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Teatro e cinema transgressores marcam a carreira de Isabela Mariotto

A atriz que despontou na internet com "A Vida de Tina" chega agora aos cinemas e à TV com produções que vão muito além da comédia

Por Ágata Fidelis
22 fev 2023, 11h35
roda viva - teatro oficina - personagem_ televisão (1)
 (Teatro Oficina/arquivo pessoal)
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Isabela Mariotto é um daqueles nomes que precisam ressoar por aí. Após ganhar o prêmio máximo do Festival de Locarno com o filme Regra 34, que marca sua estreia no cinema, a atriz paulistana trabalha em um longa-metragem que levará do Instagram para as telonas a personagem Tina, a icônica e polêmica personagem que interpreta no perfil A Vida de Tina.

Cria do Teatro Oficina, Isabela leva dos palcos para a carreira muito do que aprendeu por lá. “A percepção de que arte e vida estão profundamente ligadas e de que o que se produz em cena é também a criação de novos significados para a vida. Acho que por isso costumo me interessar muito pelos trabalhos no teatro e no cinema que caminham nesse sentido”, revela.

Além da chegada de Regra 34 para o grande público, em 2023 Isabela assina a concepção e a dramaturgia de uma peça ainda sem nome, que deve estrear no segundo semestre do ano. O novo ano também será tempo de colheita. A atriz estará no ar na nova temporada da série As Five, da Globoplay, e na série Dois Tempos, do Star+.

Em entrevista à Bravo, Mariotto festeja o novo momento político do Brasil e o possível novo e positivo cenário para a cultura nacional. Confira:

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Isabela, queria começar essa conversa te parabenizando pela vitória em Locarno. Me conta um pouco de Regra 34, como surgiu a participação no filme da Júlia Murat?
Obrigada! A participação surgiu depois de uma série de testes. Quando a Julia e o Gabi [Gabriel Bortolini, diretor assistente e casting] me chamaram pra interpretar Natália, fiquei muito feliz. Já estava apaixonada pelo projeto e tinha certeza que queria fazer parte dele.

Regra 34 é um filme desafiador, que fala de temas que grande parte da sociedade brasileira não quer discutir. Quais foram os desafios de misturar questões identitárias, de raça e de sexo em uma mesma produção?
Acho que o maior desafio estava dentro de nós mesmos. Tivemos que quebrar muitos preconceitos para adentrar de peito aberto os universos que o filme explora e para bancar toda a discussão que o filme poderia gerar futuramente. Ao longo do processo, fomos cada vez mais percebendo a importância de naturalizar todos esses assuntos e que colocá-los juntos em cena só poderia engrandecer o filme.

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Isabela Mariotto
(Isabela Mariotto/arquivo)

O filme foi aclamado na Suíça e saiu vitorioso do festival de Locarno. Mas, é chancela suficiente para a crítica brasileira, ainda mais nesses tempos de conservadorismo ainda não superado?
A princípio eu temia como esse filme seria recebido aqui. Não só pela ala conservadora, mas por todo mundo, pois é um filme complexo e que aposta nas contradições, sem apresentar saídas ou respostas óbvias para o espectador. Mas acho que, por estarmos vivendo esse período conturbado politicamente, o filme se tornou ainda mais forte, pertinente e atual, ganhando novas interpretações por conta da conjuntura.

O filme estreou e tem sido bem recebido pela crítica e pelo público! Tivemos uma série de debates após algumas sessões e esse espaço de troca trouxe novos olhares para nosso trabalho.

“A princípio eu temia como esse filme seria recebido aqui. Não só pela ala conservadora, mas por todo mundo, pois é um filme complexo e que aposta nas contradições, sem apresentar saídas ou respostas óbvias para o espectador. Mas acho que, por estarmos vivendo esse período conturbado politicamente, o filme se tornou ainda mais forte, pertinente e atual, ganhando novas interpretações por conta da conjuntura”

Isabela Mariotto
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Sol Miranda, Júlia Murat, Tatiana Leite, Isabela Mariotto e Gabriel Bortolini
Sol Miranda, Júlia Murat, Tatiana Leite, Isabela Mariotto e Gabriel Bortolini com premio Locarno (Isabela Mariotto/arquivo pessoal)

