A happiness do seu filho está diretamente ligada à freedom do seu país, isn’t it?
Jurandir chega mais cedo aquele dia em casa, talvez ainda pegue Kauê acordado.
Em vão.
Ao entrar na sala, a esposa posta o indicador sobre os lábios pedindo silêncio. Jurandir faz um pequeno muxoxo. Afrouxa a gravata, joga o paletó sobre uma cadeira e tira os sapatos.
Penalizada, a esposa pega a mão de Jurandir e o leva, pé ante pé, até o bercinho do filho, que naquela semana completara duas primaveras.
Os dois ficam mirando o rebento rosado ressonando, com grande orgulho, por algum tempo.
Em seguida, Kauê começa a se mexer. Vira-se de um lado para o outro, aninhando-se. Mas, no meio de um desses movimentos, abre os olhos e vê o pai.
Imediatamente a fisionomia do bebê ganha uma alegria sem-par. Então ele abre um sorriso franco e diz:
– Hi, daddy…
Jurandir lança um olhar esbugalhado para a mulher.
– Marta, ele está falando comigo em…
A esposa completa:
– Sim, meu amor, ele está falando com você em inglês. Não é uma coisinha?
Kauê então completa a frase:
– …let´s play football in the garden with me?
O casal se abraça, emocionado. Kauê insiste:
– Daaaaddy! Come with me, pleaaaase!
São interrompidos pela buzina da perua escolar. Ela traz Diogo, o mais velho, de 6 anos. Mamãe deixa Jurandir e Kauê no quarto e vai até o portão receber o outro filho.
Pega-o no colo, enche-o de beijos. Mas o menino vem cheio de mau humor.
– Oh, mammy, leave me alone! I just want a warm bath with my toys. Is it possible?
Parece roteiro de filme hollywoodiano. Mas o fenômeno se alastra por todo o Brasil. São as escolas de educação infantil com opção bilíngue.
Uma montanha de autidóres aponta a nova tendência. São ursinhos, cachorrinhos, elefantinhos (ou funny bears, happy dogs and small elephants) — todos mostrando a possibilidade de falar facilmente o idioma de Shakespeare.
Os argumentos a favor são repetidos à larga. O mundo globalizado, a necessidade de um idioma comum, a competitividade cada vez maior no mercado. Ou o batido “seu filho precisa estar preparado para o futuro”.
Para ajudar no debate, que tal um parecer não tão favorável assim?
Pois bem.
Não faz muito tempo, uma universidade norte-americana adquiriu por US$ 70 milhões o controle acionário de uma tradicional universidade privada de São Paulo.
É o caso de pensar com calma no momento das futuras matrículas.
Afinal, a happiness do seu filho está diretamente ligada à freedom do seu país, isn´t it?
****
– Como é teu nome?
– William Shakespeare.
– Meio complicado pra um poeta, não?
– Tem alguma outra sugestão?
– Que tal Willy Shake, mais pop.
– Humm, talvez.
– O que é esse calhamaço aí?
– Hamlet, uma peça de teatro.
– Teatro? Ih, cara, palco não tá com nada. Que tal fazer uma sinopse de uma série pro Netflix?
– Posso tentar.
– Volta quando tiver pronto a storyline, beleza?
– Ok.
– Ah, me diz uma coisa, tem quantos seguidores no Instagram?
– Não tenho Instagram.
– Opa, então deu ruim. Publica então esse teu Hamlet aí no site da Amazon. Teu lance é autoedição, Will.