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Os mesmos baianos

Com show marcado para sábado no Coala Festival, os Novos Baianos comemoram 50 anos com a mesma energia dos anos 1970. Nós conversamos com Baby do Brasil

Por Artur Tavares
Atualizado em 4 mar 2024, 12h12 - Publicado em 15 set 2023, 09h18

Neste final de semana, São Paulo recebe mais uma edição do Coala Festival, um evento dedicado à música brasileira em sua mais diversa totalidade. Reunindo nomes da velha guarda com as sensações de hoje, o encontro no Memorial da América Latina tem em seu line-up astros como Jorge Ben Jor, Marcos Valle, Jards Macalé, Fafá de Belém, Jadsa, Metá Metá, Rodrigo Ogi, Johnny Hooker e Ana Frango Elétrico. Talvez uma das apresentações mais esperadas seja a do grupo Novos Baianos, que está comemorando 50 (e poucos) anos com o mesmo vigor de sua juventude.

Formado no finalzinho dos anos 1960 e tendo estourado com o lançamento dos álbuns Acabou Chorare (1972) e Novos Baianos F.C. (1973), o grupo vinha na esteira da Tropicália e amplificava o movimento à décima potência, antropofagizando não somente a cultura internacional como as expressões populares brasileiras, misturando tudo em um caldo lisérgico de potência criativa única, responsável por eternizar os nomes de Moraes Moreira, Pepeu Gomes, Baby do Brasil, Paulinho Boca de Cantor, Dadi, Luiz Galvão, Jorginho Gomes, Baixinho e Bolacha na MPB.

Para o Coala, a reunião do grupo vira trio com Baby, Paulinho Boca de Cantor e Pepeu Gomes, que celebram a vida, a poesia e a arte apresentando sucessos como “Besta é Tu”, “Preta Pretinha”, “Mistério do Planeta”, “Cosmos e Damião”, “Só se Não For Brasileiro Nessa Hora”, entre muitas outras.

Show dos Novos Baianos.
(Novos Baianos/divulgação)

Nós conversamos com Baby do Brasil sobre essa reunião e também sobre os (hoje) utópicos anos 1970. Confira:

Os Novos Baianos estão nessa turnê de 50 anos comemorando a fase áurea do grupo, que vai mais ou menos de 1972, com o lançamento de Acabou Chorare até a saída do Moraes Moreira do grupo, depois de 1974. Olhando em retrospecto, como você analisa a trajetória da banda, a mais importante do movimento tropicalista brasileiro?
Os Novos Baianos inauguraram um estilo de vida totalmente envolvido com a música, sem que o dinheiro fosse o “divisor de águas”. Assumimos o compromisso de passar a verdade do que estávamos vivendo intensamente para o som, para as letras, com muita energia e garra, trazendo para as melodias e arranjos a cor, a alegria, a musicalidade e um vigor tão espetacularmente intensos e verdadeiros, que nunca havia acontecido isso antes na música do Brasil. Para conseguir isso foi preciso morarmos juntos durante 10 anos e nos amarmos como verdadeiros irmãos, nos perdoando os defeitos e valorizando as qualidades.

Novos Baianos.
(Rede Abril/arquivo)

Cada um chegou com o seu talento e com uma porção dobrada de criatividade para produzir um grande banquete musical em que o cardápio era misturar todas as influências com o “caminho de casa”, que genuinamente também estava em nós. Conseguimos ressuscitar o bumbo e o cavaquinho para uma juventude, que estava ouvindo muito mais rock do que a música do Brasil. Conseguimos também criar o “rock brasileiro”, misturando o baião de Luiz Gonzaga, com o xaxado de Jackson do Pandeiro, com a pegada do chorinho de Waldir Azevedo, de Jacob do Bandolim, com a influência maravilhosa de Jimi Hendrix na vida do Pepeu, que foi quem me apresentou de Jimi à Janis, bem como o Valdir, Azevedo, Poli, o Cream, Jeff Beck, entre outros. E tudo isso se misturou com as influências que ganhei na minha infância: de Ella Fitzgerald, Louis Armstrong, João Gilberto, Etta James, Elza Soares, Julie London, Elis Regina, Gal Costa, Beatles, Stevie Wonder. Essa foi a minha parte, imagina a de cada um! [risos]

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Por isso, considero, sim, os Novos Baianos o maior acontecimento musical, pós Bossa Nova e a Tropicália, no Brasil. Nunca houve nada igual ao nosso grupo. Ninguém nunca topou pela música viver o que vivemos. Moramos juntos 10 anos, pagamos todos os preços e o legado está aí para sempre. Novos Baianos Forever.

