Avatar do usuário logado
OLÁ,

Rodrigo Campos canta “Pagode Novo”

Lançamento reafirma o músico paulista como um dos grandes nomes do samba nesta geração

Por Artur Tavares
1 mar 2023, 11h03
Rodrigo Campos
 (Louie Martins/divulgação)
Continua após publicidade

Um fato na vida do sambista Rodrigo Campos nos faz repetir algumas palavras: nesta quinta-feira, 1, ele lança seu novo álbum, o quinto de sua carreira solo, Pagode Novo. E daí paramos com as repetições, porque há muito do que se pode falar sobre o disco. É sofisticado, original, criativo, conciso, minimalista, explosivo, poético.

Em Pagode Novo, Rodrigo se reafirma como um dos compositores mais habilidosos de sua geração. Suas letras narram personagens e eventos que ora são analisados sob uma lente microscópica, ora empreendem passeios lisérgicos junto de criaturas mitológicas. Musicalmente, um desavisado diria que é tudo menos pagode, e mesmo assim está ali; as cadências, os instrumentos, os compassos, os coros, as homenagens aos grandes mestres do samba, e isso é genial.

Rodrigo Campos
(Louie Martins/divulgação)

“É um nome que tem muita coisa dentro. Movimentos estéticos sempre quiseram cunhar o novo. A Nouvelle Vague, o Neo Realismo italiano, o Cinema Novo são lugares que me interessam, muito ligados a ideias de concisão, minimalismo, de uma busca pelo essencial. Ao mesmo tempo, o pagode é a festa onde acontece o samba, é o encontro”, o sambista explica. “É um manifesto quase esquizofrênico e bipolar; um pagode novo, o máximo da festa e da catarse, mas recortado em um contexto intelectual que é o oposto do movimento de um pagode. Acho muito interessante esse lugar.”

Rodrigo diz que o título do disco também tem a ver com as rodas de samba que estão se popularizando na Zona Oeste paulistana, principalmente o bairro de Pinheiros mas também seu entorno, locais onde o gênero deixou de ser considerado menor: “Nas rodas, as pessoas torciam o nariz para o pagode dos anos 1980, como Fundo de Quintal, Beth Carvalho, Leci Brandão. O movimento dos anos 1990, com melodias mais românticas, também não era bem aceito.” Rindo, ele diz: “Queriam os cânones, mas agora a galera começa a chorar no meio do pagode se você toca Exaltasamba, Art Popular, ou Revelação.”

Continua após a publicidade

Feito principalmente em casa, Pagode Novo tem Rodrigo no cavaquinho, violão, guitarra e percussão. Ele também programou no celular as bases eletrônicas das dez músicas do álbum. A clarinetista Maria Beraldo canta e toca na primeira faixa, “Fernanda na Mitologia”, e Rômulo Fróes, seu parceiro na banda Passo Torto, canta na segunda, “Silvia e o Medo”. A cantora Mari Tavares participa em “Atraco”, a quarta do disco; Verônica Ferriani em “Deixa a Noite”, a quinta. Vitória do Santos, Mari Tavares e Tainá Borges fazem coro em “Na Memória Vida Outra”, juntando-se a Fernanda Brondi na voz solo e também ao saxofonista Thiago França. Este ainda se reúne com sua companheira de banda, Juçara Marçal, do Metá Metá, para “Japonego”, a penúltima do álbum.

Rodrigo Campos
(Louie Martins/divulgação)

Samba na terra da garoa

Natural do município de Conchas, no interior paulista, mas com raízes no bairro de São Mateus, na Zona Leste, Rodrigo Campos começou a tocar samba muito cedo. Aos dez anos já sabia percussão, e aos doze encontrou seu instrumento de coração, o cavaquinho: “Minha primeira referência de pagode, aos 12 anos, é aquele feito no Cacique de Ramos, quando o termo passou a ser usado como um subgênero do samba para abarcar grandes invenções, com o uso de instrumentos como o repique de mão, o tantã e o banjo”, ele conta.

Continua após a publicidade

“O Cacique de Ramos era a roda em que os integrantes do Fundo de Quintal se encontravam para mostrar músicas novas. Naquele momento houve um movimento estético que buscava chegar na roda de samba perfeita. O cavaquinho era muito baixo, enquanto o surdo e o repinique eram muito altos. Percebendo isso, os músicos começaram a fazer a marcação com o tantã e usar o banjo para alcançar um volume mais alto. A percussão baixou, a harmonia subiu, e a voz encontrou seu lugar para os sambas inéditos”, explica.

Rodrigo Campos
(Louie Martins/divulgação)

Das primeiras lições musicais, Rodrigo acabou mergulhando no samba de São Paulo, “que nasce de um lugar um pouco mais torto e mais experimental”, encontrando nele um porto seguro estético para suas canções. “O samba paulista não tem as belezas contemplativas do Rio de Janeiro e da Bahia. No Rio, mesmo quando se fala de favela ou de uma condição social, é do ponto de vista de encontrar beleza, sublimando a situação. Já em São Paulo ocorre uma espécie de lente aumentada na feiura. Aqui não tem cartão-postal, mas sim o Viaduto da Santa Ifigênia”, ele diz. “Quando comecei a observar a cidade e meu entorno, passei a compor sambas paulistas também. Percebi que tinha muitos pares, pessoas que já faziam isso há décadas. Hoje, é uma coisa que faço tanto por influência como por uma consciência estética que passei a procurar.”

Continua após a publicidade

Desde o ano passado, quando ainda gravava o álbum, Rodrigo começou a fazer apresentações no formato de rodas de samba. O show, que tem o simpático nome de Pagode do Rodrigueta, mistura suas músicas com versões de grandes clássicos, e acontecem sempre em bares da região aos sábados, com feijoada e cerveja gelada, é claro. “As pessoas não têm muita noção de que a roda de samba é um rito, uma catarse coletiva para expurgar os demônios, mas vejo que os interessados buscam esse lugar político, que é aberto e reúne as pessoas. Depois da pandemia, quem quer ouvir música prefere estar em ambientes abertos, que são espaços mais informais e democráticos, de trocar ideias, de pensar o Brasil e as novas possibilidades, de sair dessa depressão coletiva que estávamos.”

Rodrigo Campos
(Louie Martins/divulgação)

Com o lançamento de Pagode Novo, ele voltará para os palcos, mas não deixará de lado os encontros mais informais: “Vou manter o Pagode do Rodrigueta, cantando Fundo de Quintal, Zeca Pagodinho, Beth, Exaltasamba e Nelson Cavaquinho, e no show vou fazer apresentações com bastante samples, mantendo uma estética menos espontânea do que na roda. São dois movimentos paralelos que se cumprimentam e se influenciam. É interessante que tenham nascido juntos.”

Continua após a publicidade
Pagode Novo
(Rodrigo Campos/divulgação)

Pagode Novo pode ser ouvido em todas as plataformas de streaming.

Publicidade