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Raphael Montes: o mestre do suspense e das histórias que incomodam

Ex-advogado e hoje escritor best-seller, ele celebra o sucesso da adaptação de um de seus maiores romances, Dias Perfeitos

Por Humberto Maruchel
Atualizado em 29 ago 2025, 13h35 - Publicado em 29 ago 2025, 07h00
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Julia Dalavia e Jaffar Bambirra em 'Dias Perfeitos', baseada no livro de Raphael Montes  (Lorena Zschaber/divulgação)
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Raphael Montes nunca se contentou com narrativas fáceis de digerir. Pelo contrário: quanto mais perturbadora a história, melhor para ele. Ex-advogado e hoje escritor best-seller, é um dos nomes mais aclamados da literatura brasileira contemporânea e, mais importante ainda, um dos mais lidos. Com nove títulos publicados, roteiros para séries e cinema, uma novela lançada (Beleza Fatal, da HBO MAX) e, agora, acompanhando no sofá a adaptação de uma de suas obras mais populares, Dias Perfeitos, disponível no Globoplay, Raphael consolidou sua carreira com bastante ousadia. No meio do caminho, venceu até um Prêmio Jabuti na categoria de Romance de Entretenimento, em 2020, com o livro “Uma Mulher no Escuro”.

A gênese de Dias Perfeitos surgiu de uma conversa em casa, entre mãe e filho. Na época, Raphael tinha pouco mais de 20 anos e já havia publicado seu primeiro livro, Suicidas, cujo título, diga-se de passagem, causou certo desconforto à mãe. Ela sugeriu então que ele escrevesse um romance leve, do tipo que ela gostava de ler.

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Raphael Montes e Camila Queiroz (Reprodução/HBO/reprodução)

Boa intenção não faltou, e, nas primeiras linhas, o projeto parecia caminhar nessa direção. Mas, ao longo de seus momentos solitários de escrita, o romance leve deu lugar a uma trama sombria: a história de um jovem obcecado por uma garota que, gradualmente, se transforma em um sequestro.

O livro, no entanto, pode ser lido também como a consolidação do estilo de Raphael Montes dentro do gênero suspense. Um gênero universalmente popular, mas que ainda enfrenta certa desconfiança no Brasil, ceticismo que o próprio autor conheceu no início da carreira. Ao mesmo tempo, Dias Perfeitos representou a realização do sonho de qualquer escritor: alcançar um público amplo. Tanto que Raphael se tornou, neste ano, um dos autores mais lidos do país, com mais de uma milhão de exemplares comercializados. Foi também o mais vendido durante a Bienal do Rio deste ano.

Em entrevista à Bravo!, na véspera da estreia da série Dias Perfeitos, Raphael conversou sobre seu início na literatura, a forma com que vem desenvolvendo seu estilo e as fontes de inspiração que orientam sua escrita.

Raphael, obrigado pela disponibilidade. Como foi ver o trabalho de adaptação pronta de uma de suas maiores obras?

Cara, eu estou muito feliz com o resultado, muito animado e orgulhoso do que foi feito. O Dias Perfeitos é um livro pelo qual tenho muito carinho, porque foi o livro que lancei quando tinha 23 anos, justamente quando estava terminando a faculdade de Direito. Na verdade, eu já tinha acabado de me formar, e foi esse livro que me permitiu deixar o Direito para viver de literatura.

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Em 2014, quando saiu, entrou na lista dos mais vendidos, foi traduzido, teve os direitos negociados em várias línguas e também para adaptação audiovisual. Ao longo desses 10, 11 anos, o livro foi chegando a cada vez mais leitores e publicado em mais de 25 países. Sempre tive muito carinho por ele. Cada livro meu desperta um afeto diferente — imagino que seja como acontece com filhos — mas Dias Perfeitos foi realmente meu passaporte para viver de literatura em um país onde me diziam que isso não era possível.

Por isso eu estava muito ansioso e animado para ver essa história ganhar as telas. Quando o Globoplay decidiu iniciar o processo, eu já estava envolvido em outros projetos audiovisuais e, por isso, não pude participar como roteirista. A adaptação foi comandada pela Cláudia Jouvin. Além dela, a equipe conta com Denison Ramalho e Yuri Costa. Eu entrei contratado pelo Globoplay como consultor.

