“O Mistério de Picasso”, a história do documentário nada convencional de Henri Clouzot
Filme dos anos 1950 sobre o artista espanhol foi tão revolucionário quanto sua própria obra

De chapéu-coco, Picasso compareceu ao Festival de Cinema de Cannes de 1956. Assim ele assistiu à segunda exibição de um documentário feito pelo amigo francês Henri Clouzot (1907-1977). Sua presença ajudou a conter as vaias da platéia, que na primeira sessão não ficou nada contente com o que via. O filme era O Mistério de Picasso (1956), em que, de maneira incomum, Clouzot acompanha o momento de trabalho do artista.

Sua voz e seu rosto pouco aparecem, enquanto se revelam os traços, riscos e pinceladas: posicionada atrás do cavalete — não do pintor, como seria usual —, a câmera rompe com a forma tradicional de documentário e faz da própria obra de arte sua protagonista.
Cada espectador, então, pode acompanhar o passeio de Picasso pela tela, que esbanja firmeza e surpreende: a cabeça logo se transformará em pássaro; a flor, num minuto, ornará a galinha; o golpe de tinta preta rapidamente esconderá o nu da mulher e fará nascer sobre ele outros motivos.

Sobre o filme, o cineasta François Truffaut (1932-1984) declarou: “O impressionante desde a primeira imagem é exatamente isto: estamos diante de um desenho animado muito mais bonito que o normal, incomum e poético, mas ao mesmo tempo irreal e completamente diferente daquilo que esperávamos, que nos fora anunciado e que sabíamos do grande pin- tor: o mistério de Picasso continua”.

Depois de 75 minutos de quase invisibilidade, Pablo Picasso deixa sua assinatura e anuncia: “Este é o filme”, como quem termina um quadro. O documentário seria declarado patrimônio nacional pelo governo francês em 1984. Por questões contratuais, porém, todas as telas usadas na filmagem foram destruídas ao fim das gravações.
“O Mistério de Picasso” está disponível para assistir no streaming do Prime Video.
