“Nossa relação daria outro filme”
Casada por quatro anos com Arlindo Barreto — o palhaço Bozo — , a atriz Zélia Diniz fala sobre sua vida e elogia o filme “O Rei das Manhãs”
Considerada uma das mulheres mais lindas do país, Zélia Diniz foi modelo, assistente de palco do programa Silvio Santos, atuou em filmes da Boca do Lixo (as famosas pornochanchadas) e ficou casada com Arlindo Barreto, cuja história inspira o filme Bingo — O Rei das Manhãs (2017), por quatro anos. Entre 1979 até o final de 1983 o casal viveu uma relação intensa, de alegrias e tristezas, e parte desta relação é contada no filme.
“Eu adorei o filme. Um roteiro surpreendente e que se tornou uma superprodução. A escolha do elenco foi afinadíssimo, e eu creio que o Vladimir Brichta merece concorrer a todos os prêmios do cinema. Em certos momentos eu tinha a impressão que era o próprio Arlindo na tela. Tenho certeza de que este filme será lembrado como uma pérola do cinema nacional. O filme conta também quão grande foi e é o seu amor pelo nosso filho Diego. E não só isso: mostra principalmente seu encontro com Deus e a sua superação”, conta a atriz que se emocionou ao ver o filme na pré-estreia. “Eles focaram no meu lado mãe, que na minha opinião, não deixou nada a desejar”.
Na produção ela é representada pela atriz Tainá Müller. “Ela foi perfeita! Transmitiu toda uma emoção como mãe. Assistindo ao filme revivi momentos de minha vida através da representação dela. Foi maravilhosa, não consigo visualizar outra pessoa para este papel”.
A história de Zélia Diniz e Arlindo Barreto
O filme retrata a história de Arlindo Barreto desde o inicio de sua carreira como ator até chegar ao ápice ao interpretar o palhaço Bozo nas manhãs do SBT. “Encontrei o Arlindo pela primeira vez durante as gravações do filme O Inseto do Amor (filme dirigido pelo cineasta Fauzi Mansur lançado em 1980). Depois, através do Ody Fraga (cineasta e roteirista) e sua esposa Dani, com quem eu tinha amizade na época, nos encontramos em um jantar no apartamento deles. O Ody estava escrevendo o roteiro do filme Palácio de Vênus, no qual eu e o Arlindo participaríamos. Foi quando tudo começou. Arlindo era muito romântico e extremamente inteligente”.
Esses quatro anos foram intensos e ali colecionaram inúmeras histórias, parte delas exibida no filme.
“Terminamos nosso relacionamento pelo desgaste emocional. Estávamos discutindo muito e nosso filho ainda era pequeno. Não queria criá-lo naquele ambiente de conflito. Uma coisa que gostaria de ressaltar é que o Arlindo, apesar de seu envolvimento com o alcoolismo e as drogas, ficava na dele. Nunca me ofereceu nada, tampouco comentava o assunto, nunca usou nada em nossa casa”.
Dentro de casa Arlindo Barreto era brincalhão, sempre divertia a família. Com o nascimento do filho Diego essa graça só aumentava. “Eu sempre disse a Arlindo que ele era um péssimo marido, mas um pai maravilhoso”.
Sem conhecimento
Durante os quatro anos de relacionamento com Arlindo Barreto, Zélia não fazia ideia da gravidade da situação que rondava a sua própria casa. “Por incrível que pareça, eu era uma pessoa muito cega em relação a drogas. Não tinha conhecimento. Eu achava que aquele tipo de reação era pelo alcoolismo, talvez misturado com algum remédio para ansiedade, já que na época ele fazia uso desse medicamento. Aliás, até hoje ele é muito ansioso”.
Traições
Outro fator que pesou muito na decisão da separação fora as inúmeras traições. “Eu sei que usuários de drogas têm de ter um acompanhamento psiquiátrico muito intenso, mas o amor à família é fundamental. Os homens acham que conhecem as mulheres. Se enganam!”. Enigmática, complementa: “Nós agimos em silêncio e nos aprofundamos no desconhecido”.
O homem do baú
Zélia Diniz, ao contrário de Arlindo Barreto, iniciou sua trajetória artística na televisão. “Em 1974 eu morava em Franca, interior de São Paulo, e vim a passeio. Uma amiga me pediu pra que eu a acompanhasse ao programa Silvio Santos. Quando me dei conta estava sentada na primeira fileira do auditório. Ele me viu e me fez o convite pra trabalhar lá. A princípio eu disse que não, que minha mãe não aceitaria e que eu tinha meu trabalho em Franca. Era secretária em uma fábrica de calçados. Ele insistiu e pediu pra que eu deixasse um contato onde pudesse me encontrar, passei a ele o número do telefone. Terminada as gravações, fui embora para minha cidade e segui minha vida normal como sempre. Depois de uns 20 dias recebi uma ligação, era o próprio Silvio Santos reforçando o convite, pedindo pra que eu me mudasse para São Paulo com minha família. Assim eu fiz, por felizes dez anos.”
