O fim da pausa: 5 a seco dá entrevista exclusiva sobre novo disco
Vinicius Calderoni, Tó Brandileone, Leo Bianchini e Pedro Viáfora falam dos novos rumos da banda, que incendiou o Coala Festival depois de 5 anos de hiato
Cinco peças fundamentais de um jogo complexo. Para além das vontades, talentos e paixões na música, há a vida pessoal e os outros compromissos profissionais como pano de fundo para a construção coletiva de um sonho nascido em 2009. Integrado por Vinicius Calderoni, Tó Brandileone, Leo Bianchini, Pedro Viáfora e Pedro Altério, o 5 a Seco anda numa sintonia cheia de significado.
São 15 anos de banda celebrados este ano, sendo que os últimos cinco foram envolvidos por uma pausa. A reunião vem com a apresentação no Coala Festival, no qual a banda também esteve há dez anos, ainda na 1ª edição do evento com line-up 100% brasileiro. “Esse somatório de simbologias e datas redondas tem uma beleza especial porque quando a gente vai ficando mais velho, a gente vai vendo com um pouco mais de perspectiva e mais emoção certas coisas”, narra Vinicius.
Para sanar a saudade dos fãs e dos próprios músicos, os músicos anunciam que se trata de uma retomada depois de um produtivo período de afastamento. Nesse meio tempo, Tó se dedicou à produção, e esteve à frente de álbuns como “Cor”, de Anavitória, e “DanSando”, de Luísa Sobral; Leo foi morar em Portugal, lançou o disco “Solto no Mundo” e tornou-se pai; Vinicius enveredou-se pelo teatro, tendo participado de espetáculos como “Sísifo”, com Gregório Duvivier, e “O que só sabemos juntos”, com Denise Fraga e Tony Ramos. Viáfora e Altério se dedicaram à dupla Pedros e fizeram diversos shows juntos e separados – Viáfora frequentemente se apresenta junto ao pai, Celso, e Altério lançou o solo “De cara limpa”.
“Essa volta tem uma particularidade que é a gente se afastando durante cinco anos e cada um vivendo as suas vida do ponto de vista artístico, cultural, afetivo, emocional. Essa volta tem um pouco da potência do nosso primeiro encontro”, analisa Tó.
No show realizado no último domingo (8), reverenciaram grandes hits, como “Coisas dentro das coisas”, música de abertura, “Pra você dar o nome”, “Em paz” e “Faça desse drama”, inesperadamente tocadas sequencialmente (“Em Paz”, por exemplo, costuma entrar no “bis”), e finalizaram a apresentação com “Feliz pra cachorro”, a fim de ditar o clima do que vem a seguir.
Durante o espetáculo, o quinteto anunciou de surpresa um novo álbum de estúdio, que deve ser lançado ainda este ano com 15 faixas inéditas. “No sentido que a estrada do dia de hoje inaugura, a gente queria dizer que já gravamos um disco novo. Um disco de quinze faixas inéditas que passa bem, tá forte, tá saudável. E que vocês vão ter muitas notícias dele logo logo. E tomara que faça todo sentido pra vocês”, contou Vinicius frente à recepção calorosa do público.
Em entrevista à Bravo!, ele, Tó, Leo e Pedro Viáfora falam da retomada, da volta ao Coala uma década depois, das perspectivas para o futuro e das expectativas do público.
Bravo!: Em 2019 vocês anunciaram a pausa, depois de dez anos de banda. O que esse hiato de cinco anos trouxe para vocês em termos de carreiras solo?
