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Luísa Matsushita revisita o Cansei de ser sexy, 20 anos depois

Conhecida como Lovefoxxx, a vocalista e compositora relembra os passos da banda indie que estourou nos anos 2000 e fala sobre sua nova fase nas artes plásticas

Por Humberto Maruchel
Atualizado em 6 Maio 2025, 22h32 - Publicado em 5 Maio 2025, 07h00
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Luísa Matsushita no Primavera Sound (Gleeson Paulino/divulgação)
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Há exatas duas décadas, a banda Cansei de Ser Sexy (CSS) lançava seu álbum de estreia, um disco que se tornaria símbolo da irreverência e de um novo momento da cena indie nacional dos anos 2000. No coração do grupo, a vocalista e compositora Luísa Matsushita — conhecida como Lovefoxxx — representava o rosto, a voz e a atitude do grupo. O álbum, homônimo, foi lançado pelo selo Trama e catapultou o grupo para uma trajetória internacional incomum para bandas brasileiras independentes da época.

O disco logo se espalhou por trilhas sonoras de realities como The Simple Life e Big Brother Brasil 6, além de ter uma de suas músicas incluída no jogo The Sims. Faixas como “Superafim”, “Alala” e “Music Is My Hot Hot Sex” atravessaram fronteiras e colocaram o CSS nos line-ups de grandes festivais, no centro das atenções da crítica estrangeira — a imprensa britânica chegou a chamá-los de “a coisa mais espantosa a sair do Brasil desde Ronaldinho Gaúcho”.Criado em 2003 quase como uma piada entre amigos sem formação musical formal, o CSS logo ganhou força com sua mistura de eletropop e um espírito debochado e performático. O grupo era formado por Lovefoxxx, Ana Rezende, Luiza Sá, Carolina Parra, Iracema Trevisan e Adriano Cintra. O nome excêntrico, diz a lenda, veio de uma fala de Beyoncé em entrevista: “estou cansada de ser sexy”.

No último mês, o disco voltou às prateleiras em vinil pelo Noize Record Club!, em edição comemorativa pelos 20 anos do lançamento. Para Lovefoxxx, o aniversário do disco é também uma oportunidade de revisitar a própria história. “A gente não queria provocar, exatamente. Não era tipo: “Vamos fazer isso pra irritar as pessoas” ou “pra alguém se apaixonar por mim”, sabe? Era mais… tipo jogar futebol na quarta-feira. Era só pra viver a vida de um jeito mais interessante.”, conta Luísa, que hoje, aos 40 anos, traça caminhos próprios também nas artes visuais.

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Cansei de Ser Sexy (CSS) 20 anos depois (Gleeson Paulino/divulgação)

Mesmo em um tempo pré-redes sociais como conhecemos hoje, a banda soube usar a internet a seu favor — principalmente o Fotolog — para criar uma base de fãs engajada e espalhar sua estética visual e sonora. Em 2004, já estavam em grandes palcos como o do Tim Festival, e logo em seguida começaram a excursionar pelo mundo. Mas os caminhos começaram a divergir com a saída de Adriano Cintra em 2011. O último álbum do grupo, Planta (2013), teve recepção morna, e no ano seguinte o CSS entrou em hiato. Em 2019, uma apresentação no Festival Popload marcou o reencontro. Três anos depois, a banda voltou à estrada para uma turnê comemorativa, agora com Lovefoxxx, Carolina Parra, Luiza Sá, Ana Rezende e Chuck Hipolitho.

Paralelamente, Luísa passou a se dedicar às artes visuais. Representada pela Galeria Luisa Strina, ela vem expondo em feiras e mostras no Brasil e no exterior. Em maio, participa da quarta edição do Aberto, projeto de arte contemporânea que ocupa residências assinadas por grandes nomes da arquitetura — desta vez, na Maison La Roche, em Paris, projetada por Le Corbusier. Em São Paulo, integra também a coletiva Pequenas Pinturas, na Galeria Aurora, com abertura prevista para 18 de maio.

Quanto à música, por ora, não há pretensão de um reencontro com o Cansei de Ser Sexy. “Eu acredito que uma banda só acaba quando a gente declara que acabou. E a gente nunca vai fazer isso, porque não há necessidade. Então, se daqui a alguns anos a gente tiver aquela coceira e quiser fazer alguma coisa… a gente vê.” afirma Lovefoxxx, celebrando o disco que mudou sua vida. Confira a conversa da Bravo! com a artista.