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Raphael Montes do Programa do Jô, em 2014 (reprodução/Globo/reprodução)

Mas qual foi o seu papel nessa adaptação? Porque desta vez você não estava exatamente como roteirista.

Exato. Acompanhei todas as fases do desenvolvimento: antes mesmo da escrita, sentei com a Cláudia [Jouvin] e falei: “Olha, isso eu acho importante, isso não acho”. Dei minha impressão não só como alguém que trabalha no audiovisual, mas também como quem conhece o retorno dos leitores em relação ao livro. A Cláudia trouxe ideias maravilhosas.

Basicamente, o que sempre falei é que Dias Perfeitos dá muito certo porque acompanha a história de um estudante de medicina solitário que se apaixona por uma menina e decide sequestrá-la. É um amor obsessivo. Não é a trama mais original do mundo, já vimos histórias assim em obras como Átame, do Almodóvar; O Colecionador, clássico de John Fowles; ou Misery, do Stephen King. Mas a força de Dias Perfeitos, a meu ver, é a maneira como a história é narrada.

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Você entra na cabeça do psicopata e acompanha a lógica dele naquela relação. O mistério é justamente o que se passa na mente de Clarice, a mulher sequestrada. O leitor só tem acesso ao olhar dele, ao que ele sente. Então, o grande desafio era: como levar para o audiovisual essa mente do personagem? Como traduzir para as telas aquilo que considero especial no livro? Esse foi o debate. 

Ao longo do processo de escrita, eu lia os roteiros, fazia observações e sugeria ajustes. Depois, na pré-produção — escolha de elenco e tudo mais — também participei. Nas filmagens, acompanhei, até fiz uma participação “Hitchcockiana”. Na montagem dos episódios, na pós-produção, também estive presente.

Ou seja, ocupei um lugar mais de visão geral, e acho que essa distância me permitiu, quando assisti ao primeiro episódio montado, me emocionar bastante, lembrando de toda a aventura.

Tem um rumor bastante curioso em torno do livro de que ele teria nascido de um pedido de sua mãe para que eu escrevesse um romance. Isso é real?

É real. Eu tinha escrito um livro anterior, dos 16 aos 19 anos, que publiquei aos 20, 21, chamado Suicidas. Saiu pela Editora Benvirá, foi finalista do Prêmio Benvirá de Literatura e também finalista do Prêmio São Paulo de Literatura de Estreia.

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Minha mãe ficou orgulhosa, claro, mas também assustada: “Poxa, Rafa, estou feliz de ver meu filho lançando um livro, mas como conto para os meus amigos que ele se chama Suicidas?”. E aí, em um pedido muito sério, ela disse: “Escreve um livro com um título mais leve, uma história romântica, como as que eu gosto”.

Eu sempre tive a literatura como provocação, sempre gostei de cutucar feridas. Então, quando ela me pediu uma história de amor com um título fofo, a primeira coisa que pensei foi no título Dias Perfeitos. A partir daí, comecei a construir a história: um amor obsessivo, de um jovem que conhece uma menina, se encanta por ela e, diante da recusa dela, decide forçá-la a viver os “dias perfeitos”. Ele acredita piamente que, se ela se permitir, eles serão felizes.

Nesse exercício, sempre me pergunto: “Ao contar essa história, do que estou falando?”. Ficou claro que eu estava falando de relações tóxicas, de machismo, de um sujeito que tenta moldar a mulher perfeita à sua visão. Esses são os principais temas que permeiam o livro.

Você comentou algo que eu já me perguntava antes: até que ponto você precisou se libertar de estigmas por escrever sobre temas pesados como suicídio, sequestro e canibalismo?

Olha, Humberto, não sei se você vai acreditar, mas confesso que sou um pouco inconsequente nesse sentido. Nunca me preocupei muito com a opinião dos outros. Nunca pensei: “Se eu escrever um livro sobre sequestro, suicídio ou canibalismo, o que vão pensar de mim?”.

