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“Pauliceia Desvairada” de Mário de Andrade: entenda o sucesso e legado da coletânea de poemas

Primeira obra de vanguarda do modernismo brasileiro, livro cantou a urbanização de São Paulo e as novas estéticas

Por Redação Bravo!
25 fev 2025, 07h00
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 (Colagem sobre imagem de acervo / Instituto de estudos brasileiros da USP/acervo rede Abril)
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O início do século 20 foi de transformações aceleradas na cidade de São Paulo. O começo da industrialização impulsionou a mudança da paisagem urbana e a explosão demográfica. Nesse contexto, surge a coletânea de poemas Pauliceia Desvairada (1922), de Mário de Andrade (1893-1945), a primeira obra verdadeiramente de vanguarda do modernismo brasileiro. Ode ao Burguês, que se tornou o poema mais famoso do livro, foi lido durante a Semana de Arte Moderna de 1922 — para o espanto da plateia, alvo evidente dos versos: “Eu insulto o burguês! O burguês-níquel,/ o burguês-burguês!/ A digestão bem-feita de São Paulo!/ O homem-curva! O homem-nádegas!/ O homem que sendo francês, brasileiro, italiano,/ é sempre um cauteloso pouco-a-pouco!”.

Enquanto Manuel Bandeira, Menotti del Picchia e outros ainda guardavam fortes ligações com as escolas precedentes, o autor de Macunaíma optou pelo rompimento integral. Tal marca já fica caracterizada no famigerado Prefácio Interessantíssimo, em que, num tom entre o jocoso e o sarcástico, estão listados alguns dos parâmetros sobre os quais a obra se ergue: “[…] Bilac representa uma fase destrutiva da poesia; porque toda perfeição em arte significa destruição. Imagino o seu susto, leitor, lendo isto. Não tenho tempo para explicar: estude, se quiser […]”.

Por toda a obra encontram-se dúvidas, perplexidades e ironias do autor a respeito da São Paulo em que nascera, uma cidade transformada pela urbanização e a chegada dos imigrantes. E é na forma, claro, que estavam as grandes inovações de Pauliceia Desvairada. Mário de Andrade conciliou diferentes estéticas para construir seu panorama paulistano, mas revelou essa nova realidade social sem, no entanto, incorporar integralmente os “ismos”. As influências das vanguardas europeias do início do século 20 estariam — conforme o programa do Manifesto Antropofágico definiria anos mais tarde (1928) — digeridas e transformadas.

Pelas vias do futurismo — aprendido em grande parte pela obra do italiano Ardengo Soffici —, esboçavam-se o tempo efêmero e o novo espaço urbano. Ao expressionismo deve-se a representação distorcida, beirando o grotesco, das mazelas sociais. Já o dadaísmo é o cerne da irreverência mariandradina. No citado Prefácio Interessantíssimo, o poeta zomba de sua própria arte, que parece desconhecer os limites entre a seriedade e a piada.

Uma alegoria constante na obra é o arlequim, que aparece em diversos poemas. Para a professora Telê Ancona Lopez, essa referência já está na capa da primeira edição da obra, ilustrada com losangos coloridos dispostos lado a lado, num desenho do poeta Guilherme de Almeida. Mário não seria o único a usar a figura — Manuel Bandeira e Menotti del Picchia já a haviam empregado de alguma forma. Isso, ao que parece, novamente se deve a Soffici e a seu livro de prosa Arlecchino (1914). Em cada aparição, o palhaço assume uma conotação diferente: associa-se ao desvario atribuído à cidade ou alia-se ao desejo de fundir o lírico e o dramático ao patético.

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Essa matéria foi publicada originalmente no especial 100 livros essenciais da literatura brasileira

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Bravo! especial: 100 livros essenciais da literatura brasileira (Bravo!/arquivo)
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