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Cineasta Billy Woodberry é homenageado pelo IMS

Conversamos com o diretor estadunidense, um dos fundadores da L.A. Rebellion, movimento dos anos 1970 que buscou criar novas narrativas negras nas telas

Por Humberto Maruchel
9 jun 2023, 01h52
Marseilles après la guerre
Marseilles après la guerre (Billy Woodberry / cortesia IMS/reprodução)
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O cineasta e professor universitário Billy Woodberry cresceu no país que possui a maior indústria cinematográfica. Nascido no Texas, nos EUA, ele se mudou para Los Angeles, a capital mundial do cinema, quando ainda era adolescente. E embora todo aquele cosmos fosse um enorme caldeirão de criatividade, sua atenção nunca se voltou ao que estava sendo produzido em Hollywood. Até hoje, olha para essa enorme indústria audiovisual com desconfiança. Seu interesse, pode-se dizer, se reclinava para os acontecimentos no sul global. A literatura e o cinema brasileiro, por exemplo, se tornaram grandes referências quando Billy decidiu cursar faculdade de cinema na UCLA.

Couro de Gato
Couro de Gato (Billy Woodberry / cortesia IMS/reprodução)

Neste mês, o cineasta americano é o grande homenageado em uma mostra pelo IMS Paulista. Entre 6 e 30 de junho, o Instituto Moreira Salles fará uma retrospectiva das produções de Billy, que engloba as obras A Bolsa (1980), Abençoe seus pequeninos corações (1983), E quando eu morrer, não ficarei morto (2015) e os documentários Marseille après la guerr” (2005) e Uma história de África (2015). Além delas, serão exibidos curtas-metragens, selecionados pelo cineasta, de artistas que influenciaram a sua carreira, entre eles o brasileiro Couro de gato (1960), de Joaquim Pedro de Andrade.

“Foi dois anos depois que saí do Ensino Médio que eles começaram a integrar o esporte e as escolas, mesmo que a lei tivesse passado em 1954 dizendo que isso [a segregação] era ilegal”

Billy Woodberry
ashesandembers de Billy Woodberry
(Billy Woodberry / cortesia IMS/reprodução)

Um dos grandes legados de Billy Woodberry foi ter ajudado a criar a L.A. Rebellion, ou UCLA Rebellion, um movimento nascido dentro da academia, por esforço de cineastas e estudantes majoritariamente negros, entre as décadas de 1960 e 1980. Apesar de ser um estado muito à frente dos outros, a desigualdade também era uma realidade na Califórnia. Foi apenas em 1953 que o primeiro estudante negro se graduou na faculdade de cinema na University of California. No fim da década de 1960, algumas políticas afirmativas impulsionaram a presença de jovens negros nas universidades. A proposta da “rebelião” era simples, mas extraordinária em seu significado: criar uma alternativa às narrativas produzidas por Hollywood sobre pessoas afrodescendentes, que, invariavelmente, incorriam em estereótipos e representações discriminatórias. O movimento foi fortemente influenciado pelo neorrealismo italiano, dos anos 40, obras muito próximas de documentários, que abordavam as dificuldades da classe trabalhadora no pós-guerra.

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Borom Sarret
Borom Sarret (Billy Woodberry / cortesia IMS/reprodução)

No conjunto de obras criadas no contexto da L.A. Rebellion, vale destacar o longa Abençoe seus pequeninos corações, de Billy, que de forma intimista, acompanha o drama de uma família negra, em Los Angeles, que luta para manter as contas em dia. O filme se debruça sobre o cotidiano de Charlie, um homem desempregado, que vive de bicos. As aflições da família diante da necessidade de sobrevivência criam ainda outras tensões que colocam em risco a união do casal.

