz solar para poder estudar o tempo de cada reflexo andando pelas telas. Eu acabei encontrando um armazém enorme na zona portuária do Rio que era exatamente o que eu estava procurando. Pé direito de mais de 6 metros, janelas lindas de ferro e muita luz solar. Na primeira pincelada no vidro eu já vi o reflexo da pintura na minha pele e esse momento foi mágico.

Dali eu parti para a pintura dos vidros pequenos e intuitivamente comecei a criar um alfabeto de símbolos que olhando de frente pareciam uma partitura. A Michele Farjado que trabalha na Orquestra levou a Ana Flavia Cabral, Vice Presidente da OSB, para visitar a exposição e o grande encontro se deu. Elas amaram os meus registros do tempo, identificaram minha parede de alfabetos como uma partitura abstrata e me contaram que a Orquestra estava fazendo 85 anos em 2025 e que teria como tema os registros do tempo e já ali o convite foi feito.

Acredito que vários fatores me atraíram, mas o norte é o desafio. Primeiramente fiquei pensando: “Como a música clássica vai afetar as minhas pinturas?” Impossível estar pintando e ouvindo uma obra e não estar usando os movimentos corporais semelhantes ao do maestro, é como se o pincel virasse uma batuta. Outro desafio: como interpretar os graves e agudos na pintura? Para mim é muito instigante ter minha pesquisa deslocada para esse universo tão potente e visceral e imaginar quais serão os desdobramentos dentro da pintura.

A estreia da sua instalação “Movimentos espirais” aconteceu em 12 de março. Como foi essa experiência inicial e a recepção do público? Estar no meio da Orquestra Sinfônica Brasileira durante o processo criativo influenciou sua criação artística de alguma forma? 

Essa primeira experiência foi muito importante e impactante pois comecei a criação das pinturas ouvindo as obras que seriam tocadas durante o concerto e já comecei na prática a entender para onde o meu gestual estava me levando. Somado a isso teve toda a investigação espacial do palco para entender a dimensão das telas que foram pintadas.

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Esse concerto do dia 12, acabou sendo o “Não Concerto” mais impactante que eu já vivi. Já sentada na plateia antes do início do concerto, as luzes se apagaram e começamos a ouvir barulhos de raios e chuva. Por segundos, minha mente criativa achou que era um som de fundo, mas quando olhamos para o palco dava para ver a chuva caindo sob os instrumentos. Uma forte chuva de granizo quebrou o teto do teatro impossibilitando a realização do espetáculo. A Ana Flavia Cabral, fez um discurso que emocionou a todos e disse: Arte é resistência!  E é isso mesmo. 

O “não controle” é o grande combustível da vida criativa e em breve teremos a nova abertura. Seguimos! 

Este projeto inclui performances ao vivo em futuras apresentações. Pode nos contar mais sobre como será essa integração entre você, os músicos da OSB e o público nos próximos concertos? O que o espectador pode esperar dessa experiência? 

Eu diria que essa integração terá três fios condutores: Primeiramente a questão artística que se dará através do estudo das obras que serão tocadas, o estudo dos instrumentos que estarão no palco no dia, o tempo de cada obra, e como todo esse conjunto se integrará essa grande pintura que terá além dos gestos das pinceladas  o meu movimento corporal intenso como expressão artística.

Em segundo, existe um minucioso estudo técnico pensando em como será a orquestra durante um concerto ao vivo e uma pintora pintando enquanto eles tocam. Detalhes como diluição de tinta, melhor tela que absorve rapidamente as pinceladas, meu figurino com um tecido leve que não faça barulho, eu estou descalça, são pontos que estão sendo levados em consideração.

Desde o convite da OSB, eu comecei a estudar muito sobre esse grande momento. Recentemente eu fiz uma performance teste no palco do teatro Adolpho Bloch para me entender espacialmente pintando num palco e fazer um estudo minucioso dos materiais envolvidos.

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E terceiro a plateia: Acredito que será um momento de epifania para todos nós. Eu estarei totalmente imersa pintando com movimentos sincronizados com os acordes das obras enquanto a plateia terá uma experiência sensorial que unirá as duas artes: pintura e música.

Este é um ano comemorativo especial para a Orquestra Sinfônica Brasileira, que celebra seus 85 anos com um destaque especial para o trabalho de mulheres musicistas. Como é para você fazer parte desse momento e de que maneira essa celebração se conecta com o seu processo criativo?

Primeiramente, me sinto muito honrada em fazer parte desse momento como mulher, artista e mãe de dois filhos homens. Essa celebração se conecta com o meu trabalho de diversas formas. Desde a resiliência de enfrentar todas as dificuldades do meio artístico, a estar perto de mulheres que não desistem em meio às dificuldades e que continuam juntas fazendo e reverberando feitos incríveis. Acredito que tudo isso se  conecta com as mensagens subjetivas contidas no meu trabalho de pintura abstrata

Concerto de Abertura da Temporada 2025

MULHERES NA MÚSICA
Regência: Jhoanna Sierralta
Solista: Emília Valova (violoncelo)

Programa:
Marisa Rezende – Viagem ao vento
Grazyna Bacewicz – Concerto para violoncelo nº 1
Allegro non troppo
Andante tranquillo
Finale: Allegro giocoso

Intervalo

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Amy Beach – Sinfonia Gaélica
Allegro con fuoco
Alla siciliana – Allegro vivace
Lento con molto espressione
Allegro di molto

Dia 13 de abril (domingo)
Local: Sala Cecília Meireles
R. da Lapa, 47 – Lapa, Rio de Janeiro

Dia 10 de maio (sábado)
Local: Cidades das Artes
Av. das Américas, 5300 – Barra da Tijuca, Rio de Janeiro

 

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