Vinicius Calderoni: Bom, acho que é impossível não ter havido uma grande transformação, um grande amadurecimento, porque não só cinco anos é muito tempo – e cinco anos numa etapa da vida que a gente está em alta produtividade. A gente parou ali todo mundo com uns 30 e pouquinhos… a pausa se deu quando todo mundo estava meio nessa faixa etária, então é um momento já de efervescência, muito trabalho, muita energia, muita transformação, e, junto com isso, acho que a gente viveu também esse momento, paradoxalmente, da pandemia, que operou uma série de transformações individuais para cada um, e acho que cada um metabolizou de uma maneira. Uns lidaram melhor, outros lidaram pior. Tem gente que gostou, achou bom, tem gente que ficou desesperada, que nem eu. É difícil dizer coletivamente, mas acho que a pausa teve muito a ver com essa tentativa de escoar as vontades individuais que o coletivo, de uma certa forma, limita. O coletivo naquela lógica como a gente estava operando, porque desde que o 5 a Seco começou, em 2009, e até 2019, quando a gente fez a pausa, tudo sempre foi muito contínuo. Por mais que a gente se chamasse de coletivo de compositores, e a gente continua se chamando, a gente funcionava operacionalmente no dia a dia como uma banda. Se uma data for marcada, todo mundo tem que estar disponível, as agendas têm que estar mais ou menos disponíveis. Muitas vontades pessoais puderam ser exercidas. O Léo foi morar fora, teve um filho, o Tó produzindo muita coisa, se solidificando aqui, gravando e produzindo muitos discos, ganhando prêmio.
Tó Brandileone: Uma coisa que eu queria complementar do que o Vini está falando, que eu acho que é válido, é que quando a gente se juntou para fazer o 5 a Seco lá atrás, a gente se juntou para fazer um show especial. Não era para ser um grupo que ia ter uma vida, uma longevidade. A gente ia fazer quatro shows e parar, e aí o negócio foi virando, foi acontecendo, e a gente foi seguindo meio pela demanda da plateia. Quando a gente se juntou 15 anos atrás, todo mundo chegou com muita carga musical, emocional, com tudo que tinha até ali nas nossas vidas. O 5 a Seco nunca mais aconteceu dessa forma, que é a gente vindo com muita bagagem e se encontrando. A gente conviveu junto, viveu junto e a gente estava numa inércia, digamos assim, das nossas vidas, o que foi muito legal, prazeroso, gostoso, mas essa volta tem uma particularidade que é a gente se afastando durante cinco anos e cada um vivendo as suas vida do ponto de vista artístico, cultural, afetivo, emocional. Essa volta tem um pouco da potência do nosso primeiro encontro. De repente a gente volta cada um com preocupações diferentes, momentos de vida diferente. Tem o filho do Leo, o Vini fazendo um monte de coisa de teatro… o Vini já tinha essa veia dramatúrgica nos roteiros do show,com as entradas, saídas, falas, trocas de instrumentos coreografadas. Agora o Vini volta não só com a vontade de fazer teatro que ele tinha na época, mas com a bagagem de ter feito teatro.
Vinicius: Agora me ocorreu que a pausa também tem a ver um pouco com um realinhamento de chakras, por falta de melhor termo. A gente volta porque faz muito sentido, para não deixar só o pragmatismo funcional e mercadológico dominar a nossa jornada, para reacender a chama da paixão. A gente sempre foi muito bom nesse sentido Talvez uma das melhores qualidades que a gente tem como coletivo é que a gente sempre soube ouvir as individualidades dentro da coletividade para também não deixar a amizade esmaecer. É muito difícil que na lida, né, no dia a dia, as coisas não se desgastem, ainda mais lidando com agenda, disponibilidade, grana. A gente vai ficando endurecido, de uma forma geral. Essa retomada veio de uma demanda, de uma urgência afetiva e emocional. Uma vontade de se reencontrar para não entrar naquele lugar burocrático de uma banda cumprindo uma agenda ou fazendo um negócio para inglês ver.
Bravo!: Ao mesmo tempo em que preserva a individualidade de cada um de vocês, o 5 a seco também sempre teve parcerias entre vocês, vide a dupla Pedros. Como o período de afastamento afetou ou contribuiu para esses relacionamentos internos?