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Como foi para você revisitar o disco de estreia do Cansei de Ser Sexy após 20 anos?

Eu não estou exatamente “revisitando”, sabe? É apenas um processo… uma coisa que está acontecendo. Então não tem um envolvimento emocional nesse sentido. Esse disco, pra mim, sempre esteve muito ativo na minha vida — até por conta de trabalhá-lo com frequência. É algo que nunca parou, desde que aconteceu.

A banda tem uma coisa muito bacana, né? Desde o começo, com essa energia muito original, irreverente. O que vocês estavam querendo provocar naquela época?

A gente não queria provocar, exatamente. Não era tipo: “Vamos fazer isso pra irritar as pessoas” ou “pra alguém se apaixonar por mim”, sabe? Era mais… tipo jogar futebol na quarta-feira, sabe? Era só pra viver a vida de um jeito mais interessante. Nunca teve muitas ambições. Foi tudo muito espontâneo.

Ninguém ali tinha ambição. Se tivesse, eu mesma nunca teria entrado na banda.

Sério?

Sério. A música nunca foi uma ambição minha. Então como é que eu ia entrar numa coisa ambiciosa ligada a algo que eu nem sabia fazer? Minha primeira experiência com música foi dentro da banda. Tinha que ser desse jeito, senão eu não teria topado.

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Luísa Matsushita e o retorno da banda CSS (Gleeson Paulino/divulgação)
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Mas vocês foram ganhando sucesso e imagino que não deu tempo de parar pra pensar se estavam no caminho certo ou não. O que você acha que aconteceu no meio disso tudo?

Olha, eu tinha 19 anos quando a banda começou. Não tinha nada a perder. Não tinha uma carreira, um cargo… Eu fazia estampas. Era legal, mas não era uma trajetória de vida. Então foi fácil dizer sim.

E você acha que os outros integrantes também viam assim? Ou essa coisa de não querer fazer da música uma carreira principal era mais sua?

Acho que ninguém tinha essa ambição, não. Se tivesse, ia soar meio “cringe” pra gente.

Sei.

Tipo: “Nossa, olha ela lá, levando a sério…” Ia ser meio brochante, sabe?

Curioso isso, porque deu muito certo. E tantas outras bandas, que tinham essa pretensão desde o início, não chegaram onde vocês chegaram.

Pois é! Quem chegou onde a gente chegou? A gente foi longe mesmo. Mas desejar muito uma coisa, não sei… Hoje eu desejo muito ser pintora, eu quero muito estar nesse lugar. Mas na música… quando o desejo pelo sucesso é muito grande, acho meio cringe.

A música tem que ter um elemento… não sei… Não é como um atleta olímpico, sabe? Que precisa treinar, performar… Acho que depende muito da energia da pessoa, do “élan”. São muitos fatores.

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Mas você se arrepende?

De jeito nenhum.

Quanto à sua relação com a pintura. Como foi essa descoberta, essa entrada no mundo das artes?

Acho que foram duas entradas. Porque ser artista era algo que eu sempre quis, mas por muito tempo não tive coragem de assumir. Achava que não era boa o suficiente. Tinha muitas inseguranças, sabe?

E como foi esse momento de transição?

Em 2013, durante a turnê do Planta, tive uma epifania. Estava com muita ansiedade, coceiras, insônia… e num ônibus entre Nova York e Woodstock, onde eu morava, me veio: “Eu preciso pintar”.

Você nunca tinha pintado?

Nunca. Sempre desenhei, mas nunca tinha pintado. E veio com muita força. Falei pras meninas: “Eu preciso pintar. Não sei por quanto tempo, mas isso precisa virar minha atividade principal.” A gente terminou tudo do ciclo do disco, e depois eu fui pintar.

E a segunda entrada?

Foi quando entrei pra galeria, em 2023 ou 2024. Dez anos depois.

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O show que marcou o retorno de CSS (Gleeson Paulino/divulgação)

Fiquei curioso sobre algo que você comentou… Como foi morar em Woodstock?

São duas vidas diferentes: inverno e fora do inverno. No frio é pesado, neve, tudo congela. Mas o verão é lindo, cheio de swimming holes, que são uns buracos com água mineral, super fresca.

