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Cadernos de leituras

Por Bravo
Atualizado em 21 set 2022, 22h14 - Publicado em 2 fev 2021, 12h53

As “vívidas e líricas metáforas e similitudes” da prosa de Raymond Chandler

Por Carlos Castelo

Chandlerismo: escrita ou diálogo que utiliza vívidas e líricas metáforas ou similitudes, características da obra do escritor Raymond Chandler.

Esta definição dicionarizada é o que mais me encanta na obra de Chandler. Em especial, as proferidas pelo impagável Philip Marlowe.

Como afirma Bráulio Tavares, escritor e tradutor de Raymond Chandler: “Seus símiles são famosos, e para mim sempre foi óbvio que ele anotava essas coisas numa pasta e depois pinçava para usar nos livros. Isso ficou provado com a publicação de The Notebooks of Raymond Chandler, sobre o qual escrevi este artigo no meu blog.”

“O estilo dele se baseia muito em certo tipo de observação, onde entra não apenas o ‘olho clínico’ capaz de perceber as nuances do comportamento humano, mas a escolha precisa e inesperada de palavras”, acrescenta Tavares.

Cheguei a ponto de colecioná-las num caderninho de notas, tamanha admiração por tais pérolas de concisão e inteligência. Selecionei algumas do livro Adeus, Minha Querida. No entanto, se eu fosse você, as procurava também em A Irmã mais Nova, O Sono Eterno, O Longo Adeus e A Dama do Lago. Todos lançados pela Companhia das Letras.

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Abaixo, os meus chandlerismos ‘do peito’:

O cheiro da lanchonete era tão forte que dava para construir uma garagem em cima dele.

Uma loura daquelas de fazer um bispo quebrar um vitral com um pontapé.

Um rosto belo, mas não tão belo que você tenha que sair portando um soco inglês toda vez que levar o rosto para passear.

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A voz esfriou mais depressa do que um jantar de cafeteria.

Teria uns bons 60 anos, aliás nem tão bons assim.

Ela me deu um sorriso que me aqueceu até o bolso das calças.

Era tão educado que tive vontade de carregá-lo para fora da sala para mostrar meu reconhecimento.

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Estava mais velho do que o Egito agora.

E, por trás da mesa, uma mulher sentada sorria para mim, um sorriso tenso e ressequido que poderia se transformar em pó se alguém o tocasse.

Usei o joelho na cara dele. Meu joelho doeu. Ele não me disse se a cara doeu também.

Era como o sorriso do carrasco quando vem a sua cela medir sua altura para preparar a corda.

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Esvaziei o copo e pus minha expressão cansada de volta no rosto.

A boca da mulher se abriu e seus dentes mostraram aquele agradável fulgor que vem de passarem a noite num copo cheio de solução.

A voz do vendedor de cachorro-quente fendia o crepúsculo com um machado.

O jantar de oitenta e cinco centavos tinha o gosto de uma sacola de carteiro jogada fora.

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O prefeito está cuidando disso tudo, e trocando de calças, de hora em hora, enquanto a crise durar.

Essas madames ricas são mais fáceis de levar pra cama do que uma almofada.

O aposento era como um camarote e não era como um camarote.

As balas não fizeram mais ruído do que uma mão ao entrar numa luva.

Em tempo: se você aprecia um bom romance policial, não apenas hardboiled, mas com toques de sofisticação, visite este outro blog do Bráulio Tavares. Quando estava traduzindo os livros de Chandler, ele passou a mantê-lo com diversos comentários sobre o processo. Está inativo, mas contém 19 postagens chandlerianas longas e numeradas.

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