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As lições de Francis Ford Coppola no cinema: “É necessário correr riscos”

Durante a passagem pelo Brasil para divulgar Megalópolis, o diretor participou de um evento promovido pela O2 Filmes, onde falou sobre sua arte cinematográfica

Por Humberto Maruchel
31 out 2024, 08h00
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Writer/Director Francis Ford Coppola and Adam Driver as Cesar Catilina in Megalopolis.  (Phil Caruso/divulgação)
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Parecia improvável que o cineasta Francis Ford Coppola viesse ao Brasil para falar sobre sua arte cinematográfica, mas isso aconteceu na manhã da última segunda-feira (29). Coppola, responsável por alguns dos filmes mais icônicos, como a trilogia O Poderoso Chefão e Apocalypse Now, esteve no país para divulgar sua mais recente produção, Megalópolis, que estreia nos cinemas brasileiros nesta quinta (1).

O longa, que fez sua première no Festival de Cannes em maio passado, tem gerado reações difusas e, em sua maioria, negativas, surpreendendo dada a magnitude do investimento que o diretor fez nesta obra: 140 milhões de dólares do próprio bolso. Além disso, Coppola enfrentou dificuldades para encontrar uma distribuidora disposta a trabalhar na circulação comercial do filme.

A trama se passa em uma cidade futurista, onde o arquiteto César, vivido por Adam Driver, e o prefeito Franklyn, interpretado por Giancarlo Esposito, se confrontam em um conflito de ideais: um busca um futuro mais justo, o outro é movido pela ganância. No centro do embate está Júlia Cicero (Nathalie Emmanuel, da série Game of Thrones), dividida entre a lealdade ao pai, César, e o amor por Franklyn, enquanto reflete sobre qual futuro a humanidade merece. O elenco conta ainda com Aubrey Plaza, Jon Voight e Shia LaBeouf.

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No encontro promovido pela produtora brasileira O2, Coppola seria entrevistado pela crítica de cinema Isabela Boscov. No entanto, ele solicitou uma dinâmica diferente: desejava conversar diretamente com público, composto por profissionais da indústria cinematográfica, admiradores de seu trabalho e jornalistas.

Uma longa fila rapidamente se formou em direção ao palco, permitindo que os presentes fizessem perguntas sobre diversos aspectos de sua trajetória. Uma das surpresas reveladas foi que ele iniciou sua carreira como diretor teatral, linguagem que continua a influenciar sua estética até hoje e que ele menciona com frequência.

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Embora Megalópolis tenha sido apresentado durante a divulgação como um dos projetos mais antigos de sua carreira, Coppola logo fez questão de esclarecer algumas informações. A primeira delas foi que a obra não começou há tanto quatro décadas, como se acreditava. O diretor afirmou, inclusive, que um dos motivos das críticas ao filme pode estar relacionado a um equívoco sobre o tempo dedicado ao projeto.

“Não, eu não estava trabalhando em Megalópolis há 40 anos. O que eu estava fazendo era me perguntando: ‘Qual é o meu estilo, meu estilo pessoal?’ Quando eu era muito jovem, fiz dois ou três filmes; um deles foi O Poderoso Chefão, com um estilo muito clássico, quase como Shakespeare. O outro foi Apocalypse Now, com um estilo muito livre e selvagem. Depois, fiz um filme chamado O Fundo do Coração, que tinha um estilo muito teatral. Então, havia três estilos e um único cineasta, e eu me perguntava, se, quando eu ficasse muito velho, saberia qual era o meu estilo”, declarou Coppola.

Em São Paulo, antes de ir embora, Coppola será homenageado com o Prêmio Leon Cakoff durante o encerramento da 48ª Mostra Internacional de Cinema, no dia 30 de outubro. A premiação ocorrerá após a exibição de Megalópolis.

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Confira algumas das declarações do diretor:

Criando Megalópolis

“Achei que seria divertido fazer um épico romano e, então, percebi que, se eu fizesse um, a América se tornaria a nova Roma. Quero dizer, após a Segunda Guerra Mundial, pode-se dizer que todas as estradas levavam à América. Então decidi que [Megalópolis] seria ambientado na América moderna, e muitos me perguntaram: por que você quer fazer isso? Bem, hoje, a América é uma espécie de Roma; em duas semanas, vão decidir se será uma república ou uma ditadura. Portanto, de certa forma, ‘Megalópolis’ foi muito sobre prever o futuro.”

Arte sem risco não existe

“Não acredito que seja possível fazer arte sem risco, porque é preciso arriscar-se a mergulhar no desconhecido. Você precisa ser livre e destemido para entrar no desconhecido, porque as respostas estão ocultas, tanto na arte quanto na política e na sociedade. É necessário correr riscos.”

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Relação com Glauber Rocha

“Não sei se vocês sabem disso, mas Glauber Rocha viveu em minha casa em São Francisco. Um dia, ele veio até mim, e eu o segurei em meus braços enquanto ele chorava, dizendo: ‘Não acho que o Brasil me permitirá voltar para casa’. Sei que ele finalmente voltou, mas imagine um dos grandes cineastas do Brasil, que fez ‘O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro’, em lágrimas, porque sentia que não seria permitido retornar ao país que amava.”

Liberdade criativa e Oscar 

“Me vi fazendo os filmes de O Poderoso Chefão, e eles foram muito bem-sucedidos, e todos ganharam muito dinheiro. E eu mesmo ganhei muitos Oscars. Mas quando eu falei o que queria fazer em seguida era Apocalypse Now, disseram: ‘Não, você não pode fazer isso.’ Eu disse: ‘De que adianta Oscars e dinheiro se não posso fazer o filme que quero?’ Então joguei todos os Oscars pela janela, e eles quebraram. Minha mãe, claro, os pegou e foi até a Academia e disse: “Oh, meu pobre filho, a empregada estava tirando o pó…” E ela conseguiu que os troféus fossem substituídos, mas eles estavam todos danificados. E eu disse: ‘Qual é o sentido de tudo isso se não posso fazer o filme?’ Vocês sabem quem é dono de Apocalypse Now? Eu. Sabe por quê? Ninguém queria o filme. Então, acabei ficando endividado. E naquela época, os juros eram 21%, mas as pessoas continuavam indo assistir Apocalypse Now. Até hoje, elas continuam indo assistir. E foi assim que paguei a dívida.”

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O mercado de Hollywood

“Vocês precisam entender que os filmes de hoje são como fast food. As empresas gastam centenas de milhões de dólares para fazer um produto que é uma mera batata frita, um vício que nos mantém consumindo. Eles estão fazendo a mesma coisa com os filmes, afirmando que um filme precisa ser desse ou daquele tipo, que deve atender a determinadas expectativas. Eles querem que os filmes sejam como Coca-Cola, algo que você sempre consome repetidamente.”

Processos de escrita de Coppola

“Eu escrevo cedo pela manhã porque, se alguém me magoar, não consigo produzir nada. Então, escrevo antes que alguém acorde e me magoe. Sobre a escrita, quando você está escrevendo de forma criativa, há uma espécie de enzima que é injetada em seu sangue e que faz você odiar o que escreveu. E quando você tem 100 páginas, reserve um dia para lê-las. Porque, se você lesse essas páginas no início, as odiaria e continuaria reescrevendo as primeiras páginas. No entanto, no final, ao ler 100 páginas, pode até eliminar as 20 primeiras. Assim, essas páginas não seriam o início, de qualquer forma. Portanto, meu conselho para a escrita é fazê-la regularmente, mas não ler até que você tenha um número suficiente de páginas. Então, você poderá avaliá-las com uma perspectiva adequada.”

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