Foi muito gostoso. Morei lá por um ano e meio, acho. Também morei em Hudson, que já estava bem gentrificado.

Tem essa aura dos artistas, principalmente por causa do festival, né?

Sim. Mas também tem uma galera meio “baby boomer hippie frito”, sabe? Aqueles hippies meio mal-humorados, de tie-dye, que flertam com a direita… É só uma impressão, tá? Mas tem essa dicotomia engraçada.

E na pintura? Como você enxerga sua identidade? Sei que é difícil de responder, mas imagino que você tenha descoberto sua linguagem ao longo do tempo.

 Claro! Ótima pergunta. Acho que como comecei a pintar aos 30 anos, não demorei tanto pra encontrar meu estilo. Já existia uma urgência. Não dava tempo de ficar com frescura do tipo: “Será que posso fazer isso? Será que me permitem?”

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E qual é esse estilo?

Fui direto para uma abstração com formas orgânicas. E é nisso que opero até hoje. Faço essas composições porque sinto que preciso fazê-las. Teve uma época, durante uma turnê do Cansei, em que eu estava tão cansada que, sempre que entrava no avião, pensava: “Se eu morrer agora, tudo bem. Já fiz tanta coisa. Estou em paz.”

E hoje em dia, toda vez que eu entro, eu lembro daquele pensamento que eu tinha mais jovem. Eu pensava: “Não, eu não posso ir. Eu preciso fazer muitas pinturas antes, sabe? De jeito nenhum estou pronta.” Então, sinto que preciso executar, materializar essas composições que estão na minha cabeça. E são formas, né? Elas têm ritmo. Sinto que tudo que eu não consigo trabalhar na música, eu consigo colocar na pintura. A minha insegurança aparece de um jeito que, na pintura, quase não vem. Ela se manifestava muito mais na música.

Eu lembro, por exemplo, que se você observar, as minhas letras são super extensas. E isso era eu querendo mostrar trabalho, entende? Como se eu pensasse: “Já que eu não sou uma cantora boa, quero que as pessoas vejam que eu me dediquei a essa letra. Olha o tamanho dela.” Então, na música eu não trabalhava com espaços vazios. Mas na pintura, eu trabalho. Porque esse tipo de insegurança não existe lá. Existem outras, claro. Mas eu lido com elas de outra forma.

A pintura, para mim, é um lugar muito mais resolvido. É onde eu me sinto completamente apta a executar. Sinto que estou exercendo um propósito. E a música nunca foi isso pra mim. 

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Cansei de Ser Sexy chega com disco de inéditas em 2025 (Gleeson Paulino/divulgação)

Isso é muito doido. Porque tem tanta gente que se inspira no Cansei, se inspira em você… acho que isso contrasta com essa imagem da cantora insegura, porque não era assim que o público via vocês. 

É que eu sou uma performer segura. Mas sou uma cantora insegura. Por exemplo, quando era pra fazer sessão de rádio, eu queria morrer. Nada gravado eu gostava de fazer. Mas se for pra fazer um show na frente das pessoas, sem nenhuma câmera, aí eu estou plena. Eu gosto de interagir com as pessoas. Acho que esse sempre foi meu maior talento no Cansei. 

Mas vocês pretendem fazer algo novo com a banda?

Ai, no momento, não. A gente fez os shows de 20 anos e agora cada uma voltou pra sua vida. A gente estava com muita vontade de se encontrar, sabe? Viajar juntas, sentar pra almoçar em algum lugar — que é uma coisa que a gente faz muito bem.

Vocês continuam próximas?

Sim, a gente se fala todos os dias. É algo muito antigo. A gente está sempre em contato no nosso grupo. A nossa amizade é além do que eu consigo nomear. Não tem aquela sensação de algo encerrado. E acho que nunca vai ter.

E acredito que uma banda só acaba quando a gente declara que acabou. E a gente nunca vai fazer isso, porque não há necessidade. Então, se daqui a alguns anos a gente tiver aquela coceira e quiser fazer alguma coisa… a gente vê. Quem sabe nos 30 anos, ou até nos 40. Sei lá. Fazer turnê é muito desgastante, não sei se vou querer. Mas… ai, dá saudade do rolê com as meninas.

