Sonhos perversos deflagram realidades
Espetáculo “Insônia — Titus Macbeth” extrai o sumo de duas tragédias de Shakespeare para dialogar com a atualidade
Por Gabriela Mellão
Numa tentativa de ecoar o Brasil atual, o diretor André Guerreiro Lopes reúne dois dos mais sanguinários textos da história da dramaturgia. Insônia — Titus Macbeth nasce da junção entre Titus Andronicus e Macbeth, de Shakespeare, realizada em parceria por Lopes e o dramaturgo Sérgio Roveri.
Datadas do início e fim da carreira do bardo, respectivamente, as duas obras justapostas são reveladoras do horror que atravessa a história de Shakespeare, e o próprio tempo.
A primeira é de uma brutalidade assombrosa. Entre as atrocidades da trama, tanto comandadas quanto sofridas pelo general Titus Andronicus (Helena Ignez), o autor inglês não poupa nem mesmo uma mãe cujo destino trágico é comer os próprios filhos.
Já a violência de Macbeth é sorrateira, gerada pelo dom de persuasão de sua Lady (Djin Sganzerla), implacável ao colocar a paixão do marido a serviço da ambição.
Enquanto Andronicus ganha contornos míticos, num trabalho inesquecível da musa do cinema novo, a Lady Macbeth de Sganzerla busca o sobrenatural ancorada na força da terra, invocando o que o poder de sedução possui de extraordinário.
Insônia torna seus dois protagonistas cúmplices da crueldade humana, numa jornada em que tempos e histórias se embaralham e se dilatam, travando diálogos insuspeitados entre si, como numa longa noite insone.
Lopes orquestra uma instalação imersiva em que todos os elementos cênicos possuem pesos similares, público e atores ficam livres para circular. Aparições de sons e imagens oníricas criam uma atmosfera fantástica que insere o espectador em uma viagem de sentidos, na qual, como nos versos de Shakespeare, sublime e terrível coexistem.
Sesc Avenida Paulista (Av. Paulista, 119 — Bela Vista). De quinta a sábado, 21h; domingo, 18h. Até 20/10. 16 anos. R$ 6 a R$ 20,00.
Morre J.Borges, cordelista e xilogravurista pernambucano
Como Ariano Suassuna ressignificou luto em “Romance d’a Pedra do Reino”
Por que ‘Catatau’ é obra-prima da literatura de invenção do século XX?
Livro “Negros na Piscina” tensiona noção de racialidade homogênea
Os 100 melhores livros do século segundo o New York Times