De fato, isso nunca foi uma preocupação, nem no passado, nem hoje. Enxergo que as pessoas são complexas e dúbias. Todo mundo tem um lado bendito e um lado maldito. Eu exercito o lado maldito na literatura, e o bendito na vida. Para mim, essa é a melhor maneira de administrar os dois lados. Por isso, às vezes até me espanto quando alguém diz: “Nossa, mas como você teve essas ideias?”. Respondo: “Gente, normal! Eu não guardo ninguém no meu porão”.

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Acho absolutamente saudável escrever suspense, crime, mistério. Exercitar esse imaginário é importante — e, honestamente, também acho muito saudável ler esse tipo de literatura. Todos nós precisamos dessas sensações; fazem parte do nosso repertório humano.

Então, eu acho muito saudável que a gente ilumine esses quartos escuros dentro da gente, seja escrevendo, seja lendo esse gênero. Costumo brincar que é mais sadio do que não ler esse tipo de literatura e acabar sendo alguém violento na vida real, grosseiro ou mal-educado.

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Raphael Montes, autor de “Dias Perfeitos” (Thaís Alvarenga/divulgação)

Na literatura brasileira, você é um dos principais nomes nesse gênero. Comparando com os Estados Unidos ou mesmo com a Europa, não estamos no mesmo patamar em termos de quantidade de autores dedicados a esse estilo.

Nem se compara. Realmente. Agora, por exemplo, tenho uma agente literária americana e, para ela, é impressionante: com repercussão, alcance e sendo publicado por uma grande editora, eu sou o único autor brasileiro de thriller, policial e suspense. Ela mesma diz: “É muito doido”.

E eu acho uma pena. Adoraria ter mais colegas. Existem escritores produzindo, mas ainda não publicados por grandes editoras, sem grande alcance. Ainda assim, há gente boa escrevendo literatura de suspense e crime no Brasil.

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Sua trajetória começou na adolescência, certo? Pelo que li, você já escrevia e compartilhava com os colegas nessa época.

Sim, comecei adolescente. E vale dizer: num momento em que isso não “dava certo”. Acho isso interessante. Muita gente comenta: “Ah, escreve para dar certo, para fazer sucesso”. Quando você vira um best-seller, alguns olham com maus olhos essa ideia de ser popular. Eu não. Acho maravilhoso ser popular, gosto de alcançar leitores, gosto de ter leitores. Fico muito feliz de ser best-seller.

Mas, apesar disso, não me atrai a ideia de escrever para dar certo. Quando escrevo, não penso em sucesso. Penso em fazer o livro que eu gostaria de ler. Se consigo esse feito, já é muita coisa — porque às vezes termino um texto e penso: “Não era exatamente isso que eu queria”. Então, quando consigo escrever o livro que eu queria, a alegria é imensa.

Quando comecei a escrever literatura policial, ali pelos 16, 17 anos, era um gênero que já adorava ler. Eu lia os clássicos: Agatha Christie, Arthur Conan Doyle, Sidney Sheldon. E pensei: “Quero fazer isso no cenário brasileiro, no nosso imaginário”. Fui encontrando alguns autores daqui: Rubem Fonseca, Luiz Alfredo Garcia-Roza, Tony Bellotto, Patrícia Melo. Eles experimentaram o gênero, mas nunca houve alguém que se dedicasse exclusivamente a defendê-lo e afirmasse: “Sou autor de thrillers e suspense”.

Comecei a escrever porque gostava. Mesmo esses autores que citei, com exceção do Tony, que era uma figura pública muito conhecida e, por isso, vendeu bastante, o Rubem e o Luiz Alfredo nunca foram exatamente best-sellers. O Rubem foi por algumas décadas, mas o Luiz Alfredo não. Ou seja, não era um caminho garantido para vender.

Então fiz as histórias que gostaria de ler, sigo fazendo, e felizmente o mundo inteiro passou a gostar mais de thrillers e suspense. Além disso, o leitor brasileiro passou a se interessar mais por narrativas brasileiras. Hoje vivemos um fenômeno claro: o leitor brasileiro se apaixonou pela literatura contemporânea do país.

