O culpado
Contos Reunidos, de Luiz Lopes Coelho, chegou para provar que a literatura policial não é apenas possível no Brasil — ela é também de boa qualidade
Por Carlos Castelo
Sempre houve uma alentada discussão sobre a possibilidade ou a impossibilidade de uma literatura policial no Brasil. Ali pelos anos 1950, o grande cronista Luiz Martins, de O Estado de São Paulo, chegou a declarar que a novela policial só poderia se desenvolver em países cujas instituições políticas e jurídicas se baseassem em normas essencialmente democráticas, onde houvesse um autêntico respeito pela pessoa humana. Isto se o autor não quisesse fazer uma obra falsa, sem nenhuma verossimilhança, já que aqui no Bananão a polícia começaria prendendo todos os suspeitos e a obra não passaria da terceira página. Ou seja, não haveria romance e sim uma trágica sucessão de espancamentos, interrogatórios, torturas físicas e notícias nos jornais de escândalo.
Luiz Lopes Coelho (1911–1975) apareceu para provar o contrário. Sim, a novela policial brasileira era totalmente factível e de excelente cepa. Impôs tanta excelência, que, afora um Rubem Fonseca, fica mesmo difícil encontrar representantes à altura de LLC até hoje.
Tive a sorte de conhecer a obra do mestre do mistério à brasileira bem cedo. Quando estava com 20 e poucos anos descobri, no sebo do Messias, A Morte no Envelope (1957). Mais precisamente o exemplar 2597 da edição da Civilização Brasileira de 1957.
O conto de abertura, Crime Mais Que Perfeito, de apenas sete páginas, já faria com que nunca mais me esquecesse daquele estilo econômico, eficaz, singular. Todas as outras 17 histórias, muitas delas centradas na figura sagaz do “velho delegado Leite” eram muito bem urdidas. Não tratava-se apenas de narrativas policiais que descrevem um brutal crime de morte, tinham bossa.
Virei leitor contumaz, sempre de edições antigas e desbotadas garimpadas pelos sebos da vida. Resolvi, inclusive, iniciar este espaço destinado aos livros na Bravo! pela coletânea da obra de LLC lançada pelo Sesi-SP Editora por pura alegria. Não terei mais que manipular fungos e traças sempre que quiser retornar aos textos do nosso W. Somerset Maugham. Ao contrário, esta nova edição, intitulada Contos Reunidos, está à altura do melhor do escritor e traz, além de A Morte no Envelope, os livros O Homem Que Matava Quadros (1961)e A Ideia de Matar Belina (1968).
O Brasil continua prendendo todos os suspeitos (agora preventivamente), a polícia é uma das mais truculentas do planeta e os jornais deitam e rolam noticiando barbaridades de todos os matizes. Contudo, o cronista Luiz Martins, em toda sua perspicácia e graça, dessa vez não teve razão. LLC, além de quebrar paradigmas, tornou-se um de nossos mais parrudos escritores de ficção policial de todos os tempos. Caso encerrado.
______
Contos Reunidos, de Luiz Lopes Coelho. SESI-SP Editora, 408 págs., R$ 69.