“Entre os Homens de Bem” retrata polarização política no Congresso
Dentre as novidades do Festival de Cinema de Brasília deste ano está o destaque — não só cabido como atual — a filmes políticos, na mostra “A Política no Mundo e o Mundo da Política”. “Entre os Homens de Bem”, dirigido por Carlos Juliano Barros, é um dos filmes que integra a programação e traça um perfil do deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ), a partir de sua vida pública e privada, mostrando tanto o seu combate à chamada Bancada Evangélica como retratos da sua religiosidade e intimidade.
“Entre os Homens de Bem” será apresentado nesta sexta-feira, 23, no Festival de Brasília e em outubro no Festival do Rio. Posteriormente, o documentário deve entrar em circuito comercial. Abaixo, o diretor Carlos Juliano Barros escreveu um depoimento sobre as gravações e o lançamento do filme, num período em que se agrava ainda mais a polarização política no Congresso.
Entre os Homens de Bem
Por Carlos Juliano Barros
No já distante ano de 2012, quando apresentei a Jean Wyllys a ideia de fazer um documentário sobre o perceptível acirramento de ânimos no Congresso Nacional, ninguém poderia imaginar que a crise do país chegaria ao ponto de varrer do mapa político a Presidente da República e o Presidente da Câmara dos Deputados em apenas 15 dias.
Mesmo assim, seguir de perto os passos do primeiro parlamentar assumidamente gay a defender a bandeira LGBT, revelando os bastidores do coração do poder do país, já se mostrava uma missão imperativa. Não havia dúvidas de que um capítulo tristemente belicoso — mas absolutamente instigante — da história do Brasil estava se desenhando e precisava ser documentado.
Naquela época, o que realmente interessava à equipe de “Entre os Homens de Bem” era o embate entre “progressistas” e “conservadores” que explodia nas redes sociais e ganhava cada vez mais espaço na mídia. Bate-bocas em torno de temas como casamento gay, direito ao aborto e legalização da maconha davam pistas de que um fosso mais profundo do que se supunha havia cindido os brasileiros. Jean Wyllys, por sua vez, parecia o fio condutor ideal para amarrar todas as pontas soltas dessa narrativa.
Quando desembarcou no Congresso Nacional, Jean Wyllys era uma personalidade completamente sui generis: gay, nordestino, vencedor de reality show global e deputado eleito por um partido de extrema esquerda. Um pastiche ambulante difícil de categorizar e cuja trajetória, por si só, já renderia um filme. Para alguns, ele era apenas uma subcelebridade frustrada em busca de mais 15 minutos de fama. Outros o consideravam tão somente um imoral convicto disposto a abalar as estruturas da família tradicional brasileira. Juízos de valor à parte, o fato é que, por suas qualidades e defeitos, Jean Wyllys se tornou em pouco tempo um dos mais potentes para-raios da política nacional, amado e odiado como poucos.
Desde sempre, “Entre os Homens de Bem” — que nesta sexta-feira, 23, faz sua estreia no Festival de Brasília — se propôs a ir além do mero perfil de um político controverso. E jamais se prestou ao papel de propaganda política gratuita. Aliás, Jean Wyllys nunca deu um pitaco sequer sobre a edição do filme e nem se envolveu na produção do documentário, como boatos maldosos da internet tentaram fazer crer.
O objetivo da equipe sempre esteve claro e evidente: retratar um país em ebulição, prestes a explodir. A profusão de conflitos registrados nos corredores, nas audiências públicas e nos plenários do Congresso Nacional mostram que nossas suspeitas estavam corretas: um ponto de inflexão da história brasileira estava acontecendo diante de nossos olhos e de nossas câmeras.
O objetivo da equipe sempre esteve claro e evidente: retratar um país em ebulição, prestes a explodir. A profusão de conflitos registrados nos corredores, nas audiências públicas e nos plenários do Congresso Nacional mostram que nossas suspeitas estavam corretas: um ponto de inflexão da história brasileira estava acontecendo diante de nossos olhos e de nossas câmeras.
Durante os mais de três anos em que acompanhamos Jean Wyllys, poucos fatos chamaram tanto a minha atenção quanto a certeza de que cresce, numa velocidade assustadora, o exército de pessoas muito jovens que se assumem conservadores — com orgulho e em alto e bom tom.
No Congresso Nacional, garotos sem um fio de barba e espinhas abundantes no rosto, vestindo os ternos impecáveis típicos dos pastores evangélicos neopentecostais, estão sempre a postos nos corredores e nas audiências públicas para fazer barulho em defesa dos valores de um cristianismo obscurantista e de um militarismo autoritário. Num passado recente, essas forças conservadoras eram tidas como folclore da fauna política. Hoje, cobram um pedágio cada vez mais caro no balcão de negócios instalado em Brasília.