E não só eu — temos Socorro Acioli, Carla Madeira, Itamar Vieira Junior. Nas feiras, nas bienais, os grandes destaques são autores brasileiros, não mais estrangeiros. Isso mudou muito em dez anos. Eu lembro da Bienal do Rio em que o grande nome era sempre um americano convidado. Agora não é mais.

Falando em sucesso, não tem como não falar de Beleza Fatal. Queria perguntar de que forma ela impactou a sua carreira. Você sente que foi um divisor de águas?

Sem dúvida, Beleza Fatal teve um grande impacto na minha carreira. Foi um desafio e uma aventura deliciosa. Sempre gostei de novelas e queria escrever uma. Quando a HBO me convidou, havia uma delícia no fato de ser uma novela em um lugar que nunca havia feito novelas. Não havia regras, limites, não havia o que podia ou não podia. Foi um jogo de descobertas, uma espécie de “novela do futuro”: limitada, menor que 40 capítulos, sem estar no ar diariamente e sujeita à opinião do público, mas ainda assim com todos os elementos clássicos do melodrama.

Foi muito interessante trabalhar com a supervisão do Silvio de Abreu. Ele foi um grande apoiador das minhas loucuras. Ter o olhar dele me garantia que, por mais ousado que eu fosse nos personagens, nas tramas e diálogos, eu também estava respeitando o clássico. Ele tem a experiência de quem fez inúmeras novelas e sabe quando a história está sendo contada de maneira engajante.

Sabia que ia dar trabalho, mas, quando terminei, tive certeza de que tinha feito um texto forte e potente. Restava que as outras fases da produção entregassem também. E tive a alegria e a sorte de contar com um grande elenco, comandado pela Maria de Médici como diretora-geral. Mais uma vez, estive muito próximo do processo.

Quando a novela ficou pronta e assisti, pensei: “Cara, isso vai dar certo”. Dá muito trabalho escrever, e a gente sabe quando fica bom e quando não fica. Quando fica bom, não é pedantismo dizer: “Deu trabalho, mas ficou bom”. E ficou. Foi a novela que eu queria assistir, e poder vê-la foi muito especial.

Quando estreou, ela chegou aos lugares que eu imaginava — e passou dos lugares que qualquer um imaginava. Eu já era o mais otimista da equipe, enquanto muitos hesitavam sobre o alcance. Mesmo assim, ultrapassou meu otimismo. Virou fantasia de carnaval, virou meme, as pessoas repetiam frases dos personagens, no último capítulo houve festas em todo o Brasil. Foi muito legal.

E sobre sua relação com o Silvio: você sente que aprendeu algo com ele que transformou sua maneira de escrever, criar personagens ou desenvolver histórias?

Sem dúvida. O Silvio tem um verdadeiro manancial de coisas que funcionam e que não funcionam. Por exemplo, para mim, uma grande dificuldade em Beleza Fatal foi construir os pares românticos. Eu não escrevo histórias românticas. Mas novela tem que ter par romântico.

Então, eu lembro que eu queria que a Sofia e o Gabriel fossem um par romântico. Mas quando a novela começa, a Sofia namora o Alec, outro personagem. A minha ideia inicial era que, em algum momento, o Gabriel surgisse — afinal, ele é o amor de infância dela — e então ela terminaria com o Alec para ficar com o Gabriel.

E aí o Silvio me disse: “Rafael, eu já cometi esse erro numa novela. Quando você quer que o público torça por um casal, você precisa mostrar esse casal bem desde o início. Se a Sofia começa com o Alec e a gente não percebe que ela não é feliz, a audiência acredita que esse é o casal verdadeiro. Então, quando o Gabriel aparece, ele vira o vilão que atrapalha a relação.”

Ou seja, era essencial deixar claro desde o começo que ela não estava realizada com o Alec. Por isso, logo no início há uma cena em que ele declara: “Eu te amo, quero ficar com você para sempre”, e ela responde com certa hesitação: “Será? Talvez seja melhor você não viajar comigo”. Nesse momento, o público entende que ele está apaixonado, mas que não é correspondido da mesma forma. Assim, quando o Gabriel entra na história, faz sentido que ele seja visto como o verdadeiro amor dela. Esses são mecanismos que só a experiência com melodrama ensina.

