Frases desfeitas
Uma seleta de aforismos, epigramas, máximas, sentenças, adágios, apotegmas… uma porção de palavras pra designar uma frase curta cheia de ironia
Por Carlos Castelo
“Máxima, sentença, adágio, apotegma. Esses termos meio vetustos servem para descrever um dos mais ilustres gêneros literários: o aforismo — ou seja, a frase curta, a tirada de espírito, cheia de agudeza e ironia. Dos epigramas de Marcial, na Antigüidade latina, às reflexões do Oráculo Manual do barroco Baltasar Gracián ou dos moralistas franceses (Pascal, La Bruyère, Chamfort), as formas breves criaram uma tradição que, durante o romantismo, com Novalis e Schlegel, virou “estética do fragmento”.
Foi assim que o crítico Manuel da Costa Pinto abriu o prefácio do meu livro de aforismos Orações Insubordinadas, lançado pela Ateliê Editorial, em 2009. Desde então venho postando-os diariamente nas redes sociais, selecionando os mais atemporais e editando-os em livros. O que me atrai nesta “estética do fragmento” é a linguagem desinflada, a piada desentranhada da fala da rua, que satiriza as contradições do presente — na linguagem do presente.
Abaixo, um pequeno buquê de frases da minha mais recente safra.
A psicanálise ficou décadas tentando fazer as pessoas serem elas mesmas e agora os filtros para selfie botaram tudo a perder.
A idiotia, apesar da terminação, é a mãe de todo infortúnio.
Só duas coisas sobrevivem à uma hecatombe nuclear: as baratas e as pensões alimentícias.
Literatura é igual a jardinagem: sem poda, não floresce.
A nossa elite tem uma virtude: criou o alto meretrício.
O problema do ostracismo é que, geralmente quem cai nele, são as pérolas, não as ostras.
Se a Terra for mesmo uma espaçonave tem, de longe, a pior tripulação da galáxia.
No DNA de toda bicicleta há um tombo.
O homem descende do macaco e o macaco da bananeira.
Varejeira: mosca que sabe se vender.
Se regime alimentar fizesse bem, o Buda não seria obeso.
Se está desse jeito por causa da penúria material, imagina quando vier a miséria espiritual.
A situação no Oriente Médio está tão crítica que os burros estão se disfarçando de camelos.
Penso, logo lavo louça.
A Liga da Justiça é o STF dos super-heróis.
O ateu levou um tombo e fraturou o sacro.
Deem-me um honesto e eu moverei o mundo.
Hoje em dia é tudo uma questão de mais ou menos Rivotril.
Publicitário é aquele cara que foi antes de você no restaurante que você ia hoje.
Diferente das séries de TV, a vida não tem segunda temporada.
Todo biógrafo é um necrófago.
As mulheres só não assumiram o poder porque as baratas ainda não foram exterminadas.
Homem: ser vivo que aperta botões.
Um corretor da Bolsa só, não faz pregão.
Se a gastronomia do Brasil fosse a inglesa, nós já teríamos derrubado uma dúzia de Bastilhas.
Desemprego caiu. Em cima de quem?
Fizemos algumas coisas ruins, como a bomba atômica. Mas também fizemos o guaraná Dolly, que pode ser tomado gelado com rodelas de laranja.
Dependente químico é quem não sai da droga, dependente físico quem não sai da academia.
Enquanto o Franz Ferdinand for mais importante que o Franz Kafka, o mundo continuará surreal.