A incerteza como virtude
A 32ª Bienal de São Paulo, com o tema “Incerteza Viva”, será aberta ao público na próxima quarta-feira, dia 7/9. A Bravo! fez para você uma edição especial com entrevistas de artistas e curadores
Por Almir de Freitas
Fotos e vídeos: Henk Nieman
Entrevistas: Matheus Pimentel e Paula Carvalho
Bienal da crise, do vazio, de como viver junto, do que fazer com as coisas que não existem… Entre os apelidos e as propostas das edições desde o início deste século, a Bienal de São Paulo parece ter incorporado o incerto à sua identidade — seja as advindas das dificuldades objetivas, financeiras, da primeira década, seja as que brotaram dos questionamentos da própria Bienal sobre a sua vocação diante das transformações do mundo.
Agora em sua 32ª edição, que acontece entre os dias 7 de setembro e 11 de dezembro, a Bienal sintetiza esse percurso recente já em seu próprio tema, Incerteza Viva. “Na ideia de incerteza há um valor positivo”, explica a cocuradora Júlia Rebouças. “Ela é quase uma convocação, pra que a gente habite esse lugar, abarque essa condição e viva com a incerteza como algo que ajuda a criar e projetar outros futuros. Nesse sentido, trouxemos a palavra ‘viva’, pensando também numa exclamação, alguma coisa que a gente entusiasmadamente celebra, uma incerteza que é viva.”
No texto do catálogo, o curador Jochen Volz diz que a mostra se “constrói como um jardim, no qual temas e ideias se entrelaçam livremente em um todo integrado”. No total, são 81 artistas de 33 países reunidos — boa parte deles comissionados especialmente para essa edição, para “desdobrar os princípios criativos da incerteza em diferentes direções”.
Foi partindo dessa ideia que o arquiteto Alvaro Razuk desenvolveu o projeto expográfico. “Não pensamos em uma arquitetura que tivesse uma rua principal e espaços secundários”, diz. “Por isso que o visitante vai encontrar aqui diversos caminhos e diversas surpresas.”
Nessa ecologia construída, os pontos cardeais apontam para obras como Turba, Turbo(2015), da polonesa Iza Tarasewicz. Trata-se de uma escultura tubular que emula “a maior máquina do mundo”, o Grande Colisor de Partículas do CERN, na Suíça. Uma seleção de materiais é colocada na estrutura para serem “acelerados”, com a diferença, aqui, de que a mecânica quântica fica por conta da composição e da interação com o espectador.
Em outra camada de interação completamente distinta, Iza ainda traz para a Bienal o projeto de pesquisa Mbamba Mazurek (2016) performance de dança e música que investiga as influências do ritmo polonês mazurka no mundo todo, principalmente, diz ela, no Caribe — e daí, até para o Brasil. Está marcada para o dia 8, às 20h, no segundo piso do Pavilhão da Bienal.
Em outro suporte e direção, o alagoano Jonathas de Andrade estreia O Peixe (2016), mescla de ficção e documentário que mostra a vida e o trabalho em uma vila de pescadores no sul de Alagoas. Ali, onde o rio São Francisco encontra com o mar, os pescadores encenam um ritual tradicional, em que abraçam os peixes logo que eles são tirados da água. “É como uma passagem para a morte”, explica Jonathas.
A ideia de “jardim” de Jochen Volz contempla, ainda, uma integração do espaço expositivo modernista com o lugar que o abriga, o Parque do Ibirapuera. Daí a instalação Arrogation (2016), da sul-coreana Koo Jeong A, que consiste numa pista de skate ao ar livre, para uso público, que fica fosforescente à noite e pode ser vista das janelas do edifício.
Já em Sound Mirror (2016), do argentino Eduardo Navarro, um dispositivo conecta acusticamente o pavilhão com uma palmeira no parque. No térreo, um conjunto de esculturas de madeira talhadas de Frans Krajcberg serve de transição entre o lado de fora e o dentro.
Outra obra que atende a essa demanda de diálogo entre interno e externo é Transnômades (2016), do coletivo OPAVIVARÁ!. O trabalho reúne sete “módulos móveis” — ou carrinhos. “Eles foram inspirados nos carrinhos dos carregadores do Ceasa e no de catadores de lixo, e representam esse circuito da alimentação na cidade”, explicam. “Mas a interpretação”, ressaltam, “é aberta”. A ideia é testar essas interpretações do público circulando com os carrinhos pelo pavilhão, pelo parque e por outras áreas da cidade. A ativação acontece no dia 7, às 12h.
No conjunto dos trabalhos, não falta diversidade de suporte, abordagens e origens. Há instalações de som e vídeo da Zâmbia aos Estados Unidos, videoclipes com estética brega, arte digital, horta e restaurante de verdade, além de pinturas, esculturas e gravuras produzidas num mar de técnicas diferentes, a maioria envolvidas em temáticas políticas e sociais, locais ou globais. Tudo está lá: racismo e segregação, questões indígenas, de gênero e ambientais, tirania e repressão.
E há, finalmente, as performances agendadas, dentro e fora da Bienal — em lugares como o Museu Afro-Brasil e o Cemitério da Consolação. Eles serão palco da trilogia To Be Announced, da sul-africana Donna Kukama, pensada com um livro em capítulos: A: The Anatomy of History, B: I, Too e C: The Genealogy of Pain.
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Programação aberta ao público nesta semana
7 de setembro — quarta-feira
10h — Inauguração pública
12h — Transnômades (2016). Ativação OPAVIVARÁ!, saída do estacionamento dos carrinhos, piso térreo
14h — Performance Baile (2016), de Pope.L, por diferentes bairros de São Paulo. Saída do Vale do Anhangabaú (24 por dia até 10/9)
15h — Peça de teatro Corazón del Espantapájaros (2015–2016), de Naufis Ramírez Figueroa (20 mim), terceiro piso
17h — Ágora: OcaTaperaTerreiro (2016), com Lucina. Ativação Bené Fonteles, piso térreo
19h — Performance C: The Genealogy of Pain (2016)
8 de setembro — quinta-feira
20h-22h — Performance Mbamba Mazurek, de Iza Tarasewicz, segundo piso
9 de setembro — sexta-feira
17h — Performance A: The Anatomy of History, de Donna Kukama, no Museu Afro-Brasil
10 de setembro — sábado
13h-22h — Performance B: I, Too, de Donna Kukama, no auditório/lounge Bienal de São Paulo
15h — Peça de teatro Corazón del Espantapájaros (2015–2016), de Naufis Ramírez Figueroa, terceiro piso
16h — Apresentação de Along Song (2016), de GuGuOo (Güneş Terkol, Güçlü Öztekin e Oğuz Erdin) (30 min), terceiro piso
17h — Ágora: OcaTaperaTerreiro (2016), com Ayrson Heráclito. Ativação Bené Fonteles, piso térreo
19h — Performance musical TabomBass (2016), de Vivian Caccuri, segundo piso. Com artistas convidados, repete-se uma vez por mês aos sábados
(8/10, 05/11 e 10/12 às 19h), com duração de 90 minutos.
11 de setembro — domingo
17h — Ágora: OcaTaperaTerreiro (2016), com Marlui Miranda. Ativação Bené Fonteles, piso térreo
Ativações sem horário fixo:
Psychotropic House: Zooetics Pavilion of Ballardian Technologies(2015–2016), de Nomeda & Gediminas Urbonas, primeiro piso
En Forma de Nosotros (2016), de Rita Ponce de León, piso térreo
Restauro (2016), de Jorge Menna Barreto, primeiro piso
Oficina de Imaginação Política, idealizada por Amilcar Packer, segundo piso