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Quanto vale o beat?

Em dez anos, os festivais de música eletrônica passaram do underground ao mainstream. Hoje, representam fatia importante do circuito de cultura nacional

Por Artur Tavares
22 dez 2022, 11h37
TANTSA
 (Entourage/divulgação)
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A música eletrônica vive seu melhor momento. Depois de mais de trinta anos de construção de um gênero que nasceu em clubs underground europeus e norte-americanos, os beats, kicks e snares, a psicodelia e as noites sem fim nas pistas de dança finalmente se tornaram pop.

No Brasil, os últimos dez anos foram cruciais para colocar a cena como referência de entretenimento, hospitalidade e acolhimento para um público que sempre foi muito fiel. As produtoras investiram pesado em infraestrutura e tecnologia, e os grandes artistas internacionais responderam colocando nosso país como prioridade em suas turnês pelo mundo. Com isso, as festas de psytrance, techno, house e todas suas vertentes cresceram, e muitas delas se consolidaram como grandes festivais.

Atuando ao mesmo tempo como produtora e agência de artistas, a empresa brasileira Entourage foi uma das que mais soube aproveitar o momento no Brasil. Donos dos festivais Kaballah, Só Track Boa e Tantsa, foram eles que lançaram e gerenciam até hoje a carreira de Lukas Ruiz Hespanhol – ou Vintage Culture para os íntimos –, o artista brasileiro com maior expressividade das vertentes de techno e house da atualidade. Desde 2018, a Entourage também traz para o Brasil o festival alemão Time Warp, um suprassumo do circuito europeu há mais de 20 anos.

Marcelo Madueño
(Entourage/divulgação)

Seja qual for o caso, estamos falando de eventos que chegam a ter 50 mil pessoas na plateia, dançarinos incansáveis que passam de doze a quinze horas prestigiando o line-up.

Para entender um pouco desse fenômeno que colocou os festivais de música eletrônica no mesmo patamar de grandes eventos, como o Lollapalooza, o Primavera Sound e o Rock in Rio, nós conversamos com Marcelo Madueño, um dos sócios da Entourage:

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Ao longo da última década, a Entourage tornou-se, ao mesmo tempo, uma enorme agência e também produtora. Como você enxerga a trajetória da música eletrônica nessa década, a popularização e a profissionalização da cena?
A partir de 2010 houve a primeira guinada da música eletrônica, quando ela passou a ocupar um lugar de interesse dentro de um meio mais democrático. Foi um reposicionamento de valores. Antes, as festas eram taxadas como o lugar das drogas e dos excessos. Mas foi principalmente o trabalho da imprensa e da mídia em geral que fez com que o conhecimento sobre o assunto se ampliasse para um público maior. Então, sim, esses eventos duram muitas horas [risos], mas são lugares confortáveis e o serviço sempre é bom.

Hoje, um evento de música eletrônica é feito para você se sentir em casa. Embora seja tratado como underdog no mercado de festivais, quando você vai a um grande show de gênero qualquer, para não ser taxativo, muitas vezes não encontra lugar para sentar. Só tem bar, palco, pista, bar, e você vai sentar no chão molhado porque é open bar de cerveja.

TANTSA
(Entourage/divulgação)

Vocês começaram fazendo festas enormes, como a Só Track Boa, e nos últimos anos foram abraçando vertentes mais underground, de certa maneira fazendo o caminho inverso da cena, partindo do mainstream e chegando nos sons alternativos. Quando foi que vocês notaram essa oportunidade?
Tudo começou com a Kaballah, que era uma festa de um palco só e acabou se tornando um festival com cinco palcos que tocam trance, house, techno e algumas semi vertentes, como o tech house. A agência se estabeleceu em um determinado lugar, mas nunca deixou de olhar para as oportunidades. Nós já conhecíamos os organizadores da Time Warp desde 2010, era uma questão de leitura de mercado.

A capilaridade para chegar com um novo movimento cultural que não nasceu no seu país e que se renova constantemente é muito baixa em lugares como o Brasil. A Tantsa surgiu em um momento em que quase ninguém fazia festa de techno nesse contexto europeu mais contemporâneo, e depois de duas décadas de existência da Time Warp lá fora, agora estamos estabelecendo o festival no país.