Zélia Diniz foi assistente de palco na TVS (atual SBT), na emissora participou ainda de duas novelas (Vida Roubada e Acorrentada, em que contracenou com Denise Del Vecchio e Jonas Mello), programas humorísticos e até policiais. Desempenhos que, segundo ela, sempre foram muito elogiados por Silvio Santos.
O cinema
O sucesso na televisão rendeu convite para o cinema, fazendo o caminho inverso do ex-marido Arlindo Barreto. Amadas e Violentadas (1975) foi seu filme de estreia, e logo em seguida engatou uma série de produções. “Um filme que me marcou muito foi Por um Corpo de Mulher (1979). Ter trabalhado com diferentes atores, diretores, produtores me proporcionou uma vasta experiência. Creio que minha passagem pelo cinema foi curta, porém marcante por todos os filmes de que participei. Tive uma carreira muito linda no cinema , na televisão, como manequim de grifes famosas e como modelo fotográfico, me sinto totalmente realizada . Éramos atores e atrizes com talentos e beleza natos e nos colocávamos em frente às câmeras com a cara e a coragem, em uma época onde não existiam efeitos digitais, não tínhamos um corpo construído com cirurgia plástica ou academias, éramos nós por nós mesmos”.
Saudade?
“Sim, bate saudades, passa uma retrospectiva na sua mente. Saudades daquele frescor da juventude, onde você era o centro das atenções, e que tinha todos os holofotes e olhares voltados para você. Saudades dos amigos. Belas recordações e bons tempos vividos com louvor. Mas a saudade é sinal de que realizamos e vivemos coisas boas em nossas vidas. Hoje começa um novo capítulo — em alguns meses vou ser vovó! Meu primeiro netinho, filho do Diego, fruto do meu relacionamento com Arlindo, vai nascer”.
A vida hoje
Quando se separou de Arlindo Barreto, Zélia Diniz resolveu abandonar a carreira no cinema para cuidar do seu filho e logo em seguida foi demitida da televisão. Foi nesse momento que decidiu dar um novo rumo em sua vida. “O trabalho em cinema toma muito tempo, não queria ficar longe dele, e na televisão fui vítima de uma demissão em massa, todas as assistentes foram demitidas à época. Nós tínhamos um salário alto e éramos contratadas como atrizes. Disserem que era contenção de despesas. Quando fui demitida fiquei ainda um ano como auxiliar do Flávio Cavalcanti. Foi aí que resolvi abandonar a carreira em definitivo. Este ano, depois de muito tempo, voltei ao auditório do Silvio Santos para matar saudades, e ele me reconheceu no meio da plateia”.
Ela é uma mulher resolvida, sente saudades do glamour, mas não do ofício de atriz. Está afastada da mídia e não pensa em voltar a atuar pra valer. Casada há 23 anos com o empresário Lázaro Padilha, atualmente ela administra a loja Toque Secreto, um trabalho artesanal de desidratação de buquês de noiva e os transforma em quadros. Sua pequena empresa atende todo o Vale do Paraíba, região onde reside, além de São Paulo e Rio de Janeiro. “Meus trabalhos já foram até para países da Europa e também Estados Unidos”, conta orgulhosa.
Volta ao SBT?
E se o Silvio Santos, como fez em 1974, telefonasse pra ela pedindo para voltar ao SBT, qual seria a sua reação? “Nem responderia por telefone, voltaria correndo e começaria tudo outra vez!”.
O que vem por aí?
Passa pela sua cabeça a ideia de lançar uma autobiografia, revelando histórias tão impactantes quanto às de Arlindo Barreto. “Se eu contar agora, não vai ter graça nenhuma, vou guardar tudo para o livro”.
Vai tirar alguma do baú?
“Minhas histórias giram em torno de relacionamentos que tive, são histórias profundas e surpreendentes. Fui de poucos relacionamentos, mas todos eles verdadeiros, alguns surpreendentes”. Muito focada no trabalho, Zélia não se dava ao trabalho de flertar. “Se perderam a cabeça comigo eu não sei, só sei que não saía procurando a cabeça de ninguém”.
Sua vida foi recheada de acontecimentos interessantes, será que daria também um filme? “Acho que todos nós nascemos para escrever um capítulo na história. Participamos de fatos interessantes, episódios marcantes, superações… Creio que todos nós poderíamos ter um filme de nossas vidas. Se fosse focar só na minha trajetória com Arlindo seria assunto para um segundo filme”.