Show dos Novos Baianos.
(Rede Abril/arquivo)

O que significava ser hippie naquela época? Como era alimentar esse sonho, e quanto da repressão institucional contribuiu não só para que o sonho acabasse, mas para que essa ideologia fosse transformada em algo ruim na visão dos mais conservadores?
Na verdade, nunca nos sentimos hippie ou nos considerávamos hippie. Isso porque nos sentíamos muito brasileiros, cheios de liberdade para criar roupas e estilos próprios. Não fazíamos nada para copiar o estilo do movimento hippie no mundo, porém tínhamos a consciência de que, apesar de cada um ter as suas características próprias, nação, cultura, éramos todos da mesma tribo.

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Para nós, o sonho não acabou e nem nunca acabará, porque os Novos Baianos trouxeram, para mim e para nós, uma lição de vida inesquecível: a de que é possível cada um fazer a sua parte para que o todo prevaleça com um foco no coração e na cabeça, perseguindo a vitória, vencendo todas as dificuldades, sendo “Amor da cabeça aos pés”! Mantivemos e mantemos sempre a nossa visão super hiper positiva.

Acabou Chorare foi escolhido em 2007 o melhor disco da música brasileira pela revista Rolling Stone. Na sua opinião, o que faz do álbum o melhor já produzido no país?
Foi um grande presente para nós esse reconhecimento. Nos encheu de alegria, pois nada disso havia acontecido durante o tempo em que moramos juntos. Foi preciso praticamente nascer uma nova galera da imprensa para perceber a riqueza e a verdade musical, como também o posicionamento e a profundidade do grupo. Foi maravilhoso, valeu a pena todo o esforço e dedicação pelo grupo, para recebermos esse título que na minha opinião é perfeito e muito justo. A vitória finalmente chegou.

Show dos Novos Baianos.
(Rede Abril/arquivo)

Valeu a pena passar 10 anos morando juntos, tocando, cantando e produzindo como uma grande família em prol de construir um som cheio de beleza e verdade de vida. Foi isso que somado ao talento de cada um fez desse álbum o melhor já produzido no país. Por isso cantamos: “chegou a hora dessa gente bronzeada mostrar o seu valor“!

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Essa não é a primeira vez que os Novos Baianos se reúnem para shows, mas é, claro, a única vez que vocês completam 50 anos de carreira. O que vocês trazem de diferente nessa reunião?
Estamos super felizes em poder fazer essa comemoração, e agora com o público! Estamos preparando com muito amor essa apresentação, pois ela nos toca profundamente. Estamos na fase ainda de definirmos as novidades pois são muitas as possibilidades e estamos viajando nelas. Esse é um momento único em nossas vidas, pois, afinal se passaram 50 anos!

E isso é incrível, pois hoje, o nosso álbum Acabou Chorare é o melhor de todos os tempos da música brasileira. É muito forte e gratificante. Particularmente me sinto muito abençoada em ser a única mulher do grupo, com uma grande responsabilidade prazerosa que me honra muito!

Show dos Novos Baianos.
(Novos Baianos/divulgação)

Ao longo das décadas, vimos múltiplas transformações na indústria musical e no cenário cultural. No entanto, os Novos Baianos conseguiram manter um público cativo de forma impressionante. O que, na sua opinião, serviu para a longevidade e o apelo duradouro da banda?
Esse sempre foi o nosso desejo, que construíssemos algo verdadeiro, que ficasse para todas as novas gerações como, “uma seta no caminho de casa da música brasileira”, que foi forjada com muito respeito, dedicação apaixonada, amor incondicional, criatividade intensa, inovação, ousadia, e muita brasilidade. A nossa marca ficou para sempre, é irretocável, é única. E isso nos dignifica muitíssimo.

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Show dos Novos Baianos.
(Novos Baianos/divulgação)

Ao mesmo tempo que o grupo está comemorando 50 anos, você também está com a sua nova turnê “Baby do Brasil in Concert”, que em setembro vai para Nova York, após a que fez recentemente com Pepeu Gomes, onde você estava cantando suas músicas solo e homenageando outros artistas. Como você está se sentindo nesse momento, com sua figura e sua carreira sendo celebradas de maneira tão bonita?
Eu estou em festa total! Por todos os lados da minha vida a música toca e ecoa! Me sinto privilegiadíssima por tudo o que está me acontecendo nesse momento e, para coroar isso tudo, nesse momento já estou gravando o tão esperado novo álbum autoral. Me sinto muito feliz, amando fazê-lo, com minhas músicas das novas experiências vividas, com a produção maravilhosa do incrível Dudu Marote e a participação impecável do super Renato Ratier.

É uma emoção maravilhosa e gigante, porque esse verdadeiramente é um tempo gigante. Louvo a Deus por estar vivendo esse momento. “Acabou chorare ficou tudo lindo de manhã cedinho… Tudo cá cá cá, na fé fé fé… ”

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