Fernanda Montenegro festeja seus 80 anos de carreira no melhor estilo: com uma leitura encenada da obra “A Cerimônia do Adeus”, de Simone de Beauvoir, no Teatro Prior, no Rio de Janeiro. Este não é o primeiro encontro da atriz com a autora e pensadora francesa. Em 2009, ela estreou o monólogo “Viver Sem Tempos Mortos”, obra adaptada das correspondências da autora. “Simone de Beauvoir mudou as nossas vidas”, nos contou a atriz quando foi capa da Bravo!, em 2009.
Relembre um trecho dessa entrevista histórica concedida ao jornalista Armando Antenore e leia a reportagem completa clicando aqui.
Quando você entrou em contato com Simone de Beauvoir e os existencialistas?
Fernanda Montenegro: Logo depois da Segunda Guerra, no fim dos anos 40 e início dos 50. Era um período em que Simone e Jean-Paul Sartre despontavam como celebridades, como popstars. Todo mundo do meio artístico e intelectual queria entender o que pensavam. Eu, à época, trabalhava para a Rádio Ministério da Educação, a lendária Rádio MEC, que já se localizava no centro do Rio de Janeiro. Por longo tempo, desfrutei do privilégio de apresentar o programa dominical Douce France (Doce França). Em função disso, pude me aproximar ainda mais das teses de Sartre e Simone.
Qual o primeiro livro dela que você leu?
Foi ‘O Segundo Sexo’, que saiu em 1949 e se transformou num clássico da literatura feminista, sobretudo por apregoar que as mulheres não nascem mulheres, mas se tornam mulheres. Ou melhor: que as características associadas tradicionalmente à condição feminina derivam menos de imposições da natureza e mais de mitos disseminados pela cultura. O livro, portanto, colocava em xeque a maneira como os homens olhavam as mulheres e como as próprias mulheres se enxergavam. Tais ideias, avassaladoras, incendiaram os jovens de minha geração e nortearam as nossas discussões cotidianas.
Já idosa, Simone declarou que não se deixaria escravizar pelo passado. Você também parece não se prender às glórias de outros tempos e abdica de títulos que a colocam em pedestais, como o de “primeira dama do teatro brasileiro”. Por quê?
Entenda: prezo tudo que realizei, mas o passado é o passado. Terminou. Não pretendo me entregar às divagações do tipo “ah, meus verdes vales…”. Rechaço a melancolia nostálgica e, à semelhança de Simone, frequentemente me pergunto: “Que espaço o passado reserva para a minha liberdade hoje?”. Quanto à classificação de “primeira dama”, não me ofendo. Em absoluto! Só avalio que o rótulo não me cabe. Vi e vejo atrizes extraordinárias na estrada. Não é possível que apenas uma envergue a coroa. Precisamos dividir os louros. Sem contar que a mídia e os críticos mencionam sempre as damas e nunca os lordes. Cadê os lordes? Nossos palcos estão repletos deles. Na verdade, títulos do gênero são a herança de um teatro romântico, heroico – um teatro que jamais busquei.
Teatro PRIO | Jockey Club Brasileiro – Av. Bartolomeu Mitre, 1110 – Leblon, Rio de Janeiro | De 8 a 31 de março; sextas e sábados às 20h, domingos às 19h | Ingressos: R$ 120 (inteira) / R$ 60 (meia)
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