Você é uma atriz criada no Teatro Oficina, uma escola conhecida por sua coragem nas suas montagens e na formação de profissionais. De que maneira você enxerga e analisa a dramaturgia brasileira, seja nos palcos ou nas telas, através dessa ótica tão única?
O Oficina me apresentou uma prática teatral muito particular e me formou não só enquanto atriz, mas enquanto pessoa. Trata-se de um prática inspirada na antropofagia, a partir da qual buscamos colocar os tabus em cena e assim transformá-los em totens. Ela me trouxe a percepção de que arte e vida estão profundamente ligadas e de que o que se produz em cena é também a criação de novos significados para a vida.

Acho que por isso costumo me interessar muito pelos trabalhos no teatro e no cinema que caminham nesse sentido. Seja drama, seja comédia. Gosto de assistir aquilo que me provoca, que me desestabiliza e que me leva a criar outras interpretações sobre o mundo. Trabalhos que por meio da metáfora – ou também da ironia – nos levam a olhar as coisas de outra forma.

peça roda viva 2019 (1)
peça roda viva 2019 (Teatro Oficina/arquivo pessoal)

Estava falando antes sobre a questão conservadora no Brasil, mas vocês sofreram um backlash fortíssimo dos setores mais progressistas com A Vida de Tina em determinado momento das primeiras manifestações contra o governo Bolsonaro. De que maneira você absorveu essa experiência, e como ela se compara ao outro lado do espectro político?
Eu sinto que até hoje continuo absorvendo o que aconteceu. Nossa produção se modificou bastante depois do ocorrido e passamos a tomar um cuidado redobrado ao elaborar nossos vídeos. Com essa experiência aprendi que quando se cria na internet, mais do que em qualquer outra linguagem, é preciso antecipar todas as possibilidades de interpretação que aquele vídeo ou texto podem gerar. Se há uma palavra, uma imagem ou uma frase que podem ser minimamente mal compreendidas, é melhor tirar. Você tem sempre que pensar no pior.

As redes sociais, diferentemente do teatro ou do cinema – ou de qualquer linguagem artística, não são, no geral, um lugar de experimentação. É isso ou aquilo. Nenhum discurso e nenhuma imagem podem ser ambíguos. E como a personagem que criamos é o supra sumo da contradição, a sensação que tenho é que a gente vive pisando em ovos. Mas apesar dessa equação complicada, sinto que acabamos encontrando uma medida.

cena do filme regra 34
(Regra 34/reprodução)

Quais são seus próximos projetos após a estreia de Regra 34 no Brasil?
Estou desenvolvendo dois projetos no momento. Um deles é o projeto de longa-metragem de A Vida de Tina, que estou criando em conjunto com minha parceira na esquete, Júlia Burnier, e com o diretor e roteirista Teo Poppovic. Além disso, estou desenvolvendo a dramaturgia de uma peça que espero estrear ainda esse ano. E 2023 também é o momento de colher frutos! Além do Regra 34, tenho outros trabalhos para estrear neste semestre. Estou na segunda temporada da série As Five e também na série Dois Tempos.

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“Acho que por isso costumo me interessar muito pelos trabalhos no teatro e no cinema que caminham nesse sentido. Seja drama, seja comédia. Gosto de assistir aquilo que me provoca, que me desestabiliza e que me leva a criar outras interpretações sobre o mundo. Trabalhos que por meio da metáfora – ou também da ironia – nos levam a olhar as coisas de outra forma”

Isabela Mariotto
Isabela Mariotto
(Isabela Mariotto/arquivo pessoal)

Como você vê o estado da cultura nacional agora que existem promessas de que o setor será mais uma vez bem recebido e fomentado com o novo governo?
Com a volta do Ministério da Cultura, estou esperançosa que alguma coisa melhore para as artes. No entanto, sei que o caminho é árduo, uma vez que o governo Bolsonaro deixou o país e a cultura numa situação calamitosa. Não é o caso de apenas aguardar as promessas se concretizarem. Devemos seguir lutando pelas leis de incentivo, por melhores condições para os trabalhadores da cultura e pela geração de empregos na área.

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