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“Isso tem a ver com o novo jovem, que consome diversos tipos de entretenimento ao mesmo tempo. A pandemia teve um efeito muito forte de disseminação de informação, música e cultura. Monitoro dezenas de artistas e sei exatamente o impacto deles nas redes sociais. Durante esse período, artistas que estavam com 10 mil seguidores chegaram a alcançar, hoje, meio milhão”

Marcelo Madueño
Marcelo Madueño
(Entourage/divulgação)

A mídia levou alguns artistas do gênero ao pop, por exemplo Peggy Gou, que esteve na última Time Warp, reconhecida também no universo da moda. Muita gente foi lá para assistir a pessoa, muito mais que seu som…
A Peggy Gou é uma artista interessante que transita na moda, hoje é billboard da Nike em Berlim. A Time Warp tem uma camiseta colaborativa com a marca de outro produtor, chamado Kobosil. Suas peças são super hypadas, que custam mais de mil euros.

Existem outros movimentos de adesão menos reconhecidos, como os videogames. O eletrônico é trilha sonora de muitos jogos que marcaram infância e adolescência, mas nunca houve essa associação clara. Agora, o mercado percebeu que existe sinergia.

Isso tem a ver com o novo jovem, que consome diversos tipos de entretenimento ao mesmo tempo. A pandemia teve um efeito muito forte de disseminação de informação, música e cultura. Monitoro dezenas de artistas e sei exatamente o impacto deles nas redes sociais. Durante esse período, artistas que estavam com 10 mil seguidores chegaram a alcançar, hoje, meio milhão.

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Os produtores e DJs de música eletrônica transitam muito intensamente nas redes sociais. Semanalmente, o fã pode ouvir e assistir novos shows em plataformas de vídeo, tudo muito tecnológico, com gravações em altíssimas qualidade e resolução. É o maior acerto para a popularização do gênero?
Isso é uma coisa fantástica, que nos fez dar pulinhos de alegria. A maior dificuldade de ser underground é não ter material para promover o artista que você traz. Não só isso, o alternativo é sempre contracultura. Um artista que usa muito do marketing é rejeitado pelo ‘underground’, porque legal é você não usar marketing, e nem saber quem vai tocar na festa.

Do ponto de vista de produção, canais como Boiler Room e Cercle trazem sets muito especiais, porque os artistas sabem que o alcance é muito grande. Nós somos muito bons com palavras, cada uma das nossas festas tem um clima, seja ele mais enigmático, ou mais pra cima, mais saudades, tudo fala sobre conexão com as pessoas, mas não existe nada como o vídeo de um artista no maior festival possível para poder vendê-lo melhor.

Time warp
(Entourage/divulgação)

Há muito tempo, gravadoras e selos estrangeiros já fazem festas exclusivas com seus artistas no Brasil. No entanto, não acontece um movimento do nosso produto nacional sendo levado para fora. Vocês planejam levar artistas residentes para turnês conjuntas em outros países?
É um plano que existe na nossa mente, mas não sabemos pontuar ainda quando será o momento de pisar para fora. Naturalmente, isso seria feito com a maior marca, que é a Só Track Boa.

“Nós somos muito bons com palavras, cada uma das nossas festas tem um clima, seja ele mais enigmático, ou mais pra cima, mais saudades, tudo fala sobre conexão com as pessoas, mas não existe nada como o vídeo de um artista no maior festival possível para poder vendê-lo melhor”

Marcelo Madueño
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Mas olhando para o mercado como um todo, não apenas na música eletrônica mas no live entertainment em contexto, os maiores players são aqueles que detêm as propriedades intelectuais. Se é para ter tempo e investimento em uma marca, temos na Time Warp, que é uma marca alemã muito importante.

Marcelo Madueño
(Entourage/divulgação)

Está nos planos abraçar outros gêneros musicais ou até mesmo novas marcas?
Eu e outros sócios da Entourage somos gays, por isso estamos investindo no segmento. No ano passado firmamos uma parceria com a festa Castro, fizemos uma edição com Glória Groove e Vintage Culture. Continuamos a levantar essa bandeira com pride e halloween, e vamos seguir. Também vamos entrar nos games, e a Tantsa vai se desenvolver em um festival de dança. Desde hip-hop e rhythm and blues até gêneros brasileiros, house music e voguing.

STB BH
(Entourage/divulgação)
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