Uma miniestória dos minicontos
Alguns dizem que os minicontos no Brasil começaram com Dalton Trevisan ou a internet, mas Oswald de Andrade e Paulo Mendes Campos cometiam suas mininarrativas muito antes
Por Carlos Castelo
Desde que conheci, nas aulas de Literatura do colégio, o assim chamado poema-piada AMOR/HUMOR, de Oswald de Andrade, que os minicontos me chamam a atenção. Infelizmente, não chamam tanta atenção assim da fortuna crítica. As razões são inúmeras e não caberiam nesta resenha. Mas aponto algumas para não deixar de ilustrar meu ponto de vista.
Por exemplo, a dificuldade de se situar o que é uma mininarrativa. Uns acham que é poesia, outros que é uma espécie de conto preguiçoso. Há até uma dificuldade de caracterizar o minirrelato pela sua dimensão. Para a escritora e editora Laís Chaffe, pioneira no lançamento de livros do gênero no Brasil, o melhor é usar o bom senso.
“Miniconto é um conto bem pequeno, um parágrafo, até uma página dá para chamar assim. Peço aos autores textos de até 500 caracteres, com espaço. Isso para definir um limite, evitar discrepâncias. Contudo, seria absurdo dizer que, se um autor escreve 600 caracteres, não é miniconto. Quem vai definir isso? Vamos usar fita métrica como critério literário?” — pondera.
Laís editou nomes definitivos para as miniestórias nacionais, como José Eduardo Degrazia e Leonardo Brasiliense, que ganhou o prêmio Jabuti com o livro de mininarrativas Adeus Conto de Fadas (7 Letras, 2006).
Outros mitos ainda acompanham os minicontos: o de que eles começaram com Dalton Trevisan ou na internet. É verdade que o Vampiro de Curitiba é um dos maiores cultores dessa espécie de literatura. O livro Ensaios sobre a Obra de Dalton Trevisan, de Berta Waldman (Editora Unicamp, 2014), traz dois capítulos dedicados ao tema: “O curto infinito de Trevisan” e “Mínimo múltiplo: do conto ao haicai.”
Só é preciso lembrar que, além de Oswald de Andrade, Paulo Mendes Campos também já praticava a síntese em seus escritos com o Continho. Isso bem antes de Trevisan sequer imaginar o icônico Ah, é?.
“Era uma vez um menino triste, magro e barrigudinho, do sertão de Pernambuco. Na soalheira danada de meio-dia, ele estava sentado na poeira do caminho, imaginando bobagem, quando passou um gordo vigário a cavalo:
– Você aí, menino, para onde vai essa estrada?
– Ela não vai não: nós é que vamos nela.
– Engraçadinho duma figa! Como se chama?
– Eu não me chamo não, os outros é que me chamam de Zé.”
(Paulo Mendes Campos. Crônica 1. São Paulo: Ática, 2002)
Por fim, como asseverou Moacyr Scliar no prefácio de Contos Comprimidos (Editora Casa Verde, 2008), o miniconto não é apenas um conto anão. Ele surge com raízes fincadas até mesmo nas parábolas do Novo Testamento:
“O miniconto é um salto dialético. A concisão aí faz com que os parâmetros habituais do conto deem lugar a outros, absolutamente originais.”