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Bastidores da banda CSS (Gleeson Paulino/divulgação)

Sei. E a composição? Porque, apesar dessa insegurança que você fala, acho que muita gente concorda que você compõe muito bem.

Sim, compor e gravar são coisas que eu gosto mais do que, por exemplo, fazer um acústico. Tipo, o terror da minha vida é: “Ah, vamos fazer um voz e violão.” Eu juro, eu prefiro fazer qualquer outra coisa. Mas eu gosto de compor, sim. Eu gosto de fazer música.

Existe um momento mágico quando você está gravando uma demo. Você tem uma ideia de melodia, de letra, cria um verso, um refrão, grava… e vai dormir. E aí, no dia seguinte, você escuta essa demo e ouve como se estivesse escutando pela primeira vez, porque você ainda não memorizou a música. Isso é mágico.

Que bonito isso.

É muito incrível. Na pintura, tem algo parecido. Às vezes eu passo uma sessão inteira pintando, pintando… e aí, antes de ir embora, desligo a luz do estúdio, ligo a lanterna do celular e dou aquela última olhada. No dia seguinte, quando eu volto, tem aquela surpresa: “Nossa, ela está assim agora.” Mas com a música, esse efeito bate mais forte. É muito mágico.

Nunca pensei nesse paralelo entre a criação musical e na pintura. Aparentemente, a pintura é algo mais fluido, em que o erro talvez seja mais bem assimilado. Ou não?

Depende do erro, né? Depende do processo que você está fazendo. O erro pode se transformar em algo novo, sim — um novo recurso, uma nova forma de fazer algo. Mas pra você errar mesmo na pintura, tem que se passar muito. Porque, como eu pinto com óleo — e é uma tinta que demora muito pra secar — você tem muitas chances de remediar antes de pensar: “Nossa, isso foi um erro.”

E… eu acho que eu sempre vou compor. É que agora, eu tô com zero vontade de compor. Mas eu fiz uma banda com o meu marido, né? A gente criou o TUM. E sou muito orgulhosa das músicas que a gente fez, especialmente uma que se chama Any Resemblance of It. Então, eu não estou limitada ou sem alcance pra fazer música. Eu posso fazer sozinha, posso produzir, gravar… sou completamente independente.

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Luísa Matsushita, vocalista da banda Cansei de Ser Sexy (CSS) (Gleeson Paulino/divulgação)

Queria te perguntar sobre a sua mudança pra Guarapuava. Você construiu sua própria casa, achei isso incrível, e queria entender um pouco sobre essa mudança e o quanto ela ainda faz parte da sua vida hoje.

Até hoje tento entender essa mudança também. Porque eu fui pra um lugar super bolsonarista, super heteronormativo… e até hoje estou tentando entender. Mas teve uma época no Cansei em que, além de querer pintar, eu também queria descobrir outras existências radicalmente diferentes da minha. Foi aí que comecei a estudar as Earthships — que são casas sustentáveis criadas por um cara maluco lá no deserto dos Estados Unidos, nos anos 60. Ele começou a construir essas casas que realmente se autorregulam. Elas funcionam com base em muitas leis da física — coisas térmicas, gravidade, circulação de ar, luz…Eu assistia a um documentário sobre ele, chamado Garbage Warrior…

E falei: “Gente, eu preciso entender isso. Eu não sabia que isso existia.” Eu já estava nos Estados Unidos e fui estudar com ele e com a equipe dele. E entrei nessa de estudar essas coisas. Aí fui estudar permacultura, floresta… comecei a ser guardiã de sementes crioulas.

E isso explodiu minha cabeça, abriu meu horizonte. Eu costumo dizer que o Cansei foi minha faculdade e isso foi meu mestrado. Então fiquei nesse caminho de estudos e voluntariados por uns cinco anos, que foi o período em que morei em Garopaba também. E, apesar de querer construir algo assim, no fim não consegui.

Até porque o clima do nosso país não ajuda muito. Talvez lá em Brasília, que é mais seco — porque, afinal, estudei com um cara que desenvolve coisas no deserto, né? Então, numa área tropical, é bem diferente. Mas foi muito bom. Foi ruim, mas foi bom. Foi bom que acabou e foi bom ter passado por isso, porque aprendi muita coisa. E eu me encantei com o mundo das sementes crioulas. Para mim, o mais legal — além dessas casas incríveis e da cultura — foi entender e trabalhar com as sementes crioulas. Foi a coisa mais bonita de todas.

