Canal Brasil estreia série inédita sobre Milton Nascimento
Divididia em quatro episódios, "Milton Nascimento – Intimidade e Poesia" acompanha a última turnê de Bituca pelos EUA

Em 2022, Milton Nascimento se despediu dos palcos, deixando uma legião de fãs emocionada. No entanto, os registros dessa despedida continuam rendendo novas histórias. Uma delas é a série Milton Nascimento – Intimidade e Poesia, dirigida por Cleisson Vidal e Leonardo Carvalhosa, que estreia no dia 27 no Canal Brasil.
Ao longo de quatro episódios, a produção apresenta os bastidores da turnê de despedida nos Estados Unidos, revisita momentos marcantes da carreira do cantor e traz suas reflexões sobre temas como solidão, amor e espiritualidade. O projeto se estrutura em três eixos principais: o processo criativo de Milton, fortemente influenciado pela natureza; sua vivência em turnê, alternando entre o palco e momentos de introspecção; e entrevistas que resgatam sua trajetória e legado.

A série também traz Milton falando sobre o processo criativo por trás de algumas de suas canções mais emblemáticas, como Cais, Novena e São Vicente. A reapresentação acontece no dia 4 de março, data em que o cantor será homenageado pela Portela no desfile Cantar Será Buscar o Caminho que Vai Dar No Sol – Uma Homenagem a Milton Nascimento, no Rio de Janeiro. Será a primeira vez que a escola dedica um desfile a uma personalidade em vida. Antes, Milton já foi celebrado em enredos da Unidos de Cabuçu (1989) e da Mangueira (2004).
Além da série, o cantor será protagonista de Milton Bituca Nascimento, documentário dirigido por Flávia Moraes, com estreia prevista para 20 de março de 2025. O filme, gravado ao longo de dois anos, acompanhou os shows da última turnê do artista e traz depoimentos de músicos nacionais e internacionais sobre sua influência na música global. A produção também destaca a relação afetuosa entre Milton e seu público. “Tivemos longas conversas, fiz pedidos difíceis, e Milton sempre esteve presente, generoso. Nunca tentou controlar o retrato que fazíamos dele, nunca pediu para cortar ou mudar nada. Me senti livre, respeitada. E isso, claro, só aumentou minha responsabilidade”, comentou a diretora em nota.
Bravo! conversou brevemente com o diretor Cleisson Vidal. Confira abaixo:
Como foi o processo de filmagens durante a turnê nos Estados Unidos? Houve desafios específicos para capturar a essência de Milton Nascimento tanto no palco quanto nos momentos mais íntimos?
Esse projeto foi movido a desafios e vontades, pois soubemos da turnê um pouco antes do início e logo procuramos a produção do Milton. No entanto, havia uma questão fundamental: só o Milton poderia dar a palavra final para a gravação e o lugar marcado para isso foi em Nova Iorque, a primeira cidade da turnê. Assim, fomos para os EUA sem a certeza de que iríamos poder realizar o documentário. E, para alívio, ele aceitou a proposta.
A equipe era duas pessoas, Leonardo Carvalhosa e eu, uma câmera 5D e um microfone. Criamos um conceito na forma de filmar e definimos muito bem o papel de cada, já que tudo mais seria surpresa. Então, o processo foi calcado na simplicidade e muita atenção ao nosso entorno, para criar um material que resultasse em uma poética e uma singularidade, que em resumo é a forma de se relacionar com os outros através da câmera. E essa simplicidade exige depuração, escolha e tomada de decisão. E em um roadmovie, tomadas de decisão são parte do cotidiano desse tipo de filme.
Então, o primeiro grande desafio foi o aceite na turnê pelo Milton e sua equipe. Mas era realmente uma equipe maravilhosa, que logo entendeu o projeto e aos poucos nos integramos ao grupo e fomos ganhando liberdade de filmagem.
E assim foi forjando uma relação de confiança. E para isso, é preciso ter paciência, compreender a sua posição e transmitir seus objetivos. Então é sempre um processo de construção conjunta, de entendimento entre as partes, porque uma detém o poder da câmera, do registro, e a outra tem o poder de aceitar ou não aquela nova presença.