Pedro Viáfora: Eu e o Pedro [Altério], a gente tem uma parceria que estava ali. Para algumas músicas, o 5 a seco de uma certa maneira dava uma vazão, mas foi muito natural esse projeto. A gente gosta da estrada, às vezes até mais do que os outros. A gente tem uma vontade de fazer show, fazer turnê, a gente tinha mais essa vontade do que em relação às outras pessoas do grupo. E aí a gente começa a fazer esse trabalho e vem a pandemia. De uma certa maneira, mudou toda a rota do nosso projeto. O 5 a Seco tinha uma ideia de a gente parar durante um tempo menor. Na nossa cabeça, eram uns dois anos. A gente não discutiu isso, era por tempo determinado, mas certamente a pandemia mudou um pouco. Não ia ser cinco anos,
Tó: É que não teve nenhum intervalo entre um disco e outro. A gente nunca ficou seis meses sem fazer show. Quando a pandemia estoura e todo mundo pára, isso certamente joga um pouco para frente… Se a gente voltasse logo, ia parecer uma volta da pandemia, e acho que se confirmou mais uma decisão acertada, porque quando a gente volta agora, primeiro que a gente decide voltar por uma escolha nossa, mesmo, pessoal. A gente nunca teve esse viés mercadológico, de plays, seguidores, views e marketing. A gente sempre fez um negócio para a gente estar feliz fazendo o que a gente fazia. Este, na verdade, é talvez o ingrediente principal de todo trabalho longevo. É as pessoas estarem felizes fazendo, né? A decisão de a gente voltar agora é nossa, é pessoal, mas ela se mostra também acertada do ponto de vista de criar uma expectativa, uma demanda. O Pausa [disco lançado em 2019] já está aí há cinco anos. Acho que tem uma potência nessa volta também do ponto de vista da expectativa.
Bravo!: É a primeira vez que vocês vão tocar ao vivo as músicas do Pausa, cinco anos depois. Quais são as expectativas e sensações que trazem esse momento?
Vinicius: Muito boas. Esse show é para uma grande plateia, e “Pausa” é um disco extremamente intimista. Mais do que tudo, é um show de 50 minutos. Se fosse um show de duas horas, daria para a gente ter muito mais. É sim a primeira vez que a gente toca o “Pausa”, mas não vai ser um número significativo de músicas do “Pausa”.
Tó: O foco desse show, na minha cabeça, é aniquilar a saudade da gente. A gente naturalmente entra no nosso Spotify, vê as músicas que são mais ouvidas. Eu até desejaria tocar mais coisas do “Pausa”, mas por se tratar de um festival, a gente tem pouco tempo e acaba tendo que deixar de lado um monte de coisa.
Vinicius: É a própria natureza de um show aberto para 15, 20, sei lá quantas mil pessoas. É muito diferente de um show no teatro ou em um lugar fechado, que tem muito mais espaço para uma dramaturgia, momentos altos e baixos. Em um show de multidão você tem que, de alguma maneira, deixar aquela pulsação não baixar. “Pausa” é um disco muito intimista, que foi pensado dessa maneira, que os arranjos são pequenos e tudo mais. Vai ter coisas, e a gente está superfeliz.
Bravo!: Quatro álbuns e cinco anos depois, como vocês escolheram as músicas que estarão no Coala? E qual é a música que nunca saiu do setlist de vocês, vai continuar no Coala e por quê?
Tó: Na verdade, a gente começa o repertório por essas músicas. A gente fala quais músicas a gente apanharia se não tocasse no Coala. Pra você dar o nome, Feliz pra cachorro, Gargalhadas, Em paz.. são essas músicas através das quais grande parte do público que nos conhece nos conheceu. Seria ingratidão da nossa parte não tocar as músicas através das quais a maioria das pessoas nos conhece. Eu tenho muito essa sensação de ver a minha família… As minhas tias são alucinados no Roberto Carlos. Eu assisti muito especial do Roberto Carlos de fim de ano e lembro de pensar muitas vezes como é que esse cara pega esse microfone e de novo começa “Quando eu estou aqui”… Quantas vezes ele fez isso? Ele é proibido de fazer um show sem cantar essa música, e aí toda vez que eu falo ‘pô, não aguento mais aquela minha música de 15 anos atrás’, eu penso no Roberto Carlos e falo ‘aguenta, cara, você aguenta’.