Isso é algo que você ainda faz hoje?

Não, hoje não. Agora moro em São Paulo e não tenho acesso à terra. Mas penso muito sobre isso. As sementes são muito lindas. As sementes crioulas, né? Porque elas têm memória, se adaptam… E o pouco tempo que passei lá plantando, eu tinha os sonhos mais psicodélicos do mundo. Quando você planta sementes, parece que elas invadem o seu subconsciente.

Então, no meu trabalho tem muita coisa de semente — nos títulos, nos temas, nas formas, no jeito como penso cultura também. Por exemplo, todas as minhas pinturas têm uma bordinha. As cores das superfícies, dos elementos maiores, não se tocam. E isso, para mim, tem muito a ver com as margens — de um lago, de um terreno — que, na natureza, são onde há mais biodiversidade. Na minha pintura, esse padrão do mundo se repete em miniatura: nas bordas, é onde tem mais diversidade de cores, de erros, de passagens.

Então, eu digo brincando que fiz um mestrado — a louca! — mas foi mesmo um estudo. Não foi formal, mas estudei muito. Me voluntariei, participei de feiras de sementes, anotei o que cada um pegava e por quê.

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Cansei de Ser Sexey no palco (Gleeson Paulino/divulgação)

E essa mudança para São Paulo foi pacífica?

Foi maravilhosa. Eu já não aguentava mais morar em Garopaba, mas não sabia como sair, como voltar. Aí comecei a namorar o Chuck [Hipolitho]— que hoje é meu marido, um cara que conheço há 20 anos. Comecei a vir mais para São Paulo, ele começou a ir para lá… até que um dia me mudei de vez.

E foi super duro. Do jeito que eu fui, eu voltei. Não foi traumático, mas também não foi simples.

Te permitiu voltar ao mesmo lugar.

É, mas tem aquela frase: “Você nunca entra no mesmo rio duas vezes.” Eu voltei, mas não sou mais a mesma. E a cidade também não. Ninguém é.

Luísa, sei que precisamos encerrar. Tem mais alguma coisa que você gostaria de acrescentar à nossa conversa?

Acho importante dizer que fiquei muito feliz com o interesse pelo Cansei de Ser Sexy — especialmente por perceber que a banda não envelheceu mal. Acredito que isso tem muito a ver com o fato de sermos uma banda queer, com muitas pessoas LGBs. Sempre estivemos nesse lugar de não pertencimento ao que é considerado “normal”, e acho que isso ajuda a não envelhecer mal, sabe? Porque esse lugar busca respeito, espaço… é quase como se a gente já estivesse vivendo um pouco no futuro.

Quando você está nessa busca por igualdade — que deveria ser um direito básico —, inevitavelmente seu discurso permanece atual. Espero que, ao longo do tempo, a comunidade LGBTQIA+ conquiste plenamente os mesmos direitos que qualquer pessoa hétero e cisgênero. E acho que quando você vive essa realidade, quando você está cercado de amizades, afetos e vivências dentro dessa comunidade, isso se torna atemporal. O que envelhece mal, na verdade, são os discursos glam rock, misóginos, que objetificam a mulher. Isso é que sempre foi absurdo.

Bandas feministas, como Le Tigre, Kathleen Hanna, continuam relevantes porque lutam por algo que deveria ser simples: igualdade e respeito. Quando penso no Cansei, vejo que, mesmo sem uma intenção politizada na época, aquilo que a gente fazia era uma celebração dos espaços e das pessoas que amávamos e frequentávamos. Era muito verdadeiro.

E me emociona ver que ainda hoje os jovens — os “esquisitonas”, as pessoas não binárias — se identificam com o Cansei. Eu amo isso. É lindo ver que essa conexão continua viva. Porque, sinceramente, teria sido muito triste se a gente tivesse virado algo genérico, como uma versão da Katy Perry em 2025, sabe?

Mas acho que não — acho que a gente continua legal (risos). E acho também que soubemos pausar com dignidade. Não foi um fim. Nunca dissemos que acabou, e não temos planos de encerrar oficialmente. Para mim, uma banda só acaba quando declara que acabou — e esse não é o nosso caso.

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