Outra lição valiosa que o Silvio me passou foi sobre a estrutura e o ritmo da novela. Ele sempre dizia: “Rafa, se você arma bem o tabuleiro de personagens, com dramas e conflitos fortes, você consegue escrever 40, 80 ou até 200 capítulos. O segredo é ter bons personagens para brincar com eles ao longo de toda a trama.”

No meu caso, eu tinha preparado uma sinopse para Beleza Fatal. Só que, quando cheguei no capítulo 20, já tinha esgotado todo o planejamento. Eu tentava segurar as tramas, mas ele insistia: “Não economiza. Gasta. Coloca tudo. Quando você chegar ao capítulo 20, as histórias vão surgir naturalmente, porque os personagens já estarão vivos.”

E foi exatamente isso que aconteceu. Eu tinha material para 40 capítulos, mas poderia ter feito 80 ou 200 sem problemas.

 

Você comentou no início sobre escrever sem pensar no outro. Mas imagino que numa novela seja ainda mais difícil resistir à tentação de atender às expectativas do público, não?

Eu acho que — por mais estranho que pareça — é impossível saber exatamente o que a audiência deseja. Mesmo numa novela, que é pensada para o grande público, o autor precisa escrever a história que gostaria de ver. E torcer para que os espectadores também queiram. É a forma mais autêntica. Se a gente tenta agradar um “público ideal”, acaba correndo atrás de algo abstrato.

Claro que, na era do streaming, existe uma diferença: os dados. Em Beleza Fatal eu não tive esse tipo de feedback, mas em Bom Dia, Verônica, na Netflix, sim. Depois de cada temporada, recebi relatórios sobre quais cenas funcionaram mais, onde os espectadores pausaram, quais personagens agradaram, quais não agradaram tanto. E, sinceramente, achei ótimo ter esse material.

Não é que os dados limitem o trabalho. Eles são um guia. Se você entrega esses números para alguém sem criatividade, a pessoa vai apenas repetir fórmulas. Mas se você é criativo, pode usar as informações como ponto de partida para ousar ainda mais. Eu não me incomodo com algoritmo; acho que faz parte do processo.

Mas também acredito que o artista precisa ir além. O algoritmo trabalha olhando para o passado, enquanto o artista trabalha olhando para o futuro. O artista percebe os temas que estão no ar e projeta: daqui a um ano, isso vai ser pauta. O artista é aquele que, durante o cortejo, ousa dizer: “O rei está nu”. Então, o desafio é equilibrar: considerar os dados, mas criar olhando para frente.

O que você acha que faz com que a sua escrita, seja na literatura ou na TV, chegue em tanta gente?

Eu diria que, na camada mais imediata, minhas histórias querem entreter. São livros que o leitor começa e não consegue largar. Muita gente que havia perdido o hábito da leitura voltou a ler através deles. Outros, que nunca tinham o costume, descobriram o prazer de ler.

Mas eu não quero só entreter. Além da tensão, do suspense, eu procuro provocar reflexões sobre temas urgentes: machismo, violência contra a mulher, pressão estética, cultura do cancelamento, padrões de beleza, até mesmo questões sobre o que comemos, como em O jantar secreto.

Não quero escrever livros descartáveis — aqueles que você lê, acha legal, guarda na estante e esquece. Eu tento criar histórias que continuem ecoando, que façam o leitor querer discutir, trocar impressões, levantar perguntas, mais do que encontrar respostas. Essa vontade de conversar depois da leitura cria uma corrente, um boca a boca que faz a literatura ganhar alcance.

Para encerrar, poderia mencionar cinco obras que fizeram diferença na sua trajetória?

Eu tenho uma teoria de que as mulheres escrevem literatura policial melhor do que os homens. Então, meus maiores referenciais são em sua maioria autoras.

Eu citaria: E não sobrou nenhum, da Agatha Christie; O talentoso Ripley, da Patricia Highsmith; Um assassino entre nós, da Ruth Rendell; Ladrão de cadáveres, da Patrícia Melo — uma escritora brasileira que admiro muito; e O bebê de Rosemary, do Ira Levin — esse é um dos meus livros favoritos da vida.

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