Por um teatro que reflita o mundo através das frestas
No Dia Mundial do Teatro, a atriz divide uma mensagem do encenador Theodoros Terzopoulo para artistas cênicos e refelete sobre o futuro do ofício

Faltavam 15 minutos para entrarmos em cena. 800 pessoas se sentavam, comiam suas pipocas e esperavam a cortina do teatro se abrir. No camarim, um questionamento surgia: É pior a guerra ou as mudanças climáticas? Por entre perucas, microfones, maquiagens, rezas e alongamentos, esse não era o questionamento que esperava ouvir. Não chegamos a uma conclusão e, por mais que não parecesse propício a um momento de concentração, a mensagem do Dia Mundial do Teatro não poderia estar mais presente.
Dia 27 de março comemoramos o Dia Mundial do Teatro. A cada ano, o International Theatre Institute convida um artista a ser o autor de uma mensagem a essa comunidade internacional de artistas cênicos. O primeiro foi Jean Cocteau, em 1962, e esse ano, a honraria foi destinada a Theodoros Terzopoulos, encenador grego.
Terzopoulos nos questiona sobre a preocupação do teatro com a destruição ambiental, com as existências robotizadas, com as trincheiras de privacidades sufocantes, com as distâncias entre nós e com o medo do outro, do estranho e do diferente. Em suas palavras: “Podem os holofotes do teatro lançar luz sobre o trauma social, e parar de se iluminar a si mesmo de forma enganadora? Perguntas que não permitem respostas definitivas, porque o teatro existe e perdura graças a perguntas por responder.”
Não existe ofício teatral destacado de realidade social. Em um país que teve tanta efervescência cultural durante anos de repressão explícita nas décadas de 1960, 1970 e 1980, como estamos lidando com os traumas contemporâneos? Os problemas se complexificam e se perdem diante dos nossos olhos. De fato, é difícil enxergar quando se está submerso.
Em seguida, Terzopoulos fala da Grécia, de Dionísio, dos mitos e de suas raízes. Nessa retomada ao famoso berço do teatro, penso no nosso Brasil. Entendamos que essa é uma mensagem a ser traduzida. De maneira literal, foi traduzida para mais de 20 idiomas, mas simbolicamente, temos que retomar ao nosso teatro de origem.
Nossas raízes brasileiras, com toda a sua diversidade construída sobre a violência e que nos constitui, são o berço do nosso teatro. Por mais que as respostas não sejam definitivas, nossas raízes são. Por isso é inescapável o questionamento da nossa realidade. Não há terceiro sinal que interrompa a realidade que bate à nossa porta.
A pergunta no camarim não foi respondida, mas de alguma forma isso foi elaborado naquela efêmera noite teatral. E que reverbere a todos os meus parceiros de profissão ao redor do mundo.
Giovanna Sassi
Giovanna Sassi é mestranda em artes cênicas e é uma artista extremamente versátil que tem uma carreira sólida no teatro musical. Atualmente, está em cartaz no Teatro Liberdade em ‘Uma Babá Quase Perfeita’, ao lado de Eduardo Sterblitch, em que interpreta a personagem Janet Lundy. Em 2024, produziu e estreou o musical “Itapuca” em Niterói. A história aborda a formação do povo de Niterói, entrelaçando as narrativas de indígenas. Em 2023, recebeu o convite para participar do musical “Kafka e a Boneca”, realizado pelo SESI-SP, sob a direção de Marllos Silva, onde interpretou Dora Diamant, a última namorada do escritor Kafka.