Mas o Milton já é uma pessoa vivida, laureado por onde passa. E ele logo percebeu que não estávamos ali para puramente tietá-lo, ou apenas seguir o artista e sua gig com uma câmera, mas sim conhecer aquele homem que apresenta sua sensibilidade ao mundo na forma de música. E assim, fomos incorporando reflexões, conversas e também os tempos vazios, os momentos de reclusão por lugares distintos, que é a própria dimensão humana. Nem tudo é festa, nem sempre tem companhia, tem palavra, tem ação. É a vida. Ao fim, a intimidade do filme é isso: o pensamento do Milton, sua forma de estar, olhar e se relacionar com o mundo.
Milton Nascimento é uma figura essencial na música brasileira e segue inspirando diferentes gerações. Na visão de vocês, qual é o papel e a relevância dele no cenário atual da música e da cultura brasileira?
A relevância é inspiração. Grandes pessoas inspiram com grandes valores. A música do Milton transmite o bem, ela educa. O Lincoln Cheib, baterista do Milton, fala isso: é uma música que faz você ser melhor. Já imaginou uma escola que em todas as manhãs tocasse nos corredores Clube da Esquina nº2? É uma música sem idade, sem tempo, sem língua, que toca a todos. Está no registro do sublime. É uma música de cura sem qualquer proselitismo. E o próprio Milton transmite isso na sua pessoa, na sua capacidade de ver o melhor que cada pessoa tem. Por isso, merece deferência, justamente porque não pede deferência. Ele é gente, gente, gente; e merece cada homenagem e reconhecimento por sua obra e ação.
A série explora não apenas a carreira de Milton Nascimento, mas também sua intimidade, seus valores e momentos de solitude. Como foi o processo de ganhar a confiança do artista para registrar essas camadas mais pessoais da sua trajetória?
Acredito que paciência, observar o entorno, evitar ansiedade e demonstrar segurança sobre o que você está fazendo, porque realizar um documentário é um trabalho sério, que possui muitas responsabilidades, que obriga formação técnica, intelectual e muita humildade, pois estamos sempre transitando em espaços com dinâmicas distintas. Então, a confiança vem não é na hora da festa, mas justamente nos momentos que nada acontece, que é o cotidiano, e você está ali, filmando sem arroubo, sem incomodar. Saber sair quando precisa, saber entrar e pedir para gravar. Os modos de estar é parte do caminho para realizar um documentário. E aos poucos propusemos conversas sobre sua história de vida, reflexões sobre a humanidade, criação de arte e valores.
A trilha sonora de Milton sempre esteve profundamente conectada às suas vivências e ao cenário ao seu redor. Como vocês escolheram as músicas que aparecem na série, e de que forma elas ajudam a contar essa história?
As escolhas musicais foram todas construídas na montagem. Mas a base era as músicas da turnê. Daí, a vivência, a tal da experiência profissional, nos ensina muita coisa. E uma delas foi filmar um roadmovie já pensando na montagem. E já sabíamos quem ia montar o filme, mesmo sem ela saber. E convidamos a Lea van Steen para montar, porque sua sensibilidade, conhecimento artístico e musical iria expandir o conceito inicialmente pensado.
Então, ao retornarmos, analisamos todo material captado. Mostramos uma prévia ao Milton e mais adiante, realizamos uma filmagem em Minas, para integrar os elementos naturais a ele, que é por onde o filme começa, integrando imagens da natureza a vocalizes do Milton, em uma poética de simbiose homem e ambiente, pois o Milton tem na essência criativa de sua música sentindo uma relação de homem-natureza em unidade. Ele se entende assim e traduz isso pela sua música.
Saiba quando assistir a Milton Nascimento – Intimidade e Poesia
27 e 28/02 (quinta e sexta) – 21h
02/03 (domingo) – 10h30
04/03 (terça) – 19h30 (no dia do desfile da Portela)
05/03 (quarta) – 16h (dia do anúncio da escola campeã do Rio de Janeiro)
08/03 (sábado) – 14h