Flip, Mostra de Cinema de SP e Queermuseu concorrem ao prêmio, definido a partir do voto de mais de 100 especialistas
Em um ano em que a arte e a cultura estiveram contra a parede, diversos eventos culturais novos e tradicionais brigaram para seguir existindo e manter a relevância, retirando forças de reivindicações históricas e contemporâneas. Os finalistas ao Prêmio Bravo! de Cultura na categoria de Melhor Evento de Cultura trouxeram a crise dos refugiados, o protagonismo negro e a luta por diversidade de gênero e sexual para o centro da roda e, juntos, compõem um mosaico de como as questões sociais mais urgentes da sociedade têm ecoado no mundo da cultura.
Os três finalistas foram definidos a partir dos votos dos membros da Academia Bravo!, formada por mais de 100 especialistas que, independente de sua área de atuação, contribuíram para as votações de interesse geral: Evento e Programação Cultural.
No ano passado, a Mostra Internacional de Teatro de São Paulo — Mitsp, que teve a questão racial como mote, levou o prêmio. O vencedor deste ano será anunciado no dia 27 de março em cerimônia na Casa de Francisca, em São Paulo.
Conheça os finalistas.
Festa Literária Internacional de Paraty — Flip
Em linha com o clamor de artistas, intelectuais e ativistas negros — que há anos denunciam sua baixa representatividade em eventos literários — a Flip de 2017 colocou a questão racial no centro do debate. Não só o racismo foi largamente discutido como a festa literária foi marcada pelo protagonismo negro, seja pela figura do grande homenageado do evento, Lima Barreto; pela abertura dos trabalhos com o ator e escritor Lázaro Ramos; pela presença dos premiados autores internacionais Marlon James, Paul Beatty e Djaimilia Pereira de Almeida; pela inteligência feminista de Conceição Evaristo e Ana Maria Gonçalves; e, é claro, pela participação de Diva Guimarães, professora aposentada que compartilhou um forte relato pessoal sobre resistência ao racismo durante um debate.
Mostra Internacional de Cinema de São Paulo
Evento incontornável do calendário cultural da cidade, a Mostra proporcionou aos cinéfilos um verdadeiro banquete em sua 41ª edição: nada menos do que 394 filmes em 14 dias. O artista chinês Ai Weiwei concebeu a arte do pôster e abriu o evento com o documentário Human Flow — Não Existe Lar se Não Há para Onde Ir, que imprimiu a marca da crise dos refugiados na Mostra. Entre os destaques da programação estavam retrospectivas de Paul Vecchiali e Agnès Varda (cujo novíssimo Visages, Villages foi também exibido); o filme sueco The Square, provocação de Ruben Östlund ao mundo da arte contemporânea que levou a Palma de Ouro em Cannes; um fórum de debates sobre os rumos do cinema e, como já é tradição, as sessões ao ar livre no vão do Masp e no Parque Ibirapuera, onde O Homem Mosca, clássico de 1923 com Harold Lloyd, recebeu trilha sonora ao vivo da Orquestra Jazz Sinfônica. O documentário chileno O Pacto de Adriana, de Lissette Orozco, foi o grande vencedor da Mostra e levou o Troféu Bandeira Paulista, escolhido pelo Júri.
Queermuseu — Cartografias da Diferença na Arte Brasileira
A exposição coletiva com curadoria de Gaudêncio Fidelis levou ao Santander Cultural de Porto Alegre obras de artistas brasileiros de diferentes períodos — de Alfredo Volpi a Adriana Varejão, passando por Lygia Clark e Leonilson — que, vistas em conjunto, constituíam uma provocação à heteronormatividade e à baixa diversidade dos museus brasileiros ao mesmo tempo em que oferecia novos olhares sobre o tema. A mostra foi interrompida arbitrariamente pelo centro cultural em setembro — com menos de um mês em cartaz — após protestos de grupos conservadores que acusavam o Santander Cultural, a curadoria e os artistas de compactuarem com a pedofilia e a zoofilia. O caso abriu precedente para outros ataques, como o sofrido pelo artista Wagner Schwartz após performance no MAM de São Paulo. Neste sentido, Queermuseu tornou-se um símbolo de resistência das artes contra o retrocesso e pela diversidade. Um financiamento coletivo em andamento luta para levar a exposição ao Parque Lage, no Rio de Janeiro.
Mais: releia o manifesto sobre o assunto publicado pelos editores da Bravo! em outubro do ano passado.