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Vênus: Filó, a fadinha lésbica

Por Bravo
Atualizado em 22 set 2022, 12h43 - Publicado em 7 fev 2017, 11h55

Por Beatriz Goulart

A animação Vênus — Filó, a fadinha lésbica, baseada em um poema de Hilda Hilst, é um dos filmes brasileiros deste ano selecionados para o Festival de Berlim. Dirigido pelo mineiro Sávio Leite, o curta estreia no próximo dia 14 em cinco cinemas. Veja a seguir uma entrevista com o diretor, por Beatriz Goulart e assista ao trailer inédito do filme.

De onde pulou a ideia

Segundo o diretor Sávio Leite, o projeto começou em 2009, quando ele foi iniciado na escrita de Hilda Hilst, encantando-se com contos como o Teatrinho nota zero, em que pai e filho são casados com uma ursa, e o Sapo Liu Liu, que não poupa esforços para tomar sol no fiofó. Mas foi no livro Bufólicas que Sávio encontrou a fatalidade da fada Filó. De lá pra cá, o diretor foi apresentando a ideia a possíveis parceiros. Sete desenhistas recusaram o projeto pelo forte teor erótico. Por conhecimento de sua obra e temperamento, creio que a teimosia forjou com mais ardor a sensibilidade necessária para fazer dessa vertiginosa história algo inovador também no cinema de animação.

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A voz, o traço, a trilha, a técnica

O desejo da voz da atriz Helena Ignez surgiu de imediato. Sávio a conheceu num festival de cinema e logo confessou sua admiração, sobretudo “por ter sido a ‘mulher de todos’ os cineastas que importam — Glauber, Julio Bressane e Sganzerla”. Sua interpretação vem com sutis modulações de deboche, deixando entrever o processo de algo macerado à luz de vozes internas, que ecoam sua experiência dramatúrgica. Digamos que Sávio conjurou a mitologia underground que vem perseguindo e cultuando nos 15 anos em que vem produzindo a Mostra Udigrudi Mundial de Animação — MUMIA.

Uma vez estruturado o roteiro, definiu-se que o filme seria feito no processo de rotoscopia, usando gifs como matéria-prima, desenhando sobre decalques de imagens reais. “É uma animação de pessoas fazendo aqueles atos, aqueles gestos, vivendo aquele gozo. Isso deu muita vida ao filme, dá pra se ver a alma das pessoas atrás dos traços e cores aplicados”, diz Sávio.

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O performer das contradições

Ao longo de sua carreira, o diretor tem construído uma série de animações com títulos mitológicos. Por exemplo, em Plutão, a ambiguidade entre inferno e luz é delineada em violentos embates entre personagens, com ações desconcertantes, autofágicas, em que a morte se mata, os braços que lutam enovelam-se, o beijo é letal. Da animação tradicional Sávio parece retirar o osso, construindo para desconstruir, buscando para tornar a perder. Uma possível ode à liberdade plena em que, frequentemente, personagens bizarros se desestruturam, apontando as falhas no tecido social. Sávio professa o elogio aos heterodoxos, subversivos, transgressores, numa obra em que não faltam críticas aos valores burgueses — “acho que ainda existe muita hipocrisia, falso moralismo, e através dos filmes procuro provocar questionamentos diversos”.

Erótico ou pornô?

A discussão sobre o limite entre a pornografia e a arte erótica é um dos sabores do curta. O diretor retrata a personagem como divindade — “poderia ser hermafrodita, mas creio que a fadinha não tem essas dúvidas existenciais — ser homem ou mulher. Ela é uma boca, um buraco aberto. Quem vai falar se é pornografia ou não é o espectador, baseado em sua bagagem cultural — se o filme for apresentado a um país de Bolsonaros será execrado, mas a um Brasil de Jean Willes será muito proveitoso por suscitar essas discussões de gênero, estética, liberdade”, analisa Leite.

BH — Berlim

Para o diretor, a indicação para a mostra Panorama foi surpreendente pelo grande alcance do festival. Além disso, o curta foi também indicado ao prêmio Teddy Awards que há 31 anos dedica um ambicionado ursinho de ouro aos melhores filmes voltados para questões de gênero e sexualidade. “Estar ao lado de grandes realizadores brasileiros, como Laís Bodanski, João Moreira Salles, Daniela Thomaz é uma honra. Acho que esse filme terá uma grande carreira, creio que as pessoas ficarão curiosas para ver a tradução intersemiótica da literatura para o cinema. O público lgbt vai adorar, pois é um filme desse tempo, voltado para essa geração que está imersa na construção do respeito à diferença. Estou curioso para ver a reação dos binários, solitários, polimorfos…”.

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O filme terá sua estréia mundial no próximo dia 14, em cinco cinemas.

Assista ao trailer inédito do filme:

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Veja mais informações nos sites:

https://www.berlinale.de/en/programm/berlinale_programm/datenblatt.php?film_id=201719833#tab=video25

https://blog.teddyaward.tv/blog/2017/01/31/alle-filme-beim-31-teddy-award/

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