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OLÁ,

Por que a nova Branca de Neve é latina?

Versão live action do filme mais icônico da Disney sacrifica algumas das canções mais famosas do conto de fadas para atualizá-lo para novas gerações

Por Ana Claudia Paixão
Atualizado em 24 mar 2025, 22h25 - Publicado em 21 mar 2025, 07h01
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Rachel Zegler como "Branca de Neve" no live-action "Branca de Neve" da Disney. (2024 Disney Enterprises, Inc./divulgação)
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Fui assistir ao live-action de Branca de Neve com o coração apertado e saí dividida. O filme é ótimo, mas, para mim é mais “inspirado” na animação do que uma regravação, mesmo que isso seja até sua principal vantagem. Ora, se a bruxa Malévola tirou o protagonismo da Princesa Aurora e até o beijo de amor verdadeiro do príncipe Felipe, onde está o problema de termos um elenco inclusivo e uma Branca de Neve latina em 2025? 

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Andrew Burnap como “Jonathan” e Rachel Zegler “Branca de Neve” no live-action da Disney, “Branca de Neve”. (2024 Disney Enterprises, Inc./divulgação)

Para seguir falando do filme, preciso de um disclaimer: faço parte da Geração X, que está frequentemente no fogo cruzado de Boomers (meus pais) e Z e Millennials (meus sobrinhos), especialmente nos temas de mudanças culturais e sociais.

Para boa parte dos boomers, reescrever clássico é mais do que desnecessário, é blasfêmia. Isso porque há uma implicação de tudo que é clássico seja perfeito e imutável. E não é assim, né? Mesmo que às vezes pareça que tudo que tem cinco minutos já é carimbado como “lendário”, “icônico” ou “clássico”, o paradoxo está na questão de que nada do que é bom está isento de poder ser melhorado. As histórias das princesas da Disney exemplificam bem isso.

Por mais de 50 anos, até 1989, havia “apenas” três princesas como referência: Branca de Neve, Cinderela e A Bela Adormecida. Mesmo quando a princesa Ariel, em A Pequena Sereia, chegou aos cinemas, o padrão romântico esperado ainda era o de “encontrar” o verdadeiro amor na figura de um príncipe bondoso e heroico.

E Ariel salvou Eric (duas vezes!), mas precisou abrir mão de sua natureza de sereia para ficar com ele. Por condicionamento, a passividade não me incomodava, mas confesso que a domesticidade de Cinderela e Branca de Neve – cozinhando, limpando a casa – me dava gatilho. Daí a minha curiosidade e ansiedade quando essas princesas ganharam versão em carne e osso no século 21. Não dava para se sustentá-las como eram em um mundo como o que precisamos ter.

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Gal Gadot como “Rainha Má” e Rachel Zegler como “Branca de Neve”no live-action da Disney, “Branca de Neve”. (2024 Disney Enterprises, Inc./divulgação)

Curiosamente, Branca de Neve E Os Sete Anões foi o primeiro filme de animação que quebrou barreiras e estabeleceu o padrão Disney, em 1937, mas foi o último a ganhar uma “atualização”, em 2025. São nada menos do que 88 anos entre um e outro. Como contar com uma princesa cantando que “um dia meu príncipe vai aparecer” sem considerar a mensagem ultrapassada que está na canção? E aqui está o que considero o calcanhar de Aquiles do filme de 2025: a trilha sonora. E justamente aqui, porque a primeira trilha sonora da história do cinema a ter sido gravada e vendida foi justamente a de Branca de Neve e Os Sete Anões!

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Justin Paul e Benj Pasek comparecem à estreia mundial de “Branca de Neve” da Disney no El Capitan Theatre em Hollywood (Eckenroth/Getty Images/divulgação)

A versão atual é assinada pela dupla Benji Pasek e Justin Paul, que eu venero. Seus trabalhos em La La Land e, ainda mais, O Rei do Show estão entre os meus favoritos dos últimos anos. O problema é que as canções de Frank Churchill (o compositor, não o personagem de Jane Austen), Paul Smith e Leigh Harline fazem parte da trilha sonora coletiva mundial, com melodias que qualquer criança e adulto nos quatro cantos do planeta sabem cantar: Heigh-Ho, Someday My Prince Will Come, Wishing, Whistle While You Work, One Song e With a Song and Smile. Apenas duas delas ficaram na trilha sonora de 2025. Todas as que foram excluídas fazem falta.

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Rachel Zegler, a nossa Branca de Neve latina (filha de colombianos e poloneses), tem uma voz potente e inegavelmente linda. Melhor, sim, MELHOR do que a de Adriana Caselotti, a princesa original que cantava como ópera. No entanto, as letras da versão original não estariam alinhadas com a princesa que a Disney nos apresenta aqui. 

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Rachel Zegler como “Branca de Neve” no live-action “Branca de Neve” da Disney. (2024 Disney Enterprises, Inc./divulgação)

Lembremos que na primeira canção do filme de 1937, Branca de Neve faz um desejo: “Estou cantando no poço desejando que aquele que eu amo me encontre hoje.” Rachel não canta essa versão. Com a inédita Esperando por Um Desejo, ela avisa: “Uma garotinha em um poço solitário, com a mesma historinha para contar, se sentindo presa nas paredes que a cercam, se sentindo prisioneira na história que lhe contaram, mais um dia em que ela desvanece.” A Branca de Neve de agora não vai esperar por ninguém ou nada, vai fazer acontecer.

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Rachel Zegler como “Branca de Neve” no live-action “Branca de Neve” da Disney. (2024 Disney Enterprises, Inc./divulgação)
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Alinhar as princesas com os valores do movimento feminista não me incomoda, mesmo que signifique que seja como aquela roupa antiga no armário, aquela na qual você até ainda cabe dentro, mas é mais apertada agora e sem o mesmo charme de quando era nova. Faz parte da vida evoluir. Mas, mexer a música? Ah… é o som de um disco arranhando e um tiro no pé. Aí está a grande falha de Branca de Neve e Os Sete Anões em 2025.

Eu entendo que compositores como Benji e Justin queiram deixar sua assinatura em um “novo clássico” da Disney, mas há tantas novas canções! Os pais de Branca de Neve, a princesa, a Rainha Má (que nunca teve o privilégio antes) e até do novo interesse romântico, o definitivamente não-príncipe Jonathan, cantam sem parar (ou assim parece) e nenhuma – e repito, nenhuma canção– fica em sua mente quando o filme acaba. Só a melodia de Whistle While You Work, que é do filme de 1937 e que volta também nos créditos, que é a que saímos cantarolando.   

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Gal Gadot como “Rainha Má” no live-action da Disney, “Branca de Neve”. (2024 Disney Enterprises, Inc./divulgação)

Fiquei no desejo de que apenas as letras originais fossem revisadas, pois aí sim, poderíamos falar de uma bem-sucedida revisão do clássico. Sem isso, Branca de Neve E Os Sete Anões é um filme completamente novo, mesmo que use sequências e cenários de 1937 como referência. Sem a trilha sonora ideal, não é a mesma experiência. Uma pena. Como Branca de Neve cantava, “com um sorriso e uma canção, todo o mundo parece despertar novamente. Alegrando-se com você enquanto a canção é cantada”. Só faltou “a” canção! 

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