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Caderno de leituras

Por Bravo
Atualizado em 21 set 2022, 22h15 - Publicado em 28 jul 2020, 15h29

Três livros essenciais para quem quer fazer humor com espírito e finesse

Terry Eagleton

Por Carlos Castelo

Humor virou mania nacional e sinônimo de stand-up. Calma, não é bem assim. Existem múltiplas formas de se praticar aquilo que Ludwig Wittgenstein dizia não ser um estado de espírito, mas uma visão de mundo.

O que a turma da comédia em pé deveria conhecer são os mecanismos dessa manifestação tão milenar quanto o bobo da corte de César. Sugiro a leitura de três livros essenciais aos interessados em redigir humor com espírito e finesse. Seria uma ótima contribuição num momento em que estamos tão precisados de riso inteligente.

Os Chistes e sua Relação com o Inconsciente — Sigmund Freud (Companhia das Letras)

Lançado em 1905, é uma espécie de “pai” dos ensaios sobre humor. Nele, Freud defendeu que os chistes representam uma liberação da energia psíquica que investimos na manutenção de determinadas inibições sociais. No instante em que relaxamos tal repressão do superego, poupamos o esforço inconsciente que ela demanda e o gastamos na forma de riso. Para Freud, a forma prazerosa da piada — trocadilho, nonsense, associação absurda — levaria o superego a descontrair-se por um instante. Isso daria ao caótico “id” a oportunidade de empurrar o sentimento censurado para a frente. No popular: pra darmos boas risadas, o id precisa sacanear o superego.

Cinco Ensaios Sobre Humor e Análise do Discurso- Sírio Possenti (Parábola)

Os cinco textos do professor titular do departamento de Linguística da Unicamp Sírio Possenti esmiuçam as diversas formas do campo humorístico: dos provérbios aos cartuns. Num trecho, ele faz um paralelo curioso do humor em relação à Ciência. Começando por contar uma piada, é claro:

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Um bêbado procura algo embaixo de um poste de luz, numa ruela. Um amigo que passou por lá o viu e lhe perguntou o que estava fazendo.

– Procurando a chave da casa, respondeu o bêbado.

– Você tem certeza de que a perdeu aí? — perguntou o amigo.

– Não — respondeu o bêbado –, mas aqui tem luz.

Possenti explica que “a piada é um golpe surpreendente no empirismo. Esta filosofia diz que o conhecimento se produz analisando dados e extraindo deles uma generalização, uma lei, uma verdade (o mundo falaria a quem o ‘ouvisse’sem ideias preconcebidas). A piada diz o contrário: os cientistas procuram ‘verdades’ onde há luz, isto é, a partir de hipóteses, porque só assim os próprios dados fazem algum sentido.”

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Humor — O Papel Fundamental do Riso na Cultura — Terry Eagleton (Record)

Outro dia li uma crítica a este livro escrito pelo professor da Universidade de Lancaster num blog “literário”. O blogueiro confessava estar chateado por achar que a obra o faria rir. E tudo o que o Eagleton fazia era enfileirar teorias filosóficas sobre uns sujeitos com quem ele não estava familiarizado. Entre eles, um tal de Bakhtin.

Digo isto por que a coluna dessa quinzena é dedicada aos que pretendem melhorar a sua produção humorística. “Humor” é denso, não tem nada de engraçado. Repassa de Aristóteles e Tomás de Aquino a Hobbes, Freud e Bakhtin, observando os mecanismos psicanalíticos ligados ao humor e sua evolução social e política.

Por outro lado, os que se encorajarem a lê-lo entenderão a razão pela qual o humor pode ser utopia e, ao mesmo tempo, arma política contra os poderosos. E, sem dúvida, o nível das nossas lives e stand-ups também melhorariam sobremaneira.

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