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Ver e sentir

Por Bravo
Atualizado em 21 set 2022, 22h25 - Publicado em 23 out 2018, 14h48

Em sua terceira edição, o Valongo Festival Internacional da Imagem, em Santos, celebrou e discutiu as novas maneiras de pensar, ver e consumir imagens

“Sem Título, sem Pele — Da Tragédia à Utopia”, do angolano Kiluanji Kia Henda

Por Diane Lima*

Em uma época de significativa incerteza nacional e global, o Valongo Festival Internacional da Imagem 2018 conclui sua terceira edição confirmando a sua vocação no fomento da arte contemporânea, na produção de conhecimento e na abertura de diálogo com o bairro histórico do Valongo, em Santos.

Após uma intensa jornada de ações, Não Me Aguarde na Retina — título do projeto curatorial desta edição — abriu suas portas ao público nos dias 12, 13 e 14 de outubro, celebrando e discutindo novas maneiras de pensar, ver e consumir imagens.

Reafirmando o caráter democrático de suas proposições, a extensa programação do festival foi inteiramente gratuita, oferecendo — seja nas exposições, no fomento à pesquisa ou nas ações educativas – um rico conteúdo sobre arte e política, considerando a cultura como um campo fundamental para o debate, a reflexão e a proteção dos direitos humanos.

Em um processo de escuta às diversas questões presentes no território associado a uma prática curatorial em perspectiva, a curadoria foi guiada por um questionamento sobre o que podem as imagens numa política dos encontros, entre o que somos e o que nos tornamos quando nos permitimos ser afetados pelas experiências estéticas. Questões que se referem à função política das imagens em tornar discursos, verdades, seus regimes de visibilidade e principalmente, a sua presença sensível como uma condição capaz de contagiar, comover e fazer sentir o sentir do outro.

Na opinião de artistas e especialistas, o Valongo entra para o calendário se consagrando como uma importante ação no circuito internacional de festivais de arte contemporânea do mundo:

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O Valongo foi das experiências mais extraordinárias que já vivi na cena artística. Foram dias intensos de trabalho, mas também de encontros com pessoas de enorme dimensão humana e com um forte comprometimento com o trabalho que têm desempenhado. Apesar do clima político pesado que se vive hoje no Brasil, foi importante saber que existe todo um movimento que garante que o sonho de um Brasil fascista não seja mais do que uma ‘utopia dos infelizes’, independente de qualquer resultado eleitoral”. (Kiluanji Kia Henda)

Traduzido em números, o festival contou com seis projetos expositivos, entre eles uma individual do angolano Kiluanji Kia Henda; 60 projetos artísticos entre obras comissionadas, artistas convidados e projetos selecionados em três editais que contemplaram artistas de todo o Brasil e de outros quatro países; seis mesas com destaque para as participações de Thiago de Paula (Bienal de Berlin), Juliana Braga (Sesc), Hélio Menezes (Masp), Rosane Borges (USP/Carta Capital), Beatriz Lemos (Lastro — intercâmbios livres em arte), entre outros; três seminários públicos como o ministrado pela convidada internacional Emmanuelle Andrianjafy (Mack Books); 5 ativações e performances; 12 oficinas; 3 shows como o da cantora indicada ao último Grammy, Xênia França; uma mostra de filmes com curadoria de Goethe Institute e cinco artistas em residência.

“Shine Heroes”, de Federico Estol

Essencialmente feito por mulheres, o Valongo não só mobilizou a cidade durante os três dias de evento, mas ao longo de todo o ano com uma fértil interlocução com o território através do Núcleo de Pesquisa e Experimentação do festival. Chamado Projeto Valongo, propôs diversas atividades, entre elas o I Programa de Residências Artísticas do festival, em que um grupo de cinco artistas residiram e aprofundaram suas interlocuções no centro histórico da cidade, desenvolvendo projetos comissionados para o festival. Além disso, criou-se um edital específico para projetos da Baixada Santista, abrindo ainda mais a possibilidade de criação de rede e conexão com a produção cultural local.

Ao lado de instituições parceiras como Sesc e Goethe Institute, foram notórios os efeitos que essa articulação gerou tendo em vista o sucesso de público, o engajamento e a presença da classe artística, dos estudantes, pesquisadores e diversos grupos que circulavam pelas ruínas, monumentos, praças, igrejas, ruas e edifícios históricos. Bem como da indispensável e intensa mobilização de diferentes estruturas políticas do município, como os setores de segurança pública, turismo, cultura, assuntos portuários e patrimônio histórico.

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Esforçando-se em mapear e visibilizar as novas produções artísticas do cenário nacional ao pensar seu próprio modelo curatorial, os padrões estéticos, suas relações de trabalho e os modelos expositivos, o que a dimensão do Valongo 2018 revela é o seu crescimento para abarcar diálogos, abrigar discursos, abraçar perspectivas e celebrar o fato de que, uma vez que vemos, é impossível voltar atrás.

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*Mestra em Comunicação e Semiótica na PUC-SP, pesquisadora e diretora criativa, Diane Lima foi curadora do Valongo 2018

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