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O que aprendemos com Bridget Jones e Carrie Bradshaw

Como as personagens impactaram a geração X e representam os dilemas da mulher moderna

Por Ana Claudia Paixão
25 jul 2025, 07h00
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 (IMDB/reprodução)
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Possivelmente nem todas fizeram a mesma associação, mas mulheres da geração X tiveram dois alter egos nas telas da TV, do cinema, assim como nas páginas de jornais e livros, em continentes diferentes, mas vivendo as mesmas batalhas por autonomia, autenticidade e amor.

De um lado, uma nova-iorquina estilosa, reflexiva e um tanto narcisista, navegava por um momento onde as mulheres davam seus primeiros passos — em Manolos Blahnik, claro — na independência profissional e sexual. Do outro, uma londrina caótica, engraçada e insegura, também desajeitada e não inteiramente fashion, sempre brigando com a balança, não era colunista nem colecionava namorados, mas queria ser alguém.

Isso mesmo, as contemporâneas Carrie Bradshaw, de Sex And The City, e Bridget Jones, de O Diário de Bridget Jones sempre tiveram uma trajetória semelhante. Até hoje, aliás, pois ambas chegaram aos 50, casadas com os amores de suas vidas apenas para ficarem repentinamente viúvas e precisando se reinventar em meio à dor e mudanças dos tempos.

Poucas figuras femininas se tornaram tão emblemáticas da virada do milênio quanto elas. Paradoxalmente, hoje não são mais tão aspiracionais quanto antes, enfrentando até uma certa rejeição de suas fãs mais fiéis. Por quê? Afinal, elas ainda representam os dilemas da mulher moderna.

Só para resgatar: ambas nasceram de colunas em jornais escritos por mulheres e migraram para outras mídias com sucesso estrondoso — Bridget para os livros e o cinema, Carrie para a televisão, depois os filmes e agora uma nova série. Suas histórias se cruzam no imaginário feminino contemporâneo: são espelhos de desejos, medos e contradições vividos por gerações de mulheres que atravessaram o fim do século 20 e entraram no século 21 com liberdade, mas também solidão, pressão estética e dúvidas afetivas.

A gênese: colunas que viraram fenômenos

A pioneira não foi Carrie Bradshaw, mas Bridget Jones, que surgiu primeiro, em 1995, nas colunas humorísticas de Helen Fielding no The Independent. Rapidamente virou o romance O Diário de Bridget Jones (1996), sucesso absoluto que redefiniu o gênero do “chick lit” ao combinar referências a Orgulho e Preconceito, neuroses contemporâneas e um tom cômico autodepreciativo.

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Carrie nasceu das crônicas de Candace Bushnell no New York Observer, publicadas como livro em 1996 e adaptadas pela HBO como a série Sex and the City em 1998. A personagem, interpretada por Sarah Jessica Parker, tornou-se um ícone da mulher urbana e sexualmente autônoma — uma espécie de alter ego nova-iorquino para as mesmas angústias vividas por Bridget do outro lado do Atlântico.

Se Carrie logo ganhou um rosto e uma voz, Bridget só chegou aos cinemas dois anos depois do segundo livro, interpretada por uma atriz americana — que fez um sotaque britânico perfeito — e jamais a imagem que se apostaria para a personagem. Renée Zellweger, no entanto, venceu os céticos e criou uma Bridget que fala com várias gerações, sendo indicada ao Oscar por sua performance.

A pioneira caótica

Antes dela, Toni Collette recusou o convite, Helena Bonham Carter, Cate Blanchett, Emily Watson e Rachel Weisz foram consideradas, assim como Cameron Diaz e Kate Winslet. O Diário de Bridget Jones (1996 – livro / 2001 – filme) nos apresenta à Bridget aos 32 anos, solteira, trabalhando em uma editora, fumando demais, bebendo demais, tentando emagrecer e preocupada com sua solteirice — enquanto é pressionada por amigos e pela mãe. 