A política e o cinema

Ainda na adolescência, aos 17 anos, Billy, um homem negro, decidiu ir embora do Texas, no sudoeste americano, e “experimentar um lugar novo”. Naquela altura, no início dos anos 1970, havia a pouco que alguns estados americanos, especialmente no sul do país, baniram as leis que segregavam brancos e negros nas escolas e locais públicos. O racismo, portanto, ainda era (mais) latente no cotidiano. “Quando eu saí do Texas, eles não tinham escolas totalmente integradas. Foi dois anos depois que saí do Ensino Médio que eles começaram a integrar o esporte e as escolas, mesmo que a lei tivesse passado em 1954 dizendo que isso [a segregação] era ilegal“, ele conta.

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A story from Africa de Billy Woodberry
A story from Africa de Billy Woodberry (Billy Woodberry / cortesia IMS/reprodução)

A Califórnia, por outro lado, vivia um momento de efervescência, com diversos movimentos, como de pessoas LGBTQIA+, latinos, na luta por direitos. E passava por um período de libertação sexual e questionamento da ordem vigente. Assim como se tornaria um centro de resistência à Guerra do Vietnã. “Era um pouco menos que o paraíso. Tinha seus desafios, mas havia mais oportunidades para minha vida pessoal na Califórnia do que no Texas. De certa maneira, a Califórnia foi pioneira e experimentou a construção de uma espécie de sistema educacional extenso e inclusivo desde o ensino fundamental até a Universidade”, diz Woodberry.

“Começamos a acreditar que o cinema era um meio realmente importante e poderia mudar o mundo”

Billy Woodberry
Marseilles après la guerre
Marseilles après la guerre (Billy Woodberry / cortesia IMS/reprodução)
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Quando chegou, Billy estudou numa universidade comunitária, “quase gratuita”, onde pôde experimentar diversos cursos. Ao concluir a graduação, se deparou com os estudos sobre a América Latina, um assunto sobre o qual se debruçou em seu mestrado. O encontro com o cinema partiu do contato com as realidades político-sociais que estavam acontecendo no mundo, como as ditaduras na América do Sul, e não por uma vocação ou paixão antiga pela sétima arte. “Começamos a acreditar que o cinema era um meio realmente importante e poderia mudar o mundo.” Ele lembra que, quando pequeno, as narrativas que conhecia dos filmes eram aquelas contadas por outro jovem, um pouco mais velho do que Billy, que ia com frequência ao cinema e relatava aos outros meninos o que tinha assistido. Sua entrada na faculdade de cinema veio após conhecer outro estudante brasileiro, de quem se tornou grande amigo, que havia acabado de ingressar na UCLA Film School.

In the streets
In the streets (Billy Woodberry / cortesia IMS/reprodução)

Um dos primeiros filmes que viu, e que mais o impactaram, foi Gamga Zumba (1963), de Cacá Diegues, que conta a saga do neto do Zumbi dos Palmares. “Nós não tínhamos esse tipo de filme chegando ao cinema popular nos anos 1970, nos Estados Unidos.”

Na ocasião em que o L.A. Rebellion foi criado, Hollywood dava passos no sentido de explorar narrativas com personagens negros, normalmente filmes com baixo orçamento, que se tornaram extremamente populares. Muitas dessas obras, no entanto, foram vistas como depreciativas. Obras como Cotton comes to Harlem, Coffy: em busca da vingança, e outras mais conhecidas pelos brasileiros, como Shaft. “O cinema que atraía o público era filmes populares. Eram filmes B (filmes de baixo orçamento). Eles acabaram sendo chamados de filmes de exploração negra, o que significa que eram filmes feitos para atrair e explorar essas pessoas. Na verdade, foi entendido como um estilo depreciativo pela maioria das organizações políticas e de defesa estabelecidas, como a NAAACP (National Association for the Advancement of Colored People). Eles pensaram que esses filmes eram nocivos e apenas uma maneira de explorar a população negra”, conclui.

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Billy Woodberry em retrospectiva

IMS Paulista – Av. Paulista, 2424 – Bela Vista, São Paulo
De 6 a 30 de junho. Terça a domingo e feriados das 10h às 20h; fechado às segundas
Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia)

A story from Africa de Billy Woodberry
A story from Africa de Billy Woodberry (Billy Woodberry / cortesia IMS/reprodução)
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