Leo Bianchini: Tem uma coisa também que faz parte do funcionamento do 5 a Seco, dentro de uma coisa democrática. São cinco compositores que têm a sua voz e vão sempre figurar nas diversas mostras, nos shows ou nos discos. A gente sempre preza por um equilíbrio no número de músicas que cada um canta, muito embora tenham músicas que sejam mais famosas do que outras. Esse é um peso, mas um outro peso é também o equilíbrio entre os cinco compositores, o que faz com que isso apareça para o público de uma maneira diversa, multicolor e tudo mais. Esse equilíbrio mantém o 5 a Seco nesse lugar do coletivo de compositores, mantém o nível de diversidade muito alto. É complexo, porque são cinco vozes, não tem uma hierarquia, mas é justamente essa complexidade que gera a diversidade, que é um dos pontos legais, uma qualidade do 5 a Seco. Esse show foi isso: a gente pensou obviamente nessas músicas chamariz, na porta de entrada, e também em outras legais que os outros iriam cantar sem perder esse equilíbrio. A gente tem isso dentro da gente desde o começo. Hoje em dia, essa coisa do equilíbrio… a gente percebe que é uma grande dificuldade.
Bravo!: Há uma década, vocês estiveram no Coala abrindo a primeira edição do evento. Qual é o sabor de voltar a esse lugar, com tanta coisa diferente?
Pedro: É bem especial, né? Mais do que ter tocado na primeira edição, foram as vezes que eu fui no festival.
Tó: O cachê que ele ganhou no primeiro ano ele gastou nos outros. Devolveu o dinheiro pro Coala. Quem está pagando o cachê é o Pedro!
Pedro: Para mim, esse sabor é o mais legal. Ter estado no ano passado, no ano retrasado, olhar aquilo e sem um horizonte de “vamos voltar, vamos fazer um show aqui, nesse lugar”. Não passava isso pela cabeça, e daqui a alguns dias estar em cima do palco nesse formato, com os meus amigos, de novo… tem um sabor muito especial. O show de dez anos atrás foi muito legal, mas muita coisa aconteceu ali. Era o primeiro festival, não tinha esse tamanho todo. O [conceito de] festival se popularizou um pouco. A gente foi a primeira banda da primeira edição, né? A gente abriu o palco
Léo: E agora a gente é a primeira banda anunciada da décima edição. Tem uma simbologia aí, né?
Vinicius: Esse somatório de simbologias, de datas redondas, tem uma beleza especial, porque quando a gente vai ficando mais velho, a gente vai vendo com um pouco mais de perspectiva e mais emoção certas coisas. Depois de dez anos tocando no Coala, quando a gente está fazendo 15 anos, depois de cinco anos parados… tem toda uma confluência de sensações que se colocam e têm a ver com a beleza de envelhecer. A beleza de ver certas coisas acontecendo no tempo, e durando no tempo também. Como artista, a gente faz sem saber o que vai durar, o que continua tendo validade e apelo. É sempre um milagre e um mistério que as pessoas continuem ouvindo nas plataformas. A gente tem um dado concreto que eu acho bem impactante. A gente não perdeu – tudo bem que essa é uma régua complexa nesses dias de hoje, mas enfim – a média de ouvintes mensais. Está mais ou menos na mesma faixa ali, nos anos que a gente ficou parado, o que eu acho uma demonstração muito sólida de construção. Nossa trajetória não foi feita por escolhas mais exteriores, mais fáceis, mas epidérmicas e imediatas, que poderiam levar talvez a um sucesso mais viral, mas também de consumo mais rápido. Tudo para a gente foi sempre ritmo do nosso coração, num ritmo humano, que nos satisfaça, e que esse seja o ritmo do nosso crescimento com o nosso público, de alcance e tudo mais. É sempre, para mim, misterioso e milagroso que a gente chegue lá e tenha muita gente que ainda tenha essa expectativa, que goste, que vá cantar as músicas. Só vamos saber realmente ali na hora, mas eu acredito que isso vai acontecer mais uma vez, assim, e é muito bonito que aconteça.