Em meio a trapalhadas hilárias e comentários sobre calcinhas, ela se envolve com seu chefe cafajeste, Daniel Cleaver (Hugh Grant), e se aproxima de Mark Darcy (Colin Firth), advogado reservado e íntegro — em um enredo diretamente inspirado por Orgulho e Preconceito.

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Em seguida veio Bridget Jones: No Limite da Razão (1999 – livro / 2004 – filme), onde Bridget tenta manter um relacionamento com Mark Darcy enquanto lida com seus próprios ciúmes, inseguranças e a presença insistente de Daniel. A trama se torna ainda mais caótica com uma prisão na Tailândia e outras confusões absurdas, mas mantidas com charme. Embora o tom do segundo filme seja mais pastelão, a personagem continua a ressoar como símbolo da imperfeição humana.

E aqui o cinema e a literatura se desencontraram. Em 2013, saiu Bridget Jones: Louca pelo Garoto, que é um livro mais sombrio, com Bridget viúva, cuidando de seus dois filhos, navegando o mundo do luto, da maternidade e dos aplicativos de namoro aos 50 anos. Mark Darcy morreu em uma missão humanitária, e agora Bridget tenta ser “cool” ao lidar com o Twitter, homens mais jovens e suas próprias rugas. Embora divisivo, o romance foi aclamado por sua honestidade.

Em 2016, chegou O Bebê de Bridget Jones, baseado nas colunas que Fielding escreveu para o The Independent em 2005, omitindo os eventos do livro anterior. Aqui, Bridget está solteira aos 43 anos, feliz com sua carreira, mas descobre estar grávida sem saber quem é o pai: Mark Darcy ou o bilionário bonzinho Jack (Patrick Dempsey). O tom é mais leve que o livro anterior, mas trata com delicadeza as pressões da maternidade tardia e dos novos arranjos familiares.

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O filme de Louca pelo Garoto, lançado em 2023, também foi mais doce e menos sombrio do que o livro, mas, assim como And Just Like That, perdeu a fagulha que nos deixava ansiosos por Bridget — sentimos saudades de Mark Darcy tanto quanto ela. Ainda assim, a Bridget que conhecemos está lá, o que faz a história equilibrar nostalgia com emoção. Carrie deveria bater um papo com ela…

A neurose e a superficialidade irresistíveis de Carrie

Carrie era o alter ego da jornalista Candace Bushnell. Quando chegou à TV por assinatura, em 1998, ficou no ar durante seis temporadas. Vimos Carrie Bradshaw e suas amigas — Miranda, Charlotte e Samantha — explorarem o sexo, o amor, a carreira e a amizade em Nova York. Carrie, colunista de jornal, era a narradora da série e viveu altos e baixos com homens diversos, mas especialmente com Mr. Big, o enigmático executivo com quem manteve uma relação intermitente por anos. A série foi revolucionária por dar voz a quatro mulheres independentes, sexualmente ativas e economicamente livres — com todas as complexidades e contradições que isso acarreta.

O primeiro filme, de 2008, dá continuidade direta à série: Carrie finalmente vai se casar com Big, mas é abandonada no altar. Após reconstruir sua autoestima com a ajuda das amigas, ela reavalia seus sentimentos e, ao fim, casa-se com Big de forma íntima e simples. O filme foi um sucesso comercial, ainda que criticado por parecer um grande episódio estendido.

Dois anos depois veio a primeira derrapada com um segundo filme, com a crítica sendo implacável: considerado fútil e culturalmente insensível, o filme mostra as amigas viajando a Abu Dhabi enquanto Carrie começa a questionar a estabilidade do casamento. A recepção negativa selou, por um tempo, o fim da saga.

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Até que, em 2021, veio And Just Like That. Carrie, agora na casa dos 50, vê sua vida virar do avesso quando Big morre subitamente. Ela recomeça do zero: aprende a lidar com o luto, volta a sair com outras pessoas, inicia um podcast e enfrenta novos códigos sociais — como linguagem neutra, pautas de inclusão e novas amizades. As outras protagonistas também enfrentam dilemas contemporâneos. Carrie, viúva, está mais introspectiva, menos irônica, e ainda em busca de sentido.

Recomeço: o novo arco comum de Bridget e Carrie

A tristeza na nova fase de Bridget foi uma surpresa. Mas, de alguma forma, faz sentido — desafia a personagem a seguir em frente porque ela tem duas crianças para criar. Sua alma está lá, inclusive na positividade de tentar vencer a dor do luto. Ela se sente ultrapassada no mundo digital, assim como Carrie, o que é um retrato raro da mulher de meia-idade com libido, vulnerabilidades e senso de humor intacto. Mesmo enfrentando a perda e o envelhecimento, Bridget nunca abandona sua humanidade hilária.

No filme, que é mais leve que o livro, vemos Bridget mais madura, segura de si, priorizando sua carreira como produtora e aberta à maternidade solo. Ao final, ela abraça o futuro sem a idealização do passado. Ela não está mais tentando ser escolhida; ela escolhe. Faz sentido.

Carrie, por sua vez, vive um arco mais difícil. And Just Like That mostra uma mulher inesperadamente silenciosa, desorientada e profundamente solitária após a morte de Big. É um arco menos glamouroso, mais cru: ela reaprende a ser só, a se relacionar, a escrever — e a ser vulnerável de formas novas. A série tenta manter relevância ao abordar temas contemporâneos, mas muitas vezes se perde entre didatismo e ausência de emoção.

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Carrie entra e sai de relações até reencontrar o amor com Aidan (outro ex histórico), mas se vê forçada a encarar que talvez o passado não volte — e que é preciso criar um novo presente, com novos afetos, ritmos e silêncios. O tom é menos romântico e mais existencial.

Enquanto Bridget Jones nos convida a rir das nossas falhas, Carrie Bradshaw tenta propor a reflexão sobre elas. Uma tropeça e levanta rindo; a outra ainda não decidiu como reagir. Ambas, no entanto, ainda são versões legítimas da mulher moderna: múltiplas, inquietas, autoanalíticas — e, no fundo, profundamente solitárias.

Legado: o que resta depois do glamour

Quase três décadas depois, Bridget e Carrie continuam a provocar discussões — agora não mais sobre “ficar solteira aos 30”, mas sobre como recomeçar aos 50. São raras as narrativas que dão centralidade à mulher madura em tom de comédia ou reflexão leve, e é nisso que ambas continuam relevantes. Não por representarem modelos ideais, mas por revelarem contradições reais.

Se Carrie parece uma fantasia editorial de Nova York e Bridget um retrato cômico da Londres suburbana, ambas são, no fundo, metáforas do nosso desejo de amar sem perder o senso de identidade. Aquelas que um dia quiseram “ter tudo” hoje apenas querem dormir bem e acordar com alguma paz.

Talvez a maior virada dessas personagens não tenha sido mudar de cidade, de emprego ou de parceiro — mas sobreviver à passagem do tempo. Carrie e Bridget envelheceram diante de nós: saíram das colunas de jornal para os nossos corações, e de lá não saíram, mesmo quando seus novos roteiros pareceram descompassados com o que esperávamos delas.

Ainda que despertem hoje menos idolatria do que incômodo, continuam fundamentais por um motivo simples: são das poucas ficções que não escondem o que acontece com as mulheres depois dos 40, 50, 60. O fim do amor, a busca por sentido, o medo do esquecimento, a alegria inesperada de um novo começo — tudo isso segue existindo, mas raramente com o protagonismo, a graça e a honestidade que Bridget Jones e Carrie Bradshaw nos ofereceram.

Entre altos e baixos, o legado delas permanece. Porque talvez o que mais nos emocionava — e ainda emociona — não era o glamour nem o romance, mas a coragem de ser ridícula, complexa e sincera diante do mundo. E de si mesma.

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