“Ordinários”, da Cia. La Mínima destaca a tragicomédia do homem servil a uma ordem de mundo incompatível com a sua natureza
Por Gabriela Mellão
O mais recente trabalho da Cia. La Mínima transforma em arte elementar, no melhor sentido da palavra, uma reflexão sobre as incongruências do mundo contemporâneo. A trama de Ordinários retrata uma guerra kafkiana comandada pela projeção de forças superiores, tendo como linha de frente o autoritarismo de um pequeno poder ignorante e vaidoso.
Apesar da espantosa atualidade da temática, o processo de criação é anterior à instauração do novo governo do país. O espetáculo, assinado pelo La Mínima e também por Newton Moreno e Alvaro Assad (diretor do espetáculo) estreou em pleno período de eleição presidencial, em novembro do ano passado.
A reflexão ultrapassa a barreira do tempo e se apresenta tanto de modo circunstancial como abrangente, ao retratar também a inadequação do homem ao sistema que integra, tanto como agente quanto como vítima.
O trio de intérpretes é virtuoso, composto por Fernando Sampaio — fundador do La Mínima em 1997 ao lado de Domingos Montagner (1962- 2016) -, Fernando Paz e Filipe Bregantim. Mescla a linguagem do palhaço e do artista popular integrando entretenimento, reflexão e simplicidade como raramente se vê nos palcos.
Em cena, eles formam o que se pode chamar de pelotão da inaptidão. A inconsistência do líder opressor (Bregantim) se soma à fragilidade do Segundo soldado (Sampaio) e aos delírios poéticos do Terceiro (Paz), de forma a ressaltar a falência de um sistema social cuja engrenagem bélica a vulnerabilidade humana não dá conta de manejar.
O público se comove ora com o absurdo de sua própria condição, ora com a singeleza da montagem, leve e despretenciosa na forma mas de um apuro supremo em sua elaboração.
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Ordinários, da Cia. La Mínima. Teatro Vivo (Av. Dr. Chucri Zaidan, 2.460). Quartas e quintas, às 20h. Até 12 de dezembro. 14 anos. R$ 40.