Com novo disco e show no João Rock, Seu Jorge aposta no Brasil que ainda dança com os pés no chão
Em entrevista exclusiva à Bravo!, o cantor fala sobre a potência dos ritmos regionais e a importância de criar a partir da escuta e da memória

Em um mundo onde a globalização parece homogeneizar as expressões artísticas, Seu Jorge surge como um farol da cultura brasileira, lembrando que nossas raízes ainda pulsam com força única. Em entrevista exclusiva à Bravo!, o cantor, ator e compositor, conhecido por sua voz grave e capacidade de transitar entre o samba, rock e a MPB com igual maestria, reflete sobre a singularidade da produção musical brasileira:
“Tenho pra mim que o Brasil está configurado como, talvez, o único país do Ocidente que ainda produz a sua música regional, que ainda produz a sua música folclórica, digamos assim. Temos a produção do forró, do xaxado, do maracatu…”.
Seu Jorge ainda destaca: “Vejo com bons olhos o novo, porque o novo se nutre ainda do que é produzido aqui… e isso é muito vigoroso.” Essa afirmação ecoa em sua própria trajetória. Seu álbum mais recente, lançado em fevereiro de 2025, “Baila à la Baiana”, é um testemunho disso, por ser um verdadeiro mosaico vivo. Com 11 faixas, o álbum mistura ritmos cariocas e baianos, como chula, semba, black music e soul, gravados com a banda Conjuntão Pesadão, dando forma a um afropop dançante. Nas palavras do próprio artista, “um álbum para dançar, se divertir e celebrar a vida”.
E o resultado é um disco que celebra os encontros. Nas faixas, aparecem feats com Peu Meurray e Magary Lord, trazendo um som quente, expansivo, que parece feito não em estúdio, mas no meio de uma roda (dessas que não se ensaia, só se vive).
No João Rock, essa energia ficou visível. Mesmo num festival historicamente identificado com o rock e suas margens, Seu Jorge levou o público a uma outra frequência. Era groove, tambor e uma ancestralidade ritmada. O palco virou salão de baile, quintal de festa, e mais do que isso, virou uma arena de escuta intergeracional.
Talvez por isso a fala do artista sobre o papel da sua geração soe tão precisa e generosa: “Tudo o que já foi publicado na geração passada está disponível pra investigação, pesquisa… E acho que nós, que fazemos parte de uma geração antecessora a essa, precisamos aprender com tantas novidades e mentes frescas, com ferramentas novas que não tínhamos há tempos atrás. É isso que acho que é muito legal de observar o novo. E ser de fato uma renovação consistente e que possa progredir a produção cultural brasileira.”

Num tempo em que o novo muitas vezes parece descolado do antigo, Seu Jorge propõe outra lógica: a de que renovação não é ruptura, é continuidade. E mais: é troca. O Festival João Rock, com seus encontros entre Natiruts e Rael, Planet Hemp e FBC, Sandra de Sá e Seu Jorge, BaianaSystem e Rincon Sapiência, se apresenta como o retrato ideal dessa travessia. O que se vê ali é menos uma passagem de bastão e mais uma construção em rede: gerações que se escutam, se inspiram, aprendem umas com as outras.
No palco e fora dele, Seu Jorge se movimenta como quem entende que o papel do artista já não se limita a traduzir seu tempo, é também sobre escutar o tempo dos outros. Assumir a escuta como parte do ofício, se colocar ao lado de uma nova geração de vozes e produtores que não apenas atualizam os ritmos do país, mas tensionam os limites entre o que é referência e o que é invenção. Nesse fluxo contínuo, a música brasileira, com todas as suas complexidades, segue operando seu gesto